Revista Portuguesa de Investigação Comportamental e Social 2019 Vol. 5 (1): 25-39
Portuguese Journal of
Behavioral and Social Research 2019 Vol. 5 (1): 25-39
Departamento de Investigação & Desenvolvimento • Instituto
Superior Miguel Torga
ARTIGO ORIGINAL
O impacto das experiências emocionais
positivas precoces e das competências autocompassivas na sintomatologia
depressiva: O papel mediador de diferentes processos de regulação emocional
The impact of early emotional positive experiences and
self-compassionate abilities on depressive symptomatology: The mediator role of
different emotional regulation processes
Maria João
Varela (1)[a]
Cláudia
Ferreira (1)
(1) Center
for Research in Neuropsychology and Cognitive and Behavioral Intervention-
University of Coimbra, Portugal
Recebido: 11/08/2018; Revisto: 12/12/2018; Aceite: 21/12/2018.
https://doi.org/10.31211/rpics.2019.5.1.101
Contexto: A literatura tem
documentado que as experiências emocionais precoces e as competências
autocompassivas desempenham um papel central na regulação emocional adaptativa
e na saúde mental. Adicionalmente, crescente evidência suporta que diferentes
processos de regulação emocional exercem um papel mediador significativo na
relação entre experiências emocionais e sintomatologia depressiva. Métodos e Objetivo: Este estudo foi
conduzido numa amostra da população geral constituída por 389 participantes,
com idades entre os 18 e os 50 anos (M
= 31,84; DP = 10,97). Os
participantes completaram um protocolo de medidas de autorresposta que avalia
memórias precoces de calor e segurança, autocompaixão, proximidade e conexão
aos outros, evitamento experiencial e sintomatologia depressiva. O estudo
examinou um modelo integrador no qual foi colocado como hipótese que a relação
entre memórias afiliativas positivas e sintomatologia depressiva é mediada pela
proximidade e conexão aos outros e o evitamento experiencial. Resultados: Os resultados confirmaram a
adequabilidade do modelo testado, o qual explica 34% da variância da
sintomatologia depressiva. Os resultados revelaram que experiências precoces de
calor, afeto e segurança e as competências autocompassivas se associam a
menores níveis de sintomatologia depressiva, através de níveis superiores de
sentimentos de segurança e proximidade ao outro e menor adoção de estratégias
de evitamento experiencial. Conclusões:
Este estudo contribui para a clarificação do impacto das vivências emocionais
precoces e das competências autocompassivas na saúde mental. Os dados sublinham
a importância das competências sociais e afiliativas e de aceitação, enquanto
mecanismos mediadores na explicação da saúde mental.
Palavras-Chave: Competências autocompassivas; Evitamento
experiencial; Experiências precoces; Ligação ao outro; Sintomatologia
depressiva.
Background: The scientific
literature supports that early emotional memories of warmth and safeness and
self-compassionate abilities play a central role in adaptive emotion regulation
and mental health. Further, it is pointed out that distinct mechanisms may
mediate the association between emotional experiences and depressive symptoms. Method and Aim: Participants were 389
men and women from the general population, aged between 18 and 50 years old (M = 31.84; SD= 10.97), who completed a set of self-report measures of early
memories of warmth and safeness, self-compassion, social safeness, experiential
avoidance, and depression symptoms. The current study examined an integrative
model that hypothesized that the association between early affiliative memories
and self-compassionate abilities with depressive symptomatology are mediated by
social closeness and experiential avoidance. Results: Results confirmed the adequacy of the tested model, which
accounted for 34% of the depressive symptoms variance. Results revealed that
early emotional memories of warmth and safeness and self-compassionate
abilities were associated with increased depressive symptoms, through higher
feelings of safeness and closeness within the social arena and lower adoption
of maladaptive experiential avoidance strategies. Conclusions: These findings contribute to the clarification of the
effect of early positive emotional memories and self-compassionate abilities on
mental health. Moreover, present data highlight the importance of affiliative
and acceptance competences as emotion regulation mediational mechanisms to
promote mental health.
Keywords: Self-compassionate abilities; Experiential avoidance; Early
experiences; Social safeness; Depressive symptomatology.
As experiências emocionais precoces com os pais/cuidadores e
outras figuras significativas têm sido consideradas de extrema importância para
a maturação do sistema límbico e na regulação da nossa resposta emocional
perante o medo e face a eventos negativos de vida (Depue
& Morrone-Strupinsky, 2005; Gilbert, 2010; Schore, 2001). Na verdade, evidências empíricas e
clínicas documentam que experiências precoces positivas com as figuras de
vinculação, caracterizadas pela disponibilidade, afeto e segurança, se associam
positivamente a indicadores de bem-estar e saúde mental (e.g., DeHart, Pelham, & Tennen, 2006; Marta-Simões, Ferreira, & Mendes, 2018; Mikulincer & Shaver, 2005). Em contraste,
ambientes precoces caracterizados por vivências negativas de ameaça, abuso,
rejeição ou negligência parecem funcionar como fatores de risco ou
vulnerabilidade para o desenvolvimento posterior de psicopatologia (e.g., Richter, Gilbert, & McEwan, 2009).
Embora exista amplo consenso em relação ao papel central que as
experiências precoces desempenham no desenvolvimento psicossocial do indivíduo,
diversos autores têm enfatizado que o foco da investigação se deve centrar, não
apenas na presença ou ausência de determinadas experiências objetivas, mas sim
nas memórias emocionais do indivíduo acerca dessas vivências (e.g., Gilbert, Cheung, Grandfield, Campey, & Irons, 2003).
De facto, Gilbert e colaboradores (2003) têm
sugerido que perante experiências precoces semelhantes, diferentes indivíduos
poderão processar emocionalmente e lidar com esses eventos de forma muito
distinta. De acordo com esta leitura, mais relevante que estudar o impacto do
comportamento das figuras de vinculação ou das experiências precoces objetivas
(e.g., as práticas e estilos parentais) será explorar as memórias emocionais
precoces associadas, isto é, avaliar como cada indivíduo se recorda de sentir
nestes ambientes (e.g., sentir-se amado, cuidado, protegido ou ameaçado; Gilbert et al., 2003; Richter
et al., 2009).
Diversos estudos têm mostrado que a escassez de memórias
emocionais precoces positivas pode assumir um papel central na explicação da
psicopatologia, associando-se a maiores dificuldades na regulação das emoções
(Gilbert, 2005, 2010; Gilbert et al.,
2009). Paralelamente, a literatura tem vindo a demonstrar que a maior
acessibilidade a memórias emocionais precoces positivas desempenha um efeito
protetor face ao impacto de experiências/acontecimentos negativos no sofrimento
e em diversos tipos de psicopatologia, nomeadamente na sintomatologia
depressiva (Irons, Gilbert, Baldwin, Baccus, & Palmer,
2006). Especificamente, estudos têm corroborado que a recordação de
ambientes precoces calorosos, capazes de transmitir experiências de apoio,
segurança e cuidado parecem associar-se a níveis mais elevados de bem-estar e a
maior resiliência face a falhas, insucessos ou fracassos, assim como a níveis
mais elevados de autocompaixão (Irons et al., 2006; Kelly & Dupasquier, 2016).
O constructo de compaixão tem sido definido na literatura em
psicologia de diferentes formas. De acordo com a filosofia budista, compaixão
traduz uma atitude de abertura e disponibilidade perante a dor e sofrimento e
uma intenção com propósito com vista ao alívio desse sofrimento (Dalai Lama, 2001).
Gilbert (e.g., 2005) conceptualiza a
compaixão como uma atitude universal nos humanos, produto da evolução do
sistema fisiológico subjacente à vinculação e de prestação de cuidados, sendo
ainda entendida como uma competência que pode ser promovida através de treino
específico. A compaixão define-se, assim, por uma combinação de motivos,
pensamentos, emoções e ações de abertura empática, calorosa e não-avaliativa
perante o sofrimento (do próprio ou dos outros) e pela procura ativa para o seu
alívio (Gilbert, 2005, 2009).
De acordo com o postulado por Gilbert e colaboradores (2017), a compaixão definida como uma sensibilidade
e atitude intencional de compromisso para o cuidado e alívio ao sofrimento
engloba duas dimensões: (i) os
atributos e motivações compassivas e (ii)
as ações compassivas. As motivações compassivas definem-se como uma competência
ou motivação para lidar com o sofrimento numa atitude de sensibilidade e
aceitação (Gilbert, 2009). Estas motivações
compassivas traduzem-se no cuidado para o bem-estar, isto é, pelo
carinho pelo próprio e pelos outros quando estão em dificuldades e pela
manifestação de um interesse e conhecimento genuínos pelas origens do
sofrimento, estando na base das ações compassivas. Estas ações compassivas
dizem respeito à forma como se age de acordo com as motivações compassivas,
focando-se deliberadamente a atenção no que pode ser útil, perante experiências
indesejáveis, desafiantes ou dolorosas (Gilbert, 2009,
2010).
Nesta conceptualização, são identificados diferentes fluxos ou
direções para a compaixão (Gilbert, 2009, 2010; Gilbert, McEwan, Matos,
& Rivis, 2011): direcionada em relação aos outros, expressa em relação
ao self, ou recebida por parte dos
outros. A compaixão direcionada ao self
(i.e., autocompaixão) pode ser compreendida como uma estratégia adaptativa de
regulação emocional que ajuda o indivíduo a lidar com sentimentos dolorosos
(e.g., situações de fracassos, insuficiências, falhas ou insucessos) sem os
evitar, mas ao invés disso, aceitando-os com gentileza, de forma compreensiva e
sem julgamento (Gilbert, 2010). Deste modo, o
constructo de autocompaixão não se diferencia da definição mais geral de
compaixão, e pressupõe que o indivíduo esteja atento, aberto e sensível ao
próprio sofrimento. De acordo com Neff (2003, 2012) esta atitude deve ser distinguida de autorresignação,
uma vez que a conceptualização de autocompaixão compreende ainda o desejo de
aliviar o sofrimento e de recuperar o bem-estar, através da experiência de
sentimentos de cuidado, gentileza e de bondade para consigo próprio.
Adicionalmente, a autocompaixão baseia-se no pressuposto de que a
imperfeição é parte integrante da condição humana (Neff,
2003). Esta dimensão de humanidade comum parece facilitar a partilha de
experiências comuns mesmo quando indesejáveis ou dolorosas, promovendo sentimentos
de ligação segura e de conexão ao outro e minimizando sentimentos de isolamento
(Neff, 2012). A autocompaixão parece funcionar como uma
bolha de emotional safeness dentro da qual os indivíduos se percebem a si,
assim como às circunstâncias da vida, numa atitude de abertura e sem
autocondenação (Leary, 2004). Adicionalmente, a
autocompaixão associa-se a níveis mais elevados de bem-estar e satisfação com a
vida, promovendo relações interpessoais mais positivas, maior sentido de
pertença e ligação ao outro ou social
safeness (Akin & Akin, 2015).
O constructo de social
safeness caracteriza-se por uma perceção do mundo social como seguro,
apaziguador e calmo, capaz de induzir sentimentos de pertença e uma perceção de
aceitação por parte dos outros. Este sentimento de pertença e de conexão social
tem sido associado a um bom ajustamento psicológico e bem-estar (Gilbert, 2009, 2010, 2015), assim como a outros indicadores positivos (e.g.,
pensamento criativo, capacidade de resolução de problemas e comportamentos pró
sociais; Rothstein & Uslaner, 2005). De facto,
a necessidade de pertença pode ser compreendida como uma necessidade humana
universal crucial para o bem-estar dos indivíduos (Baumeister
& Leary, 1995; Kelly, Zuroff, Leybman, &
Gilbert, 2012).
Existe um consenso alargado de que o estabelecimento de alianças e
relações de amizade têm um papel fundamental na saúde física e mental (Cacioppo & Patrick, 2008), por contraste, o
isolamento, o sentimento de alienação, a falta de alianças e de cooperação são
altamente prejudiciais ao bem-estar. Investigadores defendem que a experiência
de rejeição (seja objetiva ou subjetiva) e de desconexão pode ter um impacto
negativo na expressão genética das células imunitárias, gerando uma cascata de
acontecimentos neurobiológicos com repercussões a vários níveis (nomeadamente
num aumento da sintomatologia depressiva; Beck &
Bredemeier, 2016). De acordo com Gilbert (2010),
a solidão pode ativar o sistema de defesa/ameaça e gerar um medo poderoso que
serve como um sinal de que é necessário restabelecer laços sociais quebrados e
evitar vários tipos de dificuldades ou perigos.
Dados empíricos recentes sugerem que indivíduos que se sentem mais
seguros, aceites e ligados aos outros, tendem a apresentar níveis mais baixos
de autocriticismo e isolamento social (e.g., Kelly
et al., 2012). Por outro lado, os indivíduos que se sentem inseguros na sua
envolvente social tendem a fazer uma avaliação negativa do self, o que parece influenciar a sua capacidade de ler sinais
sociais acabando por se afastar mais dos outros e perpetuando sentimentos de
insegurança e hipervigilância à ameaça (Kelly et
al., 2012), maior dificuldade em regular as emoções, as quais parecem
explicar níveis mais elevados de sintomatologia depressiva (Cacioppo & Patrick, 2008; Gilbert, 2010, 2015).
Vasta literatura tem vindo a enfatizar o papel central de
diferentes processos de regulação emocional na explicação de diferentes
indicadores de psicopatologia, sublinhando o evitamento experiencial como um
processo mal-adaptativo central para a explicação da sintomatologia depressiva
(e.g., Carvalho, Dinis, Pinto-Gouveia, &
Estanqueiro, 2015; Chawla & Ostafin, 2007; Spinhoven, Drost, De Rooij, Van Hemert, & Penninx,
2016).
De acordo com a Terapia da Aceitação e do Compromisso (ACT), o
evitamento experiencial é conceptualizado como um processo que envolve a
indisponibilidade do indivíduo para estar em contacto com eventos privados
aversivos (e.g., pensamentos,
emoções, sensações, memórias) e esforços deliberados para alterar a
intensidade, frequência e duração ou o contexto que os ocasiona, mesmo que isso
afete a vivência de valores pessoais e induza ações incongruentes com esses
mesmos valores (Hayes, Strosahl, & Wilson,
1999; Hayes, Wilson, Gifford, Follette, &
Strosahl, 1996). O evitamento experiencial é considerado uma estratégia mal-adaptativa
de lidar com emoções desagradáveis, pois apesar de produzir alívio imediato em
relação às experiências emocionais intensas, a longo prazo tem um efeito
paradoxal (Chapman, Gratz, & Brown, 2006). De
facto, apesar de em certas situações o evitamento experiencial ser uma
estratégia adaptativa, por providenciar proteção ao indivíduo, este processo
tende a ser mal-adaptativo à medida que o padrão de resposta se torna rígido,
consumindo recursos (e.g., tempo, esforço e energia) e comprometendo objetivos
de vida valorizados (Kashdan, Barrios, Forsyth, &
Steger, 2006). Paralelamente, o evitamento experiencial tende a funcionar
como uma barreira à experienciação de interações sociais afiliativas e significativas (Kashdan et
al., 2014).
Embora a literatura tenha vindo a enfatizar o impacto das
experiências precoces de calor e segurança e autocompaixão na psicopatologia
(e.g., depressão), vários fatores e processos de regulação emocional estão
envolvidos nestas relações (Gilbert, 2005; Gilbert, Baldwin, Irons, Baccus, & Palmer, 2006;
Schore, 2001). A relação entre experiências
emocionais precoces e a autocompaixão está bem documentada. No entanto, a
relação entre estas vivências precoces positivas e a tendência para adotar
estratégias de evitamento experiencial não está clarificada, embora alguns
dados empíricos apontem para a existência de uma relação significativa entre
experiências precoces negativas e evitamento experiencial (Batten,
Follette, & Aban, 2002; Gratz, Bornovalova, Delany-Brumsey,
Nick, & Lejuez, 2007). O objetivo desta investigação é explorar o
impacto das experiências precoces de calor e afeto e das competências
autocompassivas na sintomatologia depressiva, assim como o efeito mediador da
proximidade ao outro e do evitamento experiencial nesta relação.
Adicionalmente, é examinada a diferença entre homens e mulheres nas relações
testadas. É colocada a hipótese de que os indivíduos que reportam mais memórias
emocionais positivas em relação às suas vivências precoces com pais/cuidadores
e apresentam maiores competências autocompassivas tendem a apresentar menores
níveis de sintomatologia depressiva. Adicionalmente é esperado que as relações
entre memórias emocionais precoces e competências autocompassivas com a
sintomatologia depressiva sejam mediadas por níveis superiores de ligação e
proximidade ao outro e menor evitamento experiencial face a eventos internos.
Finalmente, é plausível que estas relações sejam comuns tanto para o sexo
masculino como para o sexo feminino, e que as variáveis e processos em estudo
operem de forma semelhante para a explicação da sintomatologia depressiva em
ambos os sexos
Participantes
A amostra deste estudo foi composta por
389 adultos da população geral (124 homens e 265 mulheres), com idades
compreendidas entre os 18 e os 50 anos. A idade média apresentada pelos
participantes do sexo masculino foi de 31,46 (DP = 10,97) e nas participantes do sexo feminino de 32,02 (DP = 10,98). Em relação à escolaridade,
o grupo do sexo masculino apresentou uma média de 12,63 (DP = 3,34) e o grupo feminino de 14,00 (DP = 3,38) anos de escolaridade. No que concerne às diferenças
entre os dois grupos, não foram encontradas diferenças estatisticamente
significativas na variável idade [t(387) = ‑0,471; p =
0,638], no entanto, observaram-se diferenças estatisticamente significativas
quanto aos anos de escolaridade [t(386) = ‑3,789; p
< 0,001].
Medidas
Escala de Memórias
Precoces de Calor e Afeto (Early Memories of Warmth and Safeness Scale
[(EMWSS); Richter et al. (2009); Matos,
Pinto-Gouveia e Duarte (2014)]. Esta medida de
autorresposta, constituída por 21 itens, visa medir as memórias de experiências
emocionais de calor, segurança e afeto sentidas/experienciadas na infância. É
solicitado aos participantes que respondam aos itens (e.g., “Sentia que era um
membro querido da minha família”), utilizando uma escala de cinco pontos (de
0 = “Não, nunca” a 4 = “Sim, a maior parte do tempo”). A EMWSS revelou boas
características psicométricas, apresentando uma consistência interna muito boa
(α de Cronbach = 0,97) tanto na versão
original (Richter et al., 2009) quanto na versão
portuguesa (Matos et al., 2014).
Escala de Atributos e Ações
Compassivas [Compassionate Engagement and
Actions Scales [(CEAS); Gilbert et al. (2017)].
Esta medida de autorresposta é composta por três escalas que medem a compaixão,
perante situações de dificuldade ou sofrimento: (i) Escala de Autocompaixão (CEAS-SC);
(ii) Escala de Compaixão pelos Outros; e (iii) Escala de Receber
Compaixão dos Outros. Tendo em conta o objetivo específico desta
investigação, apenas foi usada a escala de autocompaixão (CEAS-SC) para avaliar
a compaixão dirigida ao self. A
escala é composta por 13 itens e integra duas seções distintas: 1) “atributos
autocompassivos” (com 8 itens, desenhada para avaliar a motivação e capacidade
para lidar com as situações difíceis e dolorosas com uma atitude calorosa e de
aceitação); 2) “ações autocompassivas” (composta por 5 itens, que avaliam as
ações eficazes/úteis, compassivas e tolerantes para lidar com pensamentos e
emoções negativas em situações de dificuldade ou sofrimento). A CEAS-SC
apresenta uma escala de resposta dez pontos, variando entre 1 (“Nunca”) e 10
(“Sempre”), na qual valores mais elevados representam níveis superiores de
autocompaixão. O estudo original (Gilbert et al.,
2017), o qual apresenta a validação desta medida para a população
Americana, Britânica e Portuguesa, revela que a CEAS-SC apresenta boas
caraterísticas psicométricas, com alfas de Cronbach que variam entre 0,74 e
0,84.
Escala de Proximidade e
Ligação aos Outros [Social Safeness
and Pleasure Scale (SSPS); Gilbert et al. (2009);
Pinto-Gouveia, Matos e Dinis (2008)]. Esta
escala de autorresposta, de 11 itens, avalia o grau em que as pessoas se sentem
aceites, seguras e acarinhadas no seu grupo social. É solicitado aos
participantes que assinalem para cada item (e.g., “Sinto-me aceite pelas outras
pessoas”) a frequência com que experienciam sentimentos positivos de pertença,
ligação e aceitação na interação social, utilizando uma escala de cinco pontos
(de 1 = “Quase nunca” a 5 = “Quase sempre”). A SSPS apresenta uma consistência
interna muito boa (α de Cronbach =
0,91), tanto na versão original (Gilbert et al., 2009)
como na versão portuguesa (Pinto Gouveia et
al., 2008).
Questionário de Aceitação e
Ação II [Acceptance and Action Questionnaire – II
(AAQ-II); Bond et al. (2011); Pinto-Gouveia, Gregório,
Dinis e Xavier (2012)]. Esta medida de
autorresposta constituída por sete itens, visa medir o grau de evitamento
experiencial, isto é, a
indisponibilidade para estar com as experiências internas consideradas
aversivas, perda de contacto com o momento presente e ausência de comportamentos
comprometidos com os valores. É solicitado aos participantes que assinalem a
sua concordância em relação aos itens (e.g., “Tenho medo dos meus
sentimentos”), utilizando uma escala de sete pontos (de 1 = “Nunca verdadeiro”
a 7 = “Sempre verdadeiro”). Esta escala mostrou boas características
psicométricas, apresentando uma consistência interna muito boa (α de Cronbach = 0,84), tanto na versão original (Bond et al., 2011), como na versão portuguesa (Pinto Gouveia et al., 2012).
Escala de Ansiedade,
Depressão e Stress [Depression
Anxiety Stress Scales (DASS-21); Lovibond e Lovibond (1995); Pais-Ribeiro, Honrado e Leal (2004)]. Composta por três subescalas com sete itens
cada uma, a DASS-21 é a versão curta da DASS-42 (Lovibond
& Lovibond, 1995) e visa avaliar o grau de ansiedade, depressão e
stresse experienciados. É solicitado aos participantes que assinalem,
utilizando uma escala de quatro pontos (de 0 = “Não se aplicou nada a mim” a 3
= “Aplicou-se a mim a maior parte das vezes”), a frequência com que sentiram
emoções negativas durante a última semana. Tendo em conta os objetivos da
presente investigação, utilizou-se apenas a subescala depressão (DASS-21-DEP), a qual revelou boas
características psicométricas, tanto na versão original (α de Cronbach = 0,87; Lovibond
& Lovibond, 1995), quanto na versão portuguesa (α de Cronbach = 0,80; Pais-Ribeiro
et al., 2004).
Os alfas de Cronbach respeitantes a estas medidas encontram-se na Tabela
1.
Procedimento
O presente estudo respeitou todas as normas éticas e os princípios
deontológicos inerentes à investigação em psicologia, nomeadamente na recolha
da amostra e tratamento dos dados. Após o consentimento da comissão de ética da
instituição de acolhimento da presente investigação, a amostra foi recolhida
através de uma plataforma online (LimeSurvey).
O convite à participação neste estudo foi
partilhado através de redes sociais (Facebook)
e através de mensagem privada para contactos pessoais. No convite constava uma
breve descrição dos objetivos e procedimentos do estudo, realçando a
importância do estudo em questão, o qual se encontra inserido numa investigação
mais alargada sobre diferentes processos de regulação emocional e qualidade de
vida, bem como os critérios de inclusão do estudo (homens e mulheres com idades
superiores a 18 anos). Adicionalmente, foi dado a todos os participantes
informação acerca do caráter voluntário da sua participação, da
confidencialidade e anonimato das respostas. Os investigadores comprometeram-se
ainda a utilizar os dados fornecidos pelos participantes estritamente para fins
de investigação, assim como a prestar o esclarecimento sobre quaisquer dúvidas
acerca da mesma, em qualquer momento. Este convite incluía ainda um link que direcionava
para a versão online do protocolo de
investigação constituído por: consentimento informado, questionário de recolha
de informação biográfica e as medidas de autorresposta anteriormente descritas.
Estratégia Analítica
A análise de dados foi elaborada com
recurso ao software IBM SPSS
Statistics 22.0 do SPSS (SPSS IBM; Chicago, IL) e com recurso ao software AMOS (Analysis of Momentary Structure; Version 23.0; Arbuckle, 2014).
De forma a analisar as características
da amostra nas variáveis em estudo, nomeadamente, as médias e desvios-padrão,
foram conduzidas análises estatísticas descritivas. Com vista a compreender as
associações entre os diferentes constructos da investigação, procedeu-se a
análises de correlação de Pearson. A
leitura e análise das magnitudes dos resultados seguiram os princípios e
recomendações de Cohen, Cohen,
West e Aiken (2003), segundo as quais se
considera de magnitude fraca correlações entre 0,1 e 0,3, moderada entre 0,3 e
0,5 e forte iguais ou superiores a 0,5, considerando-se um nível de
significância de 0,05.
Por forma a testar as relações
estruturais presumidas entre as variáveis do modelo proposto, foi elaborada uma
equação de modelos estruturais (SEM) (MacKinnon, 2008).
O modelo testou o efeito indireto das experiências precoces de calor e afeto e
das competências autocompassivas (variáveis independentes) na sintomatologia
depressiva (variável dependente), através da ligação ao outro e do evitamento
experiencial (variáveis mediadoras). Foi utilizado o método de Máxima
Verosimilhança para testar os coeficientes de regressão e uma série de testes
que visam calcular a qualidade do ajustamento do modelo (CFI, TLI, NFI e RMSEA; Hu & Bentler, 1999). Os efeitos
indiretos estabelecidos entre as variáveis foram testados a partir de bootstrapping (com 5000 amostras), com
um intervalo de confiança corrigido de 95% do efeito indireto. Nesta análise,
considera-se que o efeito indireto é significativo quando o intervalo de
confiança (IC) não inclui o zero (Kline, 2005).
Por fim, foi realizada uma análise de
multigrupos de forma a testar a existência de diferenças entre homens e
mulheres no modelo final.
Análise preliminar dos dados
A adequação dos
dados foi testada através da análise dos valores de assimetria (Skewness - Sk) e de curtose (Kurtosis
- Ku), tendo sido possível confirmar o pressuposto da normalidade da
distribuição das variáveis (|Sk| <
3 e |Ku| < 8; Kline,
2005). De facto, os valores de assimetria variaram entre ‑0,69 (EMWSS) e
0,80 (DASS-21-DEP), e os valores de curtose entre ‑0,29 (EMWSS) e 1,20
(DASS-21-DEP).
Estatística descritiva e de correlações
As estatísticas
descritivas relativamente às variáveis estudadas, para o total da amostra (N
= 389), são apresentadas na Tabela 1.
|
Alfas
de Cronbach (α), Médias (M), Desvios-Padrão (DP) e Correlações entre as Variáveis em Estudo |
|
|||||||
|
|
α |
M |
DP |
1 |
2 |
3 |
4 |
|
|
1. EMWSS |
0,98 |
57,39 |
20,08 |
1 |
|
|
|
|
|
2. CEAS-SC |
0,88 |
66,68 |
16,05 |
0,31*** |
1 |
|
|
|
|
3. SSPS |
0,95 |
41,79 |
8,44 |
0,51*** |
0,46*** |
1 |
|
|
|
4. AAQ II |
0,93 |
22,48 |
9,72 |
-0,32*** |
-0,42*** |
-0,47*** |
1 |
|
|
5. DASS-21-DEP |
0,94 |
9,29 |
5,62 |
-0,33*** |
-0,32*** |
-0,47*** |
0,52*** |
|
|
Nota. EMWSS = Escala de
Memórias Precoces de Calor e Segurança; CEAS-SC = Escala de Atributos e Ações
Autocompassivas; SSPS = Escala de Proximidade e Ligação ao Outro; AAQ II = Questionário
de Aceitação e Ação; DASS-21-DEP = Escala de Ansiedade, Depressão e Stress-
Subescala de Depressão. ***p < 0,001. |
|
Os resultados das análises de correlação de Pearson permitiram
observar associações significativas entre todas as variáveis em estudo.
Particularmente, verificou-se uma associação positiva moderada entre memórias
precoces de calor e segurança com os cuidadores (EMWSS) e as motivações e ações
autocompassivas (CEAS-SC), as quais se correlacionam positivamente com a
ligação e proximidade ao outro (SSPS), com magnitude moderadas a altas, e
negativa e moderadamente com o evitamento experiencial (AAQ II) e com a
sintomatologia depressiva (DASS-21-DEP). Foi ainda possível verificar que a
ligação e proximidade ao outro (SSPS) revelou uma relação negativa e moderada
com o processo de evitamento experiencial e com a sintomatologia depressiva. Os
resultados evidenciaram, igualmente, uma associação positiva com uma magnitude
forte entre o processo de evitamento experiencial e a severidade dos sintomas
depressivos.
Adicionalmente, foram conduzidas análises de correlação de Pearson por
sexo. Os resultados permitiram verificar a inexistência de diferenças, tanto
quanto à direção quanto à magnitude das associações entre as variáveis em
estudo, nos dois grupos (grupo de participantes do sexo masculino e grupo do
sexo feminino). Este resultado validou a utilização da amostra global nas
análises subsequentes.
Análises de caminhos
(path analysis)
Com o objetivo de compreender mais aprofundadamente as relações entre
as variáveis em estudo foi realizada uma análise de modelos estruturais, a
análise de caminhos (Path analysis; MacKinnon, 2008). Com base na revisão da literatura, o
modelo testado colocou como hipótese que memórias emocionais precoces de calor
e afeto e competências autocompassivas assumem um efeito negativo na explicação
da sintomatologia depressiva através de níveis superiores de proximidade e
ligação ao outro e de níveis inferiores de evitamento experiencial.
O modelo foi testado através de um modelo saturado que consistia em 20
parâmetros. Este modelo inicial explicou 36% da variância da ligação e
proximidade ao outro (medida através da SSPS), 22% da variância do evitamento
experiencial (AAQ II) e 34% da sintomatologia depressiva (DASS-21-DEP) (Figura 1).
Figura 1. Modelo final. Coeficientes estandardizados dos caminhos (paths)
entre as variáveis. Todas os coeficientes dos caminhos revelaram-se
significativos para um nível de 0,05 (***p < 0,001); EMWSS
= Escala de Memórias Precoces de Calor e Segurança; CEAS-SC = Escala de
Atributos e Ações Autocompassivas; SSPS = Escala de Proximidade e Ligação ao
Outro; AAQ II = Questionário de Aceitação e Ação; DASS-21-DEP = Escala de Ansiedade,
Depressão e Stress-Subescala de Depressão.
A análise dos resultados mostrou que dois dos caminhos (paths)
não se revelaram estatisticamente significativos. Especificamente estes caminhos
foram: o efeito direto da CEAS-SC na DASS-21-DEP (bCEAS_SC = 0,009;
SEb = 0,17; Z = ‑0,554; p = 0,580; ß= ‑0,27) e o efeito
direto da EMWSS na DASS-21-DEP (b EMWSS = - 0,23; SEb
= 0,013; Z = ‑1,755; p = 0,079; ß= ‑0,82).
De acordo com procedimentos recomendados, procedeu-se à eliminação
progressiva dos caminhos referidos, tendo o modelo sido reajustado e
recalculado. O modelo reajustado demonstrou explicar 36% da variância na SSPS e
22% da variância no AAQ II e 34% da variância da sintomatologia depressiva, e
apresentou excelente adequação aos dados empíricos [χ2(2) = 3,375; p
= 0,185, CMIN/DF = 1,687; TLI = 0,986; CFI = 0,997; NFI=
0,993; RMSEA = 0,042; p = 0,458; (95% IC = 0,000 –
0,118)]. Adicionalmente, neste modelo todos os caminhos se revelaram
significativos. Os resultados demonstraram assim que: a EMWSS revelou um efeito
direto na SSPS de 0,339 e no AAQ II de ‑0,211 (b = 0,01; SE =
0,002; p < 0,001). A EMWSS também mostrou um efeito indireto de
-0,197 na DASS-21-DEP através dos efeitos do AAQ II e da SSPS (95% IC = ‑0,272
a ‑0,133). Quanto à CEAS-SC, esta variável revelou um efeito direto positivo de
0,339 na SSPS e negativo de -0,358 no AAQ II. Esta variável mostrou ainda um
efeito indireto de ‑0,237 na DASS-21-DEP através dos efeitos da SSPS e do AAQ
II (95% IC = ‑0,299 a ‑0,173). No que diz respeito à SSPS, esta variável
revelou efeitos diretos de ‑0,287 na DASS-21-DEP. O AAQ II, demonstrou efeitos
diretos de 0,391 na DASS-21-DEP.
Por fim, e por forma a testar a invariância do modelo por sexo, foi
realizada uma análise multigrupos. Os resultados obtidos demonstraram a não
existência de diferenças significativas em relação aos pesos fatoriais [χ2(6) = 7,98; p
= 0,247], revelando assim a invariância do modelo nos dois grupos em
comparação (homens e mulheres).
Em síntese, os resultados da análise de caminhos sugerem que as
memórias precoces de calor e segurança e a existência de competências autocompassivas
se associam com níveis mais baixos de sintomatologia depressiva, através de
mais sentimentos de proximidade e ligação aos outros e de menor evitamento
experiencial, tanto para homens como mulheres.
As experiências emocionais precoces positivas com figuras de
vinculação, assim como as motivações e ações autocompassivas têm sido
associadas a diferentes indicadores de bem-estar e saúde mental (e.g., DeHart et al., 2006; Gilbert et al., 2017; Irons et al., 2006; MacBeth & Gumley, 2012; Marta-Simões et al., 2018; Mikulincer & Shaver, 2005). No entanto, não estão ainda inteiramente
clarificados quais os mecanismos mediadores nestas associações. Assim, o
presente estudo pretendeu testar o efeito mediador da proximidade e ligação ao
outro e do evitamento experiencial na relação entre experiências afiliativas
precoces de calor e segurança e as competências autocompassivas na
sintomatologia depressiva, numa amostra composta por homens e mulheres da
população geral.
Os resultados obtidos estão de acordo com estudos prévios e parecem
confirmar as hipóteses previamente apontadas, evidenciando uma relação positiva
significativa entre experiências precoces positivas, competências
autocompassivas e com a proximidade e ligação ao outro, e negativa com o
evitamento experiencial e a sintomatologia depressiva (e.g., Carvalho et al.,
2015; Chawla &
Ostafin, 2007; Gilbert et
al., 2017; Hayes et al.,
1996; Kelly
& Dupasquier, 2016).
Este estudo acrescenta à literatura existente a evidência da associação
positiva moderada entre experiências precoces de calor e afeto e competências
autocompassivas, e da relação significativa entre estas competências e menores
índices de evitamento experiencial. Embora este seja o primeiro estudo que explora
a relação entre competências autocompassivas e evitamento experiencial, os
resultados obtidos parecem suportar a abordagem de Yadavaia, Hayes e Vilardaga
(2014), que sugere existir paralelismo entre os
constructos de flexibilidade psicológica e autocompaixão.
Os resultados da análise de caminhos (path analysis) mostraram
que o modelo testado apresenta uma excelente adequação aos dados, explicando
34% da variância da sintomatologia depressiva. Adicionalmente, os dados obtidos
na análise multigrupos suportam a invariância do modelo testado entre homens e mulheres.
Particularmente, os dados apontam que as experiências emocionais precoces de
calor e afeto e as competências autocompassivas se associam a menor
sintomatologia depressiva através de maiores níveis de ligação e proximidade
nas relações sociais e de menor evitamento experiencial. Mais especificamente,
os resultados parecem indicar que a presença de memórias precoces positivas e
competências autocompassivas, perante insuficiências ou falhas do self,
se associam a uma maior proximidade ao outro e a um menor envolvimento em
estratégias de evitamento experiencial, mecanismos estes que parecem explicam a
sintomatologia depressiva. Estes dados apoiam estudos anteriores, sugerindo que
as memórias de calor e afeto nas relações precoces com figuras de vinculação se
associam positivamente com a proximidade e ligação ao outro e maior
tranquilização nas interações futuras (Gilbert, 2005; Kelly & Dupasquier, 2016). Paralelamente, foi verificada que uma
maior proximidade ao outro está associada a níveis mais baixos de
sintomatologia depressiva, dado que vai ao encontro de vasta literatura que
destaca o papel pernicioso do isolamento social na depressão (Gilbert, 2010; Kelly et al., 2012). Em consonância com estudos prévios (e.g.,
Carvalho
et al., 2015; Chawla &
Ostafin, 2007; Hayes et al.,
1996; Kashdan et al.,
2006; Spinhoven et
al., 2016), o evitamento
experiencial associa-se a níveis mais elevados de sintomatologia depressiva.
Este dado parece corroborar o efeito paradoxal do evitamento experiencial como
uma estratégia mal-adaptativa de lidar com a experiência interna aversiva (Chawla &
Ostafin, 2007; Hayes et al.,
1996). Embora teoricamente
expectável, é importante sublinhar que os resultados do presente estudo
corroboram que estas relações são invariantes em função do sexo, isto é,
mostram que estas relações são semelhantes tanto para homens como para
mulheres.
O presente estudo apresenta, contudo, algumas limitações. Uma das
principais limitações diz respeito ao facto de este ser um estudo transversal,
o que impossibilita o estabelecimento de relações causais entre os constructos.
Outra das limitações prende-se com o facto de terem sido utilizados exclusivamente
instrumentos de autorresposta e por via online, o que se poderá traduzir
numa maior subjetividade e consequente enviesamento dos resultados. Estudos
futuros deverão explorar a relação entre estas variáveis através de design experimental
ou longitudinal, assim como o recurso a entrevistas, de modo a ultrapassar
estas limitações. Uma limitação importante a salientar diz respeito ao facto do
modelo testado ser limitado, tendo em conta que a sintomatologia depressiva tem
uma natureza complexa e multideterminada. De facto, outras variáveis e
processos de regulação emocional (como vergonha, autocriticismo, ou fusão
cognitiva) poderão estar envolvidos nas relações em análise, contudo, a
intenção foi desenhar um modelo parcimonioso que explorasse o papel mediador do
evitamento experiencial e da proximidade ao outro na sintomatologia depressiva.
Os resultados da presente investigação parecem, no entanto, contribuir
de forma significativa para a investigação e prática clínica. De facto, embora
a literatura tenha evidenciado a importância do treino de uma mente compassiva
na redução da sintomatologia depressiva (Gilbert, 2001, 2007, 2010), os mecanismos de mudança ainda são mal
compreendidos. Os dados obtidos permitiram corroborar a importância dos
processos de afiliação e conexão ao outro e de aceitação das experiências
internas enquanto processos mediadores relevantes para a explicação do
bem-estar e da saúde mental. Em termos da prática clínica, os dados reforçam a
pertinência do desenvolvimento de intervenções baseadas no treino da
autocompaixão com vista à redução da sintomatologia depressiva, sugerindo que
estes processos de afiliação ao outro e aceitação devem ser foco das
intervenções, quer de foro de prevenção para a população geral quer a nível de
intervenção para populações clínicas.
Conflito de interesses | Conflict of interest: nenhum | none.
Fontes de financiamento | Funding sources: nenhuma | none.
Contributos | Contributions: MJV: Revisão da literatura; Recolha, inserção e
tratamento dos dados; redação do manuscrito. CF: Contributo na redação
do manuscrito; Tratamento e discussão dos dados; Revisão da redação final do
manuscrito.
Declaração |
Acknowledgments: Partes deste trabalho foram apresentadas em cumprimento
parcial dos requisitos para o grau de mestre na Faculdade de Psicologia e
Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, Portugal | Portions of this
work have been submitted in partial fulfillment of the requirements for a
master degree, at Faculty of Psychology and Education Sciences,
University of Coimbra, Portugal.
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ÐPublicação em
Acesso Aberto © 2019. O(s) Autor(es).. Este é um artigo de
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