2015, Vol. 1(2): 58-68

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Validação do Youth Quality of Life Instrument (YQOL-R) para a população portuguesa

 

Artigo Original   

 

Sara Mendes i, Marina Cunha i , Ana Xavier i, Margarida Couto i, Ana Galhardo i

 

https://doi.org/ 10.7342/ismt.rpics.2015.1.2.24

 

Recebido 23 abril 2015

Aceite 22 julho 2015

 

 

ÍNDICE

RESUMO

INTRODUÇÃO

MÉTODOS

RESULTADOS

DISCUSSÃO

REFERÊNCIAS

 

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RESUMO

Objetivo: É incontornável o estatuto que o conceito de qualidade de vida assume hoje na prática e políticas de saúde pública. Na infância e adolescência é ainda escassa a investigação, tornando-se crucial o desenvolvimento de instrumentos de qualidade vida relacionada com a saúde validados para esta população. O presente trabalho tem como objetivo fundamental analisar as qualidades psicométricas e validar a versão portuguesa do Youth Quality of Life (YQOL-R).

Métodos: A amostra é constituída por 507 adolescentes, com idades compreendidas entre os 12 e os 19 anos (M = 15,74; DP = 1,62), a frequentar o 3.º ciclo do ensino básio e ensino secundário de escolas públicas do ensino regular. Para além do citado instrumento a validar, os jovens preencheram também, para a análise da validade convergente e divergente, o Kidscreen-27 e a Escala da Depressão, Ansiedade e Stresse (EADS-21).

Resultados: O YQOL-R apresenta uma estrutura fatorial de quatro fatores, semelhantes à versão original americana (individual, relações sociais, ambiente e qualidade de vida em geral). Possui uma boa consistência interna e uma adequada estabilidade temporal. Mostrou correlações significativas e no sentido esperado com as variáveis em estudo. Foram igualmente encontradas diferenças entre sexos em relação à qualidade de vida, sendo os rapazes a reportarem em média níveis mais elevados de perceção da qualidade de vida, comparativamente às raparigas.

Conclusões: Futuros estudos devem ser realizados em amostras clínicas para confirmação dos dados. Não obstante esta limitação, o presente estudo contribuiu para a disponibilização de um novo instrumento para avaliação da qualidade de vida em crianças e adolescentes, o qual evidenciou boas propriedade psicométricas, apoiando, assim empiricamente, a sua utilização nas práticas de saúde e investigação em amostras da comunidade.

 

Palavras chave: Qualidade de vida relacionada com a saúde · Crianças · Adolescentes · YQOL-R · Estudo instrumental

 

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INTRODUÇÃO

 

O interesse pelo conceito de qualidade de vida na área da saúde é relativamente recente e decorre dos novos paradigmas que têm influenciado as práticas e políticas do sector da saúde nas últimas décadas (Gaspar & Matos, 2008).

No âmbito da saúde coletiva e das políticas públicas é possível identificar um interesse crescente pela avaliação da qualidade de vida, nomeadamente pela inclusão de informações sobre a qualidade de vida como indicadores para a avaliação da eficácia, eficiência e impacto de tratamentos e intervenções. Outro indicador de interesse por esse constructo é a produção de conhecimento associada aos esforços de integração e de intercâmbio de investigadores e profissionais interessados no tema (Seidl & Zannon, 2004). 

Na área da saúde verificam-se duas tendências quanto à conceptualização do termo da qualidade de vida, enquanto um conceito mais genérico e enquanto qualidade de vida relacionada com a saúde (QVRS) (Wallander, Schmitt, & Koot, 2001). Esta última definição diz respeito à saúde percebida e é descrita como um constructo que engloba as componentes do bem-estar e funções físicas, emocionais, mentais, sociais e comportamentais, como são percebidos pelos próprios e pelos outros (World Health Organization, 1998).

Dada a natureza holística deste conceito, coloca-se uma razoável dúvida sobre a “melhor” definição, tornando-se difícil a sua operacionalização através de um instrumento de avaliação (Gaspar & Matos, 2008).

Segundo alguns autores (Harding, 2001; Pais-Ribeiro, 2003), o conceito de qualidade de vida pode ser definido como um constructo multidimensional com aplicação e relevância para as pessoas de todas as faixas etárias, de todas as culturas, estatuto socioeconómico ou localização geográfica. Neste sentido, a qualidade de vida é um conceito mais abrangente do que a saúde, relacionando-se com as experiências atuais e passadas do indivíduo, com todos os aspetos do bem-estar da pessoa (físico, psicológico e social) e incluindo ainda o seu ambiente.

Wallander, Schmitt e Koot (2001) consideram que a qualidade de vida é a articulação entre a perceção de bem-estar objetivo e subjetivo em diversos domínios da vida considerados importantes numa determinada cultura e tempo, tendo em conta os níveis universais dos direitos humanos. De acordo com os referidos autores, a definição abrange os aspetos mais importantes indicados na literatura.

A definição de qualidade de vida segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) é a mais citada e é descrita como a saúde física, o estado psicológico, o nível de independência, as relações sociais e as relações do indivíduo com o contexto em que está inserido (World Health Organization, 1997). Deste modo, a OMS ilustra ainda a qualidade de vida como um conceito genérico, como a perceção do indivíduo sobre a sua posição na vida, no contexto da cultura e dos sistemas de valores em que se insere e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações.

Cummins (2005) defende igualmente a concetualização de qualidade de vida como um constructo multidimensional e influenciado por fatores pessoais, ambientais e pela interação entre ambos. Tem componentes semelhantes para todas as pessoas, apresenta componentes objetivos e subjetivos e é influenciada pela autodeterminação, pelos recursos, pelo sentido da vida e pela perceção de pertença.

As descrições objetivas e subjetivas são indicadores válidos de qualidade de vida, pelo que devem ambos ser incluídos em qualquer definição da mesma. Os aspetos objetivos podem ser observados e medidos a nível do domínio público, através de medidas de quantidade e frequência. Os aspetos subjetivos apenas existem na consciência privada do indivíduo pelo que são avaliados através de questionários de autorresposta (Cummins, 2005). Assim, estes indicadores subjetivos resultam da avaliação pessoal de cada um sobre as suas capacidades e funcionamento, implicando que a qualidade de vida de duas pessoas com as mesmas capacidades possa ser diferente, dependendo como cada uma lida com o contexto e com as adversidades (Diener, 2000). Em geral, os indicadores subjetivos e objetivos apresentam uma fraca correlação, o que sugere que ambos contribuem de forma independente para estimar o constructo de qualidade de vida (Cummins, 2000).

Vários autores concordam que a qualidade de vida relacionada com a saúde (QVRS) é um constructo multidimensional e documentado por diversos estudos nacionais e internacionais em populações adultas (Ravens-Sieberer et al., 2001). Todavia, quando a população em estudo são crianças e adolescentes a consonância é menor, uma vez que existem dificuldades em descrever o conceito de QVRS na população mais jovem. Essas dificuldades perpassam âmbitos como a capacidade das crianças expressarem opiniões, atitudes e sentimentos sobre a sua QVRS, o seu domínio de recursos para compreenderem o conceito em questão e a autoavaliação dos aspetos da própria saúde e bem-estar ser determinada pela idade, maturidade e desenvolvimento cognitivo. Salienta-se que as crianças e os adolescentes não enfatizam as mesmas dimensões da QVRS que os adultos (Ravens-Sieberer et al., 2001).

Tem sido reconhecido o papel importante que esta faixa etária, infância/adolescência, desempenha na saúde pública global, justificando, assim, uma abordagem centrada na qualidade de vida que permita aumentar a compreensão e o conhecimento sobre a saúde nos jovens. Este aprofundamento parece fundamental para alicerçar políticas promotoras de saúde e de bem-estar nestas faixas etárias (Fuh, Wang, Lu, & Juang, 2005) e para promover práticas estimuladoras de desenvolvimento positivo em todos os âmbitos da vida da criança e do adolescente, nomeadamente nos contextos socializadores, como é o caso da família, dos pares, da escola e da comunidade (Ferraz, Tavares, & Zilberman, 2007).

Não obstante o crescente interesse por este tema, quer em termos de investigação, quer no domínio dos cuidados e das políticas de saúde, é ainda escassa a investigação em crianças com idades entre os 6 e os 12 anos. Apenas 9% dos estudos envolve a avaliação da própria criança sobre a sua qualidade de vida (Wallander et al., 2001). Neste contexto, pode referir-se que existe um número reduzido de questionários genéricos que avaliam a QVRS em crianças e adolescentes (Gaspar & Matos, 2008).

Segundo Hawthorne, Richardson e Osborne (1999) são necessários instrumentos de medição da qualidade de vida de fácil aplicação, que não impliquem grande sobrecarga para os respondentes e que possam ser administrados em populações epidemiológicas e em populações clínicas, em contextos genéricos e clínicos.

Apesar de existirem alguns instrumentos adaptados para a população portuguesa que avaliam a qualidade de vida em crianças e adolescentes, tais como o Kidscreen (Gaspar & Matos, 2008) e o inventário pediátrico de qualidade de vida (PedsQL) (Lima, Guerra, & Lemos, 2009), não deixam de ser necessários mais instrumentos de medida que possam contribuir para a avaliação deste constructo tão relevante.

Neste sentido, a presente investigação possui como principal objetivo a análise das qualidades psicométricas e validação de um novo instrumento de medição da qualidade de vida para adolescentes, designado por Youth Quality of Life (YQOL-R). Optou-se por este instrumento pela sua fundamentação teórica, por ser amplamente utilizado em investigações internacionais e por ter mostrado boas propriedades psicométricas incentivadoras da sua aplicação.

O YQOL-R foi desenvolvido por Patrick, Edwards e Topolski (2002) para colmatar a escassez de instrumentos de avaliação da qualidade de vida focados nos aspetos positivos da adolescência, baseados nas perspetivas e linguagem dos mesmos e aplicáveis tanto a populações gerais como a amostras vulneráveis. Deste modo, através da realização de entrevistas abertas a jovens dos 12 aos 18 anos, com e sem deficiência, bem como, através da consulta de outros instrumentos existentes (e.g., National Longitudinal Adolescent Health Survey) foi desenvolvido um modelo concetual de qualidade de vida que deu origem ao referido questionário.

Após uma sucessão de procedimentos, o YQOL-R resultou num instrumento de medida com capacidade de avaliar a perceção da qualidade de vida, tendo em conta a informação de quatro domínios específicos: individual (procura avaliar os sentimentos do adolescente sobre si mesmo), relações sociais (incide nas relações do adolescente com os outros), ambiente (avalia as oportunidades e obstáculos no meio social e cultural) e qualidade de vida geral (examina o quão satisfeito o adolescente se sente em relação à sua vida na generalidade). 

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MÉTODOS

Amostra

A amostra é constituída por 507 adolescentes, 287 do sexo feminino (56,6%) e 220 do sexo masculino (43,4%), com idades compreendidas entre os 12 e os 19 anos, sendo a média de idades de 15,74 anos (DP = 1,62). Estes jovens frequentam entre o 7º e o 12º ano de escolaridade, com uma média de 10,28 (DP = 1,55).

Rapazes e raparigas não diferem significativamente no que respeita à média de idades (t(443, 52) = 0,28; p = 0,779) e anos de escolaridade (t(450, 81) = 0,75; p = 0,451).

Instrumentos

O Youth Quality of Life Instrument-research version (YQOL-R) desenvolvido por Patrick, Edwards e Topolski (2002), traduzido por instrumento de avaliação da qualidade de vida nos adolescentes, é um questionário de autorresposta constituído por 41 itens, que avaliam a qualidade de vida tendo em conta a informação de 4 domínios específicos: individual, relações sociais, ambiente e qualidade de vida geral (Patrick et al., 2002). Para o seu preenchimento é pedido aos jovens para assinalarem, numa escala de 0 a 10 pontos (onde 0 indica de modo nenhum e 10 indica completamente), o número que melhor se aplica ao que sente. Quanto mais elevados forem os resultados, maiores são os níveis de qualidade de vida.

Os estudos realizados sobre a versão original indicaram que o YQOL-R apresenta uma consistência interna adequada, variando os alfas de Cronbach entre 0,77 e 0,96 (Patrick et al., 2002).

Informação aprofundada sobre o desenvolvimento deste instrumento e dos seus domínios encontra-se descrita na secção anterior onde é apresentada uma revisão do mesmo. No presente estudo, os valores da consistência interna serão posteriormente apresentados, uma vez que este instrumento será objeto de análise detalhada.

O Kidscreen, desenvolvido por Ravens-Sieberer e European KIDSCREEN Group (2005), (versão portuguesa de Gaspar & Matos, 2008) é um instrumento estandardizado que avalia a qualidade de vida em crianças e adolescentes (Gaspar & Matos, 2008).

O instrumento Kidscreen-27 é uma versão reduzida do Kidscreen-52, onde foram selecionados 27 itens da versão original e agrupados em 5 dimensões: bem-estar físico, bem-estar psicológico, autonomia e relações com os pais, suporte social e grupo de pares, e ambiente escolar.

Este questionário é aplicável a crianças e adolescentes entre os 8 e os 18 anos de idade e pode ser utilizado em estudos epidemiológicos, e como instrumento complementar em pesquisas de monitorização com crianças e adolescentes com doença crónica (Gaspar & Matos, 2008).

É um questionário de autopreenchimento, no qual se pede ao sujeito que responda que afirmações se aplicaram a ele na última semana. Relativamente à pontuação, um valor baixo neste instrumento reflete sentimento de infelicidade, insatisfação e desadequação face aos diversos contextos da vida da criança e adolescente, nomeadamente, família, grupo de pares e escola. Uma cotação elevada revela uma sensação de felicidade, perceção de adequação e satisfação com os seus contextos (Gaspar & Matos, 2008).

Na versão original, o Kidscreen-27 apresentou valores de alfa de Cronbach que variam entre 0,80 e 0,84 para as diferentes subescalas que a constituem (Ravens-Sieberer et al., 2007). Na versão portuguesa foram obtidos níveis de consistência interna moderados a elevados para a totalidade da escala (a = 0,89) (Gaspar & Matos, 2008). Na amostra da nossa investigação, o Kidscreen-27 mostrou ter uma consistência interna razoável a boa (Pestana & Gageiro, 2008), oscilando os valores de alfas de Cronbach entre 0,71 (para a dimensão ambiente escolar) e 0,87 (para a dimensão bem-estar psicológico).

A Escala de Ansiedade, Depressão e Stresse (EADS-21; Lovibond & Lovibond, 1995; Pais-Ribeiro, Honrado, & Leal, 2004) é um instrumento de autorresposta que pretende avaliar três constructos, a depressão, a ansiedade e o stresse mediante um modelo tripartido (Pais-Ribeiro et al., 2004).

No presente estudo foi utilizada a versão reduzida de 21 itens (EADS-21), que propõe medir os mesmos constructos do mesmo modo que a versão de 42 itens (Pais-Ribeiro et al., 2004).

A EADS organiza-se em três escalas: depressão, ansiedade e stresse, incluindo cada uma delas sete itens, formando no total 21 itens. Cada item consiste numa frase que remete para sintomas emocionais negativos. Os sujeitos avaliam a extensão em que experimentaram cada sintoma durante a última semana, numa escala de 4 pontos de gravidade ou frequência: 1 - “não se aplicou nada a mim”, 2 - “aplicou-se a mim algumas vezes”, 3 - “aplicou-se a mim muitas vezes” e 4 - “aplicou-se a mim a maior parte das vezes” (Pais-Ribeiro et al., 2004). Os resultados de cada escala são determinados pela soma dos resultados dos sete itens. A escala fornece três notas, uma por cada escala, em que o mínimo é 0 e o máximo é 21. As notas mais elevadas em cada escala correspondem a estados afetivos mais negativos (Pais-Ribeiro et al., 2004).

No que diz respeito à consistência interna obtida na versão inglesa original da EADS, esta foi favorável, com valores de alfa de Cronbach de 0,81 para a depressão, de 0,83 para a ansiedade e de 0,81 para o stresse (Lovibond & Lovibond, 1995). Quanto à versão portuguesa, os valores da consistência interna encontrados foram respetivamente de 0,85 para a escala da depressão, de 0,74 para a de ansiedade e de 0,81 para a de stresse (Pais-Ribeiro et al., 2004). Na amostra do presente estudo, verificaram-se também valores adequados de consistência interna (depressão: α = 0,88, ansiedade: α = 0,83 e stresse: α = 0,87). Como se pode constatar, os valores obtidos nesta amostra são semelhantes aos obtidos no estudo original.

Procedimento metodológico

Num primeiro momento, procedeu-se à recolha das autorizações dos autores para a utilização dos questionários.

Após o consentimento e recomendações por parte dos autores, o YQOL-R foi traduzido e adaptado para a língua portuguesa segundo o método da tradução e retroversão (Hill & Hill, 2008), envolvendo três especialistas na área de avaliação com domínio da língua inglesa e portuguesa. Inicialmente o inventário foi traduzido por dois investigadores fluentes na língua inglesa. Depois de comparadas as discrepâncias, uma versão final foi gerada a qual foi submetida a retroversão por um nativo da língua inglesa com sólidos conhecimentos e fluência na língua portuguesa. A equivalência linguística e semântica foi analisada, de acordo com as recomendações para este tipo de estudos (Hambleton, Merenda, & Spielberger, 2005; International Test Commission, 2010), tendo-se verificado um elevado grau de semelhança entre ambas as versões.

De seguida foram contactadas as escolas onde iriam ser recolhidos os dados, tendo sido previamente pedida a autorização aos diretores dos referidos estabelecimentos de ensino. Posteriormente, foram contactados os encarregados de educação dos alunos, bem como os alunos, com o intuito de solicitar o consentimento informado. A participação no estudo foi anónima e voluntária, tendo sido garantidos os princípios éticos de investigação.

Procedimento estatístico

A fim de analisar os dados recolhidos, recorreu-se ao software estatístico Statistical Package for the Social Sciences (IBM SPSS Statistics, versão 19.0 para Windows, SPSS, 2011)

Foi utilizada a estatística paramétrica dado o tamanho da amostra o justificar. Explorou-se o pressuposto da distribuição normal das variáveis, com recurso ao teste Kolmogorov-Smirnov e ainda aos coeficientes de assimetria (Skewness) e de achatamento (Kurtosis), uma vez que o teste de K-S é sensível ao tamanho da amostra. Os resultados obtidos permitiram-nos concluir, de acordo com Kline (2005), que os dados das variáveis em estudo seguem uma distribuição normal, já que SK < |3| e Ku < |10|, sugerindo que nenhuma variável apresentou valores indicadores de violações na distribuição.

Com o intuito de examinar as diferenças entre sexos para variáveis contínuas de interesse (idade, anos de escolaridade e dimensões ou totais dos instrumentos de medida) foi realizado o teste t de Student para amostras independentes. Para medir a dimensão do efeito (i.e., da magnitude das diferenças encontradas entre os grupos em comparação) calculou-se o Eta2 interpretado de acordo com as diretrizes de Cohen (1992).

Na cotação do instrumento em estudo, seguiu-se as recomendações dos autores da versão original da escala (Patrick et al., 2002). O YQOL-R fornece um perfil de qualidade de vida dos adolescentes através de quatro domínios (individual, relações socais, ambiente e qualidade de vida geral), permitindo ainda, uma pontuação total de qualidade de vida. Cada item contribui equitativamente para cada subescala. Primeiro, os itens que estão formulados na negativa são cotados inversamente (itens 21 e 28) e, assim, os resultados elevados representam elevados níveis de qualidade de vida. Segundo, todos os itens são transformados numa escala de 0 a 100 pontos, usando a seguinte fórmula (nota t):

t = (pontuação no item – pontuação mínima da escala de resposta) / pontuação máxima da escala de resposta x 100

Esta transformação converte as pontuações baixas e altas em 0 e 100, respetivamente. As pontuações obtidas entre estes valores representam a percentagem da pontuação total possível alcançada. Após obter a pontuação t para cada item, calcula-se a média para cada domínio e para o total percetual de qualidade de vida.

No estudo exploratório das dimensões do YQOL-R, recorreu-se à análise de componentes principais com rotação varimax ortogonal que permitiu analisar o agrupamento das variáveis em fatores.

A análise da consistência interna dos vários instrumentos de autorresposta foi calculada através do alfa de Cronbach, uma vez que é considerada a melhor estimativa de fidelidade de um teste (Pallant, 2010).

Foi utilizado o coeficiente de correlação de Pearson no estudo da estabilidade temporal do YQOL-R, bem como na análise da sua validade convergente e divergente, tendo sido considerada a convenção de Pestana e Gageiro (2008) na determinação das magnitudes das associações. Para a determinação da estabilidade temporal do YQoL, procedeu-se a uma segunda administração deste instrumento com um intervalo de três semanas, recorrendo a uma subamostra aleatória da amostra inicial constituída por 56 adolescentes.

 

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RESULTADOS

 

 

Análise fatorial exploratória dos itens

À semelhança do procedimento estatístico utilizado no estudo original (Patrick et al., 2002) procedeu-se a uma análise fatorial exploratória para analisar a estrutura dimensional da versão portuguesa do YQOL-R.

Num primeiro momento foi averiguada a indicação do número de fatores a reter, tendo em conta o critério de Kaiser, valor próprio (eigenvalue) igual ou superior a 1 (Marôco, 2010), e perceber se o mesmo era coincidente com a proposta dos autores.

Os resultados desta primeira solução indicaram 8 fatores a explicarem 63,88% da variância total. No entanto, pela observação do scree test de Cattell, apontado como o melhor método para a extração de fatores, existe uma maior inflexão da curva entre o terceiro e o quarto componente. Consequentemente foi repetida a análise, forçando o número de fatores a 4 componentes, o que é consistente com a indicação teórica do modelo segundo os autores desta escala, utilizando-se a rotação varimax ortogonal para a solução de 4 fatores. Os resultados mostraram uma adequação da matriz [Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) = 0,95; teste de esfericidade de Bartlett χ²(820) = 12397,77; p < 0,001] a explicarem 52,48% da variância total.

Para a análise dos dados foi considerado um valor de saturação fatorial dos itens superior a 0,30, a não existência de saturações duplas (crossloadings) e a constituição de cada fator pelo mínimo de três itens (Costello & Osborne, 2005).

Verificou-se que o item 31 (“gosto da minha vizinhança”) apresentou uma saturação fatorial inferior a 0,30 nos quatro domínios, revelando ainda uma baixa correlação com os restantes itens da escala, razão pela qual foi excluído da matriz, repetindo-se seguidamente o mesmo procedimento estatístico.    

A solução de 4 fatores sem o item 31 passou a explicar 53,55% da variância total. Na Tabela 1 são apresentadas as saturações e comunalidades dos quatro fatores do YQOL-R.

 

 

 

Tabela 1

Saturações Fatoriais e Comunalidades (h2) para a Estrutura Fatorial da Versão Portuguesa do YQOL-R (N = 507)

 

 

Item

Fatores

 

 

 

1

2

3

4

h2

 

 

1. Eu continuo a tentar, mesmo que não seja bem-sucedido(a) à primeira.

0,12

0,33

-0,04

0,56

0,48

 

 

2. Eu consigo lidar com a maior parte das dificuldades que surgem no meu caminho.

0,04

0,56

0,06

0,44

0,52

 

 

3. Sou capaz de fazer a maior parte das coisas tão bem quanto eu queria.

0,06

0,62

0,01

0,35

0,51

 

 

4. Sinto-me bem comigo mesmo(a).

0,16

0,76

0,31

0,09

0,71

 

 

5. Sinto que sou importante para os outros.

0,13

0,69

0,32

0,14

0,61

 

 

6. Sinto-me confortável com os meus sentimentos e comportamentos enquanto rapaz/rapariga.

0,25

0,62

0,36

0,11

0,59

 

 

7. Sinto energia suficiente para fazer as coisas que eu quero fazer.

0,21

0,57

0,23

0,23

0,48

 

 

8. Estou satisfeito(a) com a minha aparência.

0,16

0,71

0,31

0,06

0,64

 

 

9. Sinto-me capaz de lidar com a quantidade de stress na minha vida.

0,16

0,70

0,21

0,15

0,59

 

 

10. Sinto que não há problema se eu cometer algum erro.

0,09

0,53

0,06

0,01

0,30

 

 

11. Sinto que a minha vida tem significado.

0,30

0,59

0,27

0,07

0,52

 

 

12. Os meus valores pessoais dão-me força.

0,31

0,61

0,23

0,27

0,60

 

 

13. Sinto que a maior parte dos adultos me trata honestamente.

0,51

0,29

0,19

0,26

0,45

 

 

14. Sinto que tenho a devida atenção por parte da minha família.

0,82

0,19

0,15

0,10

0,74

 

 

15. Sinto-me compreendido/a pelos meus pais ou encarregados de educação.

0,79

0,28

0,11

0,00

0,72

 

 

16. Sinto-me útil e importante para a minha família.

0,77

0,38

0,17

0,11

0,77

 

 

17. Sinto que a minha família se preocupa comigo.

0,85

0,17

0,15

0,14

0,80

 

 

18. A minha família encoraja-me a fazer o meu melhor.

0,83

0,18

0,11

0,13

0,75

 

 

19. Sinto que me dou bem com os meus pais ou encarregados de educação.

0,85

0,12

0,12

0,13

0,76

 

 

20. Sinto que os meus pais permitem que eu participe nas decisões importantes que me envolvem/afetam.

0,64

0,12

0,11

0,25

0,50

 

 

21. Sinto-me sozinho(a) na vida.

0,17

0,32

0,49

0,05

0,37

 

 

22. Eu tento ser um modelo para os outros.

-0,02

0,36

-0,24

0,44

0,38

 

 

23. Eu posso dizer aos meus amigos aquilo que eu realmente sinto.

0,09

0,27

0,51

0,21

0,39

 

 

24. Sinto-me satisfeito/a com os amigos que tenho.

0,06

0,15

0,77

0,17

0,64

 

 

25. Sinto-me satisfeito/a com a minha vida social.

0,17

0,32

0,69

0,17

0,64

 

 

26. Sinto que posso participar nas mesmas atividades que os outros da minha idade.

0,23

0,21

0,61

0,17

0,49

 

 

27. As pessoas da minha idade tratam-me com respeito.

0,19

0,24

0,60

0,19

0,49

 

 

28. Sinto-me posto/a de parte por ser como sou.

0,13

0,16

0,49

-0,01

0,29

 

 

29. Sinto que a minha vida está cheia de coisas interessantes para fazer.

0,29

0,49

0,32

0,18

0,46

 

 

30. Gosto de experimentar coisas novas.

0,09

0,04

0,37

0,54

0,44

 

 

32. Tenho expectativas (esperanças) em relação ao futuro.

0,21

0,22

0,27

0,53

0,45

 

 

33. A minha família tem dinheiro suficiente para viver uma boa vida.

0,31

0,19

-0,00

0,46

0,34

 

 

34. Sinto-me seguro(a) quando estou em casa.

0,47

0,05

0,17

0,42

0,43

 

 

35. Sinto que estou a ter uma boa educação.

0,62

-0,01

0,26

0,40

0,61

 

 

36. Eu sei como obter a informação de que necessito.

0,26

0,06

0,27

0,59

0,49

 

 

37. Gosto de aprender coisas novas.

0,16

0,13

0,32

0,65

0,56

 

 

38. Sinto-me seguro(a) quando estou na escola.

0,29

0,14

0,24

0,35

0,28

 

 

39. Gosto da vida.

0,39

0,47

0,37

0,21

0,55

 

 

40. Sinto-me satisfeito(a) com a minha vida tal como é agora.

0,43

0,51

0,37

0,13

0,60

 

 

41. Sinto que a vida vale a pena.

0,40

0,49

0,32

0,20

0,55

 

 

Valor próprio

14,67

3,13

1,88

1,74

 

 

 

Variância explicada

36,66

7,83

4,70

4,35

 

 

 

 

 

Após a análise da Tabela 1 foi possível verificar que o Componente 1 parece corresponder ao domínio das relações sociais com 10 itens, o que no estudo original é composto por 14. O Componente 2 parece corresponder ao domínio individual com 15 itens (14 na versão original). O Componente 3 parece corresponder ao domínio do ambiente com 7 itens (10 na versão original). Por fim, o Componente 4 parece corresponder ao domínio da qualidade de vida geral com 8 itens (3 na versão original) (Tabela 2).

 

 

TABELA 2

Itens do YQOL-R da Versão Original e da Versão Portuguesa

 

 

Domínio

Itens da versão original

Itens da versão portuguesa

 

 

Individual

1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 21 e 28

2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 29, 39, 40, 41

 

 

Relações sociais

13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 22, 23, 24, 25, 26, 27

13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 34, 35

 

 

Ambiente

29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38

21, 23, 24, 25, 26, 27, 28

 

 

Qualidade de vida geral

39, 40, 41

1, 22, 30, 32, 33, 36, 37, 38

 

 

Total

1-41

1-40

 

 

Análise dos itens e consistência interna

O YQOL-R revelou ter uma consistência interna razoável a muito boa, com valores de alfa de Cronbach de 0,93 para o domínio individual, de 0,93 para o domínio das relações sociais, de 0,81 para o domínio do ambiente e de 0,74 para o domínio da qualidade de vida geral (Pestana & Gageiro, 2008).

Através da análise dos itens (Tabela 3) foi possível certificar que todos mostram correlações item-total superiores ou iguais a 0,41, exceto o item 22 (“eu tento ser um modelo para os outros”) que apresentou uma correlação de 0,29. Quando eliminado este item, o valor de alfa de Cronbach não foi alterado, pelo que foi decidido mantê-lo na escala.

 

 

Tabela 3

Médias, Desvios-Padrão, Correlações Item-Total e Coeficientes de Consistência Interna Para Cada Item do YQOL-R

 

 

Itens

M

DP

r item-total

α de Cronbach se o item for removido

 

 

2

66,73

19,02

0,52

0,93

 

 

3

60,39

18,79

0,55

0,93

 

 

4

67,26

24,25

0,78

0,92

 

 

5

61,44

22,47

0,70

0,92

 

 

6

71,70

21,72

0,70

0,92

 

 

7

73,31

21,63

0,64

0,93

 

 

8

64,20

25,14

0,72

0,92

 

 

9

61,32

23,52

0,70

0,92

 

 

10

50,67

25,84

0,43

0,93

 

 

11

70,28

25,65

0,67

0,93

 

 

12

73,61

20,47

0,73

0,92

 

 

29

70,75

24,13

0,64

0,93

 

 

39

80,97

22,24

0,70

0,92

 

 

40

71,70

24,60

0,72

0,92

 

 

41

79,84

23,82

0,70

0,92

 

 

Domínio individual

1024,16

244,60

0,93

 

 

13

76,67

18,75

0,60

0,93

 

 

14

80,24

21,18

0,82

0,92

 

 

15

75,01

24,20

0,77

0,92

 

 

16

77,04

23,49

0,81

0,92

 

 

17

84,16

19,33

0,85

0,92

 

 

18

83,77

20,84

0,81

0,92

 

 

19

84,54

20,71

0,82

0,92

 

 

20

78,60

20,79

0,64

0,93

 

 

34

85,11

17,86

0,52

0,93

 

 

35

86,47

16,89

0,65

0,93

 

 

Domínio relações sociais

811,60

160,84

0,93

 

 

21

71,56

28,67

0,49

0,80

 

 

28

74,32

28,04

0,43

0,81

 

 

23

69,19

22,75

0,48

0,79

 

 

24

79,49

19,19

0,64

0,77

 

 

25

73,83

21,18

0,67

0,76

 

 

26

79,84

21,26

0,58

0,77

 

 

27

76,29

19,27

0,61

0,77

 

 

Domínio ambiente

524,52

110,18

0,81

 

 

1

71,24

18,78

0,44

0,71

 

 

22

49,15

28,77

0,29

0,76

 

 

30

84,85

18,21

0,45

0,71

 

 

32

79,23

20,84

0,54

0,69

 

 

33

71,08

21,71

0,41

0,71

 

 

36

82,86

15,64

0,50

0,70

 

 

37

86,25

16,02

0,57

0,69

 

 

38

74,06

22,45

0,41

0,72

 

 

Domínio qualidade de vida geral

598,74

98,12

0,74

 

 

Nota. M = Média; DP = Desvio padrão; r = correlação.

 

 

Fidelidade teste-reteste

A fim de analisar a estabilidade temporal, o YQOL-R foi novamente administrado, três semanas mais tarde a um grupo de 56 adolescentes.

Os resultados mostraram uma boa estabilidade temporal do instrumento para os vários domínios, nomeadamente para o domínio individual (r = 0,87; p < 0,001), relações sociais (r = 0,79; p < 0,001), ambiente (r = 0,76; p < 0,001), qualidade de vida geral (r = 0,78; p < 0,001) e para o total do questionário (r = 0,87; p < 0,001) (Pestana & Gageiro, 2008).

Validade convergente e divergente

Para estudar a validade convergente e divergente do YQOL-R foi analisada, respetivamente, a sua associação com o Kidscreen-27 e com a Escala da depressão, ansiedade e stresse (EADS-21).

Todas as dimensões do YQOL-R (individual, relações sociais, ambiente e qualidade de vida em geral) estão significativa e positivamente associadas a todas as dimensões da qualidade de vida avaliadas pelo Kidscreen-27 (bem-estar físico, bem-estar psicológico, autonomia, grupo de pares e ambiente escolar). Se tivermos em conta apenas o total do YOQL-R, verifica-se a existência de uma associação positiva moderada a elevada com as dimensões do Kidscreen, o que atesta a sua validade convergente (Tabela 4).

Quanto à validade divergente, verifica-se que todas as dimensões da qualidade de vida (YOQL-R) apresentam uma correlação significativa e negativa com a ansiedade, depressão e stresse. Relativamente aos valores totais do YOQL-R, salienta-se uma associação negativa alta com a depressão (r = -0,62), e moderada com o stresse (r = -0,46) e com a ansiedade (r = -0,41). Por outras palavras, os adolescentes que percecionam níveis mais elevados de qualidade de vida, demonstram menores níveis de depressão, stresse e ansiedade (ver Tabela 4).

 

TABELA 4

Correlações Entre as Variáveis em Estudo

 

 

 

Individual

Relações sociais

Ambiente

Qualidade de vida geral

YQOL total

 

 

Kidscreen-27

 

 

 

 

 

 

 

Bem-estar físico

0,44*

0,32*

0,37*

0,34*

0,45*

 

 

Bem-estar psicológico

0,73*

0,50*

0,65*

0,43*

0,71*

 

 

Autonomia

0,41*

0,60*

0,41*

0,37*

0,55*

 

 

Grupo de pares

0,36*

0,25*

0,58*

0,30*

0,45*

 

 

Ambiente escolar

0,48*

0,37*

0,34*

0,50*

0,51*

 

 

EADS-21

 

 

 

 

 

 

 

Depressão

-0,66*

-0,43*

-0,54*

-0,39*

-0,62*

 

 

Ansiedade

-0,43*

-0,31*

-0,40*

-0,20*

-0,41*

 

 

Stresse

-0,48*

-0,36*

-0,42*

-0,23*

-0,46*

 

 

Nota. * p < 0,001; EADS: Escala de Ansiedade, Depressão e Stresse; YQOL-R : Youth Quality of Life Instrument-Research Version.

 

 

Influência do sexo, idade e ano de escolaridade

A idade e os anos de escolaridade não se mostraram significativamente correlacionados com os domínios da qualidade de vida (YQOL-R), ou seja, estas variáveis parecem não ter um impacto na perceção da qualidade de vida nos jovens.  

Já em relação à variável sexo, os resultados evidenciaram diferenças estatisticamente significativas, à exceção dos domínios de relações sociais e qualidade de vida geral, onde os valores médios não se distinguiram. Verificaram-se, por sua vez, diferenças estatisticamente significativas em função do sexo para os domínios individual (t = -5,40; p < 0,001), ambiente (t = -2,10; p = 0,036) e qualidade de vida total (t = -2,46; p = 0,014). Em qualquer destes domínios os rapazes evidenciaram médias mais elevadas que as raparigas (ver Tabela 5). De acordo com Cohen (1992), os valores de Eta2 revelam um tamanho do efeito insignificante ou pequeno.

 

 

TABELA 5

Médias, Desvios-padrão e Teste t de Student (Amostras Independentes) para a Verificação das Diferenças de Género.

 

 

 

Rapazes

(n = 220)

Raparigas

(n = 283)

t

p

Eta2

 

 

YQOL-R

M

DP

M

DP

 

 

Individual

72,53

14,32

65,02

16,99

-5,40

< 0,001

0,052

 

 

Relações sociais

81,64

15,67

80,79

16,41

-0,59

0,553

 

 

 

Ambiente

76,59

15,12

73,66

16,11

-2,10

0,036

0,009

 

 

Qualidade de vida geral

74,64

12,42

75,00

12,16

0,32

0,749

 

 

 

YQOL total

76,35

12,27

73,62

12,59

-2,46

0,014

0,012

 

 

Nota. YQOL-R = Youth Quality of Life Instrument-Research Version.

 

 

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DISCUSSÃO

O presente estudo teve como objetivo primordial a análise das qualidades psicométricas e validação do Youth Quality of Life (YQOL-R) para a população portuguesa. Neste sentido, procedeu-se à análise da sua estrutura fatorial, consistência interna, seguindo-se a avaliação da estabilidade temporal e validade convergente e divergente.

A fim de testar a estrutura fatorial da versão portuguesa do YQOL-R recorreu-se a uma análise fatorial confirmatória, tendo, numa primeira fase, identificado o item 31 (“gosto da minha vizinhança”) como apresentando uma saturação fatorial inferior a 0,30 nos quatro domínios (individual, relações sociais, ambiente e qualidade de vida geral), revelando ainda uma baixa correlação com os restantes itens da escala. Por este motivo, o referido item foi excluído da matriz, repetindo-se seguidamente o mesmo procedimento estatístico. A solução de 4 fatores sem o item 31 passou a explicar 54% da variância total.

Acrescenta-se ainda que a estrutura fatorial da versão em estudo apresentou resultados variados comparativamente com o estudo original, no entanto, estes são similares ao do estudo realizado no Brasil sobre a adaptação do YQOL-R para a população brasileira (Salum, Patrick, Isolan, Manfro, & Fleck, 2012). 

O facto de alguns itens terem migrado para outros domínios pode ser justificado pelo conteúdo dos próprios itens. Por exemplo, na análise exploratória do presente estudo, os itens alusivos à amizade apresentaram cargas mais elevadas no domínio do ambiente do que no domínio das relações sociais. Isto porque o domínio do ambiente apresenta vários itens relacionados com o ambiente escolar (e.g., “sinto que posso participar nas mesmas atividades que os outros da minha idade” e “as pessoas da minha idade tratam-me com respeito”). Além disso, torna-se importante destacar que no estudo original existem itens que saturam em mais do que um fator e os autores optaram por mantê-los nos domínios formulados teoricamente. Este facto pode comprometer as análises em outras amostras, e em especial noutros países, devido a questões culturais e linguísticas.

Relativamente à análise dos itens e à sua consistência interna, verificou-se que o YQOL-R apresenta uma boa qualidade dos mesmos, não obstante a existência de um item (22) com um baixo valor de correlação com o total da escala. Optou-se por não o retirar, uma vez que não alterava a consistência interna da escala avaliada pela determinação do alfa de Cronbach. À semelhança dos resultados obtidos no estudo original (Patrick et al., 2002), a versão portuguesa do YQOL-R obteve valores elevados de consistência interna, sendo assim indicador de uma boa fidelidade deste instrumento.

Quanto à estabilidade temporal, esta foi avaliada com três semanas de intervalo, evidenciando os resultados uma boa estabilidade deste instrumento para os vários domínios.

Foram obtidas correlações significativas e no sentido esperado, quer com as subescalas do KidScreen (qualidade de vida), quer com as subescalas de depressão, ansiedade e stresse, o que abona em favor da validade convergente e divergente do YQOL-R.

Por último, quando analisada as diferenças entre sexos em relação à perceção da qualidade de vida, verificou-se que os rapazes evidenciaram médias mais elevadas relativamente às raparigas, não obstante o referido efeito ser de tamanho pequeno. O mesmo resultado foi encontrado no estudo de Gaspar e Matos (2008). 

Apesar de os resultados das qualidades psicométricas do YQOL-R na versão portuguesa serem adequados, o facto de se tratar de um questionário de autorresposta baseado apenas nos relatos dos adolescentes, pode ser uma limitação. Estudos futuros podem beneficiar de entrevistas semiestruturadas e/ou multi-informadores para complementar a avaliação da perceção de qualidade de vida nesta faixa etária.

Uma vez que na versão em estudo, vários itens migram para outros componentes, o mesmo acontecendo no estudo brasileiro, torna-se importante continuar a explorar e estudar os itens do YQOL-R em outras amostras de adolescentes e em outros países.

Salienta-se ainda que os resultados não podem ser generalizados para populações clínicas, pelo que estudos futuros devem usar amostras clínicas.

Não obstante as referidas recomendações, o presente estudo contribuiu para a disponibilização de um novo instrumento para avaliação da qualidade de vida em crianças e adolescentes, o qual evidenciou boas propriedades psicométricas, apoiando empiricamente a sua utilização nas práticas de saúde e investigação em amostras da comunidade. Deste modo é possível avaliar e comparar a qualidade de vida de grupos de adolescentes vulneráveis (como por exemplo aqueles com disfunções ou cuidados especiais de saúde) com grupos da população geral (Patrick et al., 2002), monitorizar a qualidade de vida relacionada com a saúde, identificar as populações de risco, promover a saúde (Gaspar & Matos, 2008) e ainda, mensurar a satisfação de uma determinada população relativamente ao sistema de saúde (Salum et al., 2012).

Conflito de interesses: nenhum.

Fontes de financiamento: nenhuma.

 

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REFERÊNCIAS

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