Revista Portuguesa de Investigação Comportamental e Social 2021 Vol. 8(2): 1–19
Portuguese Journal of Behavioral and Social Research 2021 Vol. 8(2): 1–19
e-ISSN 2183-4938
Departamento de Investigação & Desenvolvimento • Instituto Superior Miguel Torga

 

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Antecedentes do empenhamento organizacional em trabalhadores não-docentes: estudo de caso numa instituição de ensino superior*

 

Antecedents of organizational engagement in non-teaching employees: A case study in a higher education institution

 

 

João Pedro Cordeiro 1

Pedro Cunha 2

Abílio Afonso Lourenço 3

 

1 Instituto Politécnico de Setúbal, Escola Superior de Ciências Empresariais, Centro de Investigação em Ciências Empresariais (CICE-IPS), Setúbal, Portugal

2 Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Fernando Pessoa, Porto, Portugal

3 Escola Alexandre Herculano, Unidade de Investigação em Psicologia e Educação (UIPS), Porto, Portugal

 

* Artigo escrito em português do Brasil.

 

Recebido: 07/05/2022; Revisto: 31/05/2022; Aceite: 17/08/2022.

 

https://doi.org/10.31211/rpics.2022.8.2.263

 

Resumo

Objetivo: Este estudo teve como objetivo analisar os níveis de empenhamento organizacional e a relação entre o empenhamento e as variáveis sociodemográficas dos profissionais, em contexto de ensino superior. O empenhamento é um aspeto crítico do desempenho individual e um alicerce fundamental do desenvolvimento das organizações. Como é gerido e a interrelação que estabelece com as caraterísticas pessoais tem sido área de desenvolvimento em vários estudos. Métodos: O estudo foi de natureza quantitativa e possuiu um corte transversal, através da aplicação de um inquérito por questionário a 127 trabalhadores não-docentes de uma instituição de ensino superior. O inquérito por questionário foi validado, apresentando boas qualidades psicométricas. Resultados: As hipóteses que sistematizaram as especificações entre as componentes do empenhamento e as variáveis idade, habilitações acadêmicas e categoria profissional foram confirmadas em algumas das suas várias subalíneas, revelando-se determinantes no modo como os indivíduos se encontram empenhados organizacionalmente. As hipóteses que orientaram as especificações entre as componentes do empenhamento e as variáveis gênero e antiguidade não foram confirmadas, não existindo relação entre elas. Conclusões: Os trabalhadores estão empenhados com a instituição, ainda que com níveis diferentes, os quais são ancorados por algumas caraterísticas sociodemográficas. Tratou-se de um estudo pioneiro em contexto nacional entre os diferentes tipos de empenhamento organizacional e as variáveis sociodemográficas, em contexto de ensino superior. Contribuiu para a formulação de estratégias de gestão focadas no empenhamento organizacional, apoiando a formulação de sistemas baseados no comportamento organizacional.

  

Palavras-Chave: Empenhamento Organizacional; Ensino superior; Trabalhadores não-docentes; Variáveis sociodemográficas; Estudo descritivo.

 

Abstract

Objective: This study aimed to analyze the levels of organizational engagement and the relationship between engagement and sociodemographic variables in the higher education context. Engagement is a critical aspect of individual performance and a fundamental building block of organizational development. The way it is managed, and its interrelationship with personal characteristics have been the area of development in several studies. Methods: The study was quantitative and had a cross-sectional nature through the application of a questionnaire survey to 127 non-teaching employees from a higher education institution. The questionnaire survey was validated, showing good psychometric qualities. Results: The hypotheses that systematized the specifications between the engagement components and the age, academic qualifications, and professional position variables have been confirmed in some of their various sub-alignments and can therefore be considered as determining how individuals are organizationally engaged. The hypotheses that guided the specifications between the engagement components and the gender and seniority variables were not confirmed; therefore, there was no relationship between them. Conclusions: The non-teaching employees are engaged in the institution, although with various levels anchored by some sociodemographic characteristics. It was a pioneering study in a national context between the distinct types of organizational engagement and sociodemographic variables in the higher education context. It contributed to the formulation of management strategies focused on organizational commitment, supporting the formulation of systems based on organizational behavior.

 

Keywords: Organizational engagement; Higher education; Non-teaching employees; Sociodemographic variables; Descriptive study.

 

 

Introdução

Para as organizações, ter trabalhadores empenhados é uma importante condição de desenvolvimento, representando uma importante fonte de vantagem competitiva. É por isso decisivo que as organizações conheçam a raiz do empenhamento em contexto, a sua estruturação e as suas causas, para criar condições para o desenvolver, reforçar e consolidar.

Como antecedentes do empenhamento organizacional encontram-se as variáveis sociodemográficas. As caraterísticas individuais e profissionais são, não raras vezes, identificadas como estando na base da explicação do empenhamento organizacional (Cordeiro, 2014; Meyer et al., 1993).

O objetivo geral deste trabalho foi identificar os níveis de empenhamento organizacional dos trabalhadores não-docentes de uma instituição de ensino superior, bem como analisar a relação que se estabelece entre o empenhamento organizacional e as variáveis sociodemográficas destes profissionais, para evidenciar se estas variáveis são, ou não, explicativas deste constructo. No que se refere ao empenhamento organizacional, irá analisar-se e refletir-se sobre o conceito, os modelos enquadradores e a relação entre o empenhamento e as variáveis sociodemográficas. No que se refere às variáveis sociodemográficas, considerar-se-ão o gênero, a idade, as habilitações, a antiguidade e a categoria profissional.

Em termos metodológicos, realizou-se um estudo de caso com recurso à aplicação de um questionário aos trabalhadores não-docentes de uma Instituição de Ensino Superior (IES) de Portugal. Para testar o modelo e as hipóteses inerentes recorreu-se à estatística multivariada através da utilização do programa SPSS/AMOS25.

Este estudo contribuiu para o aprofundamento da compreensão sobre a dinâmica estabelecida entre o empenhamento organizacional e as variáveis sociodemográficas. Ao nível das implicações práticas contribuiu para a concepção e valorização de políticas e práticas de gestão, em contexto de ensino superior, assentes em processos que emergem dos comportamentos e das atitudes tidas no trabalho.

Estruturalmente, este artigo é constituído por três partes principais: na primeira, apresenta-se a revisão da literatura sobre os conceitos principais; na segunda, sistematiza-se a estratégia metodológica adotada; na terceira, realiza-se a apresentação e discussão dos resultados.

 

Revisão da Literatura

Empenhamento Organizacional

O empenhamento organizacional tem estado na agenda das organizações como eixo estruturante da gestão, desde meados dos anos 70, discutindo-se as questões das atitudes e do comportamento dos indivíduos nas organizações, e, mais especificamente, procurando analisar e refletir sobre as diferentes abordagens da relação de vinculação entre indivíduo/organização.

Os indivíduos desenvolvem compromissos vários em diferentes situações, fazendo com que o empenhamento seja parte de um sistema maior ao estabelecer relação com outros fatores (Klein et al., 2022). Em conjugação com outros fatores, numa perspectiva sistêmica e inter-relacional, um alto nível de empenhamento organizacional pode contribuir decisivamente para a eficiência e para a eficácia da organização, tornando-se, desta forma, fundamental no processo de planejamento estratégico, já que poderá determinar em maior ou menor grau o desempenho organizacional de alguns fatores organizacionais com vista ao alcance dos objetivos definidos (Rahman et al., 2018).

Para Meyer e Allen (1997), o empenhamento organizacional pode ser definido como o estado psicológico que vincula a relação do indivíduo à organização, ou seja, como a intensidade e a estabilidade da relação do indivíduo para com a organização em que trabalha, gerando, desta forma, impacto sobre a decisão do profissional de permanecer ou não nessa mesma organização. A conceptualização do empenhamento remete para a sua relevância enquanto processo que contribui para o desenvolvimento de cultura de desempenho (Shahid & Azhar, 2013), com implicações no aumento do empoderamento (Kariuki & Kiambati, 2017), na redução do burnout e das intenções de saída (Parmar et al., 2022), assim como no desenvolvimento de uma atitude mais positiva no e perante o trabalho (Cordeiro & Cunha, 2018).

Ao nível da evolução histórica do constructo, o empenhamento organizacional foi numa primeira fase considerado como um conceito unidimensional (Becker, 1960). Todavia, nas últimas décadas, os investigadores da área do comportamento organizacional e da gestão das organizações, reconhecem a configuração multidimensional do conceito, desenvolvendo modelos teórico-empíricos que procuram dar conta dessa mesma configuração (Allen, 2016; Sloan et al., 2017; Meyer & Espinoza, 2016). Neste sentido, foi o desenvolvimento da configuração unidimensional do conceito que esteve na gênese da discussão teórica e o seu desenvolvimento conduziu ao aparecimento das perspectivas multidimensionais. Estas perspectivas vêm determinar a existência de várias dimensões do conceito, que remetem para diferentes causas e consequências.

A perspectiva multidimensional de empenhamento organizacional de maior relevância é o Modelo das Três Componentes de Meyer e Allen (1991). Neste modelo, os indivíduos estão empenhados através de relações de natureza tridimensional (afetiva, normativa e instrumental), sendo que estas dimensões estão associadas entre si e devem ser analisadas em simultâneo, permitindo uma melhor compreensão sobre o tipo e a intensidade da relação indivíduo/organização (Klein, 2016; Klein et al., 2022). Na primeira dimensão (afetiva) a vinculação entre indivíduo e organização pressupõe a existência de relações de caráter emocional. Na segunda dimensão (normativa), a vinculação entre indivíduo e organização pressupõe a existência de sentimentos de dever moral para com a organização. Quanto à terceira dimensão (instrumental), a vinculação entre indivíduo e organização pressupõe a existência de relações baseadas num investimento pessoal do indivíduo com vista à obtenção de retorno (Sabino et al., 2015).

As três componentes do constructo de empenhamento organizacional, que correspondem a estados psicológicos distintos, devem ser analisadas em simultâneo para permitir uma melhor compreensão da relação entre o indivíduo e a organização, podendo essa relação apresentar diferentes graus ao nível das três dimensões em simultâneo. A análise da relação entre as componentes do empenhamento organizacional não é consensual, existindo estudos que encontraram relações que postulam a inexistência de relações entre as suas diferentes componentes.

As IES, ao congregarem indivíduos com diferentes objetivos profissionais, distintas formações e diversas categorias que trabalham interdependentemente, potenciam a existência de diferentes níveis de empenhamento organizacional. Nas IES é crucial um processo de gestão operacional eficaz dos processos tendentes a incrementar o empenhamento, considerando os desafios e a natureza exigente e diferenciadora deste setor. Os estudos sobre o empenhamento ressalvam a sua importância para as IES, evidenciado níveis altos de empenhamento organizacional dos profissionais docentes (Cordeiro, 2014; Yağar & Dökme, 2019). Estes estão consubstanciados numa maior implicação centrada na valorização da missão e valores destas instituições (Orphan & Broom, 2021) e na percepção que os profissionais têm sobre o seu papel fundamental no desenvolvimento das regiões e do País, no sentido de contribuir para o aumento da sua competitividade pela melhoria das qualificações e das competências.

Especificamente direcionado para a análise do empenhamento dos trabalhadores não-docentes das instituições de ensino, a investigação nesta área é escassa. Há, todavia, alguns estudos internacionais que concluíram pela predominância do empenhamento afetivo (Araújo, 2010; Silva et al., 2021), e, outros, para a predominância do enfoque normativo (Silva et al., 2017). Em termos globais concluem pela existência de níveis de empenhamento positivos, mas medianos apenas (Araújo, 2010; Silva et al., 2017, 2021), a que não é alheio o peso dos processos administrativo-burocrático, típicos do funcionalismo público, associados às funções dos profissionais da tecnoestrutura e dos serviços de apoio destas instituições (Mintzberg, 2010).

Assim, o empenhamento organizacional tem-se revelado determinante para o desenvolvimento das organizações, conduzindo a comportamentos desejáveis tanto para as organizações como para os profissionais (Abro, 2019; Zonatto et al., 2018). O impacto que tem, ou poderá ter, na melhoria da eficácia e da eficiência organizacional faz com que seja um vetor estruturante da gestão das organizações.

 

Empenhamento Organizacional e Variáveis Sociodemográficas

De acordo com Meyer e Allen (1997) os modelos causais do empenhamento organizacional incluem estudos que consideraram que algumas das variáveis sociodemográficas e os aspetos profissionais relacionados com o trabalho/função têm poder explicativo face ao empenhamento organizacional (e.g., Marcoux, et al., 2018; Ocampo-Álvarez et al., 2021; Yağar & Dökme, 2019; Zonatto et al., 2018). Todavia, não encontramos consensualidade nos resultados dos estudos empíricos, havendo mesmo autores (Nunes & Gaspar, 2014) que não encontraram nenhuma correlação.

Apesar de alguns estudos não encontrarem relações significativas entre o empenhamento e a variável gênero (Uchenna & Tolulope, 2013; Yağar & Dökme, 2019), Salas-Vallina e Alegre (2017) concluíram que o empenhamento depende do gênero. Apesar de o empenhamento ser considerado neutro em termos de gênero, os resultados do estudo sobre profissionais de saúde (médicos) mostraram que as mulheres que têm mais responsabilidades domésticas são mais negativamente afetadas no empenhamento, motivado sobretudo por sua vida sobrecarregada.

Ao avaliar o nível de empenhamento entre os professores de IES de Peshawar (Paquistão), bem como a sua relação com a variável gênero, Farooq e Zia (2013) constataram que, embora o nível dos três tipos de empenhamento (afetivo, normativo e instrumental) seja baixo/mediano entre os professores, os homens apresentavam níveis superiores às mulheres. Concomitantemente, Ermis et al. (2015), ao estudarem os professores da área da educação física e esporte de várias universidades da Turquia, encontraram correlações significativas entre o empenhamento e a variável gênero — proeminência do empenhamento emocional nos homens e empenhamento normativo e instrumental nas mulheres.

Zonatto et al. (2018), no âmbito do setor administrativo em contexto industrial, concluíram que os trabalhadores do gênero masculino demonstraram um nível elevado de empenhamento instrumental. Já Ceribeli e Torres (2017) constataram que o nível de empenhamento instrumental é superior entre as mulheres, num estudo sobre os profissionais de empresas brasileiras.

Ocampo-Álvarez et al. (2021) constataram que a variável idade possui um papel preditivo no empenhamento e no otimismo dos trabalhadores de uma organização colombiana do setor das telecomunicações, sendo que os trabalhadores mais jovens revelaram uma maior implicação com a organização. A este nível, Yağar e Dökme (2019) concluíram que à medida que a idade dos profissionais médicos de instituições públicas na Turquia aumenta, os níveis de empenhamento afetivo diminuem.

Num estudo em nove universidades do setor privado no Paquistão, Zia (2014) concluiu que o empenhamento organizacional dos professores de meia-idade é superior ao empenhamento dos professores mais jovens e que os professores na faixa etária mais elevada revelaram um maior empenhamento instrumental. Mathieu e Zagac (1990) e Meyer et al. (1993) detetaram correlações fortes entre o empenhamento afetivo e idade, ou seja, indivíduos com maior idade apresentam níveis de empenhamento afetivo superior.

Ceribeli e Torres (2017), num estudo sobre os profissionais de empresas brasileiras, identificaram diferenças significativas no empenhamento organizacional em função das variáveis idade e habilitações escolares. Constataram que os níveis de empenhamento afetivo e normativo são maiores entre os profissionais com mais idade e menor escolaridade. Zonatto et al. (2018) concluíram que as variáveis sociodemográficas influenciam o empenhamento organizacional, tendo evidenciado que quanto maior a faixa etária, maior é o empenhamento afetivo e normativo e quanto maior o nível de escolaridade, menor é o empenhamento instrumental.

Apesar de Yağar e Dökme (2019) não evidenciarem relações entre as habilitações e o empenhamento, Silva et al. (2017) identificaram relações positivas significativas fortes entre empenhamento organizacional afetivo e a escolaridade dos técnicos administrativos de uma IES.

Num estudo sobre os profissionais não-docentes de uma universidade estatal na Nigéria, Uchenna e Tolulope (2013) concluíram que a variável antiguidade apresenta correlação estatisticamente significativa com o empenhamento, sendo que os profissionais com mais anos na organização apresentam níveis mais elevados de empenhamento, sobretudo, afetivo.

Ocampo-Alvarez et al. (2021) identificaram relação estatisticamente significativa entre a antiguidade e o empenhamento dos trabalhadores na área das telecomunicações, sugerindo que os mais novos tendem a apresentar níveis superiores de dedicação e envolvimento.

A este nível, Marcoux et al. (2018) identificaram que quanto maior é a antiguidade dos trabalhadores de cooperativas de serviços financeiros, maior é a propensão para desenvolver atitudes de nível afetivo e normativo. Simultaneamente, quanto mais elevada for a posição hierárquica, maior é a tendência para elevados níveis de empenhamento organizacional. Em termos específicos, os gerentes e supervisores exibiram um compromisso instrumental mais baixo do que seus subordinados. No mesmo sentido, Mathieu e Zagac (1990) e Meyer et al. (1993) identificaram correlações entre o empenhamento afetivo e a antiguidade e o nível ocupacional — indivíduos com maior antiguidade e maior nível ocupacional na organização apresentaram níveis de empenhamento afetivo superior.

Finalmente, Silva et al. (2017), num estudo sobre a relação entre o perfil dos técnicos administrativos de uma IES, identificaram relações positivas significativas do empenhamento organizacional afetivo e normativo com a categoria profissional, sendo que o empenhamento organizacional normativo se apresentou positivamente relacionado com a antiguidade na empresa. Não encontraram relações positivas com o empenhamento instrumental em nenhuma das variáveis estudadas, destacando relações negativas com a categoria profissional.

Resultados divergentes encontraram Ermis et al. (2015) e Salas-Vallina e Alegre (2017). Os primeiros detetaram associações significativas entre o empenhamento e a categoria profissional, concluindo que profissionais com categorias hierarquicamente superiores tendem a desenvolver um maior empenhamento, sobretudo afetivo e normativo, e um menor empenhamento instrumental. Os segundos evidenciaram que categorias profissionais mais altas na hierarquia não garantem maior empenhamento, ou seja, os funcionários públicos percebem maiores restrições processuais e uma maior ambiguidade de objetivos que podem afetar a motivação, pelo que as chefias superiores revelaram níveis mais baixos de envolvimento nas unidades de saúde.

Em suma, apesar de não existir consenso na matriz conceptual e na dinâmica relacional entre empenhamento e variáveis sociodemográficas, o empenhamento organizacional contribui decisivamente para o funcionamento das organizações, até porque consubstancia a relação de vinculação dos profissionais ao contexto.

 

 

 

Método

Tipo de Investigação e Hipóteses

Metodologicamente, a investigação incide num estudo de caso (Yin, 2015) numa IES portuguesa, com uma vertente quantitativa, analisando os níveis de empenhamento organizacional e a relação entre as variáveis sociodemográficas e o empenhamento dos trabalhadores não-docentes.

Para a realização do estudo, o modelo adotado segue a lógica analítico-interpretativa postulada por Uchenna e Tolulope (2013) e Yağar e Dökme (2019) relativamente à relação entre os antecedentes do empenhamento organizacional, verificando se as características sociodemográficas são, ou não, explicativas de diferentes tipos de empenhamento. As variáveis independentes do estudo são a caracterização sociodemográfica e profissional, enquanto a variável dependente é o empenhamento organizacional, nos seus três tipos.

Tendo por base o quadro teórico apresentado, formularam-se as seguintes hipóteses:

 

Instrumentos

Questionário Sociodemográfico

Realizou-se um questionário sociodemográfico que integrou questões relativas às características pessoais e profissionais (e.g., gênero; idade; habilitação acadêmica; categoria profissional; e antiguidade). Os dados das variáveis de caraterização foram apresentados em classes de modo que os respondentes pudessem escolher as opções de resposta.

 

Modelo das Três Componentes do Empenhamento Organizacional de Meyer Allen (MTCEO) e Questionário de Empenhamento Organizacional (QEO)

O MTCEO (Meyer and Allen's Three-Component Model of Organizational Commitment; versão original de Meyer e Allen, 1997; tradução, adaptação e validação para a realidade portuguesa de Nascimento et al., 2008) avalia o empenhamento organizacional como um estado psicológico e que tem três componentes distintos que afetam como os profissionais se sentem em relação à organização para a qual trabalham. Deste modelo foi criado o questionário de empenhamento organizacional (QEO) que é constituído por 19 itens distribuídos por três componentes: seis itens para a componente afetiva (e.g., “Sinto-me emocionalmente ligado a esta organização”), seis itens para a componente normativa (e.g., “Sinto que tenho um grande dever para com esta organização”), e sete itens para a componente instrumental (e.g., “Acredito que há muito poucas alternativas para pensar em poder sair desta organização”). As questões são fechadas numa escala de resposta tipo Likert com cinco pontos entre discordo totalmente (1) até concordo totalmente (5).

 

Participantes

Dada a natureza do estudo, para obter informações sobre tendências e resultados sobre o tema, optou-se por uma amostragem de conveniência. Esta opção deveu-se, principalmente, à facilidade de acesso, à proximidade do contexto em análise e à dificuldade em compilar todas as unidades (Hair et al., 2010).

No momento da aplicação do questionário, a instituição objeto de estudo tinha cerca de 8000 estudantes dispersos por cinco escolas superiores cujas atividades são coordenadas pelos Serviços Centrais: duas na área da tecnologia, uma na educação, uma nas ciências empresariais e uma na saúde. Possuía cerca de 200 trabalhadores não-docentes dispersos pelas diferentes categorias: dirigentes superiores, dirigentes intermédios, técnicos superiores, especialistas/técnicos de informática, assistentes técnicos e assistentes operacionais.

Foram definidos os seguintes critérios de inclusão dos participantes no estudo: i) ser profissional não-docente de uma das cinco escolas e dos serviços centrais; ii) ter um contrato com a instituição; iii) estar ao serviço no momento da recolha dos dados. Durante o período de aplicação do questionário, nove trabalhadores estavam ausentes do serviço devido a razões médicas. Assim, obteve-se um total de 127 respostas de profissionais não-docentes, correspondendo a uma taxa de resposta de 71,3%. Os respondentes foram considerados individualmente para assegurar a suposição de observações independentes.

A participação dos trabalhadores não-docentes foi estudo foi viabilizada pela Administradora da instituição, pessoa responsável pela gestão destes profissionais, através do envio de um convite via e-mail e do respetivo reforço.

Os participantes eram maioritariamente profissionais: do género feminino (76,4%), entre 40 e 49 anos (51,2%); detentores de licenciatura (36,2%) ou com 12º ano de escolaridade (30,7%); assistentes técnicos (38,6%) e técnicos superiores (24,4%); com níveis elevados de antiguidade (55,1% tinham mais de 16 anos na instituição); e com contrato de trabalho em funções públicas (CTFP) por Tempo Indeterminado (90,6%).

 

Procedimentos

Os preceitos éticos e deontológicos da Declaração de Helsínquia para a investigação foram tidos em consideração ao longo da investigação.

Aquando da realização da investigação estava em fase de constituição do Código e da Comissão de Ética da Instituição de Ensino Superior onde foi desenvolvido o estudo. Por isso, este estudo iniciou-se após a resposta favorável do Presidente da Instituição e da Coordenação do Centro de Investigação a que o investigador pertence, aos quais incumbia a competência pelo cumprimento dos princípios éticos e deontológicos da investigação. Foi, também, solicitado por e-mail o consentimento para a utilização do QEO adaptada à realidade portuguesa aos respetivos autores, tendo sido autorizado.

Como procedimentos éticos garantiu-se ainda participação voluntária, o anonimato e a confidencialidade dos participantes. Foi solicitado aos participantes o consentimento informado, livre e esclarecido, com a descrição do objetivo do projeto e a descrição geral do procedimento de recolha de dados. O consentimento foi disponibilizado através da plataforma LimeSurvey onde foi aplicado o questionário, tendo sido partilhado o link de acesso aos participantes.

 

Análise Estatística

Os dados recolhidos foram exportados para o programa SPSS/AMOS25 para análise. A análise foi eminentemente quantitativa procurando congregar um conjunto de técnicas que pretenderam avaliar a magnitude e direção das associações ou correlações entre as variáveis do estudo.

Foi testada a veracidade de todas as relações definidas entre as variáveis, naquilo que se denomina “ajustamento global do modelo”, ou seja, foi verificada a adequação do modelo à matriz dos dados. Se o ajustamento global do modelo testado for apropriado, aprovam-se as relações ou efeitos apresentados pelas variáveis latentes (fatores) sobre as observadas (itens) (Arbuckle, 2016). Foi verificado, ainda, se havia valores em falta e a presença de outliers, de linearidades e de normalidade, pois esta metodologia requer que as variáveis em estudo sigam uma distribuição normal. Foram ponderados todos os fatores isolados que apresentassem um valor-próprio (eigenvalue) igual ou superior à unidade. Devido à máxima verossimilhança (ML) poder produzir uma distorção quando a suposição de normalidade é violada (Byrne, 2010), de forma preliminar foi examinada a distribuição das variáveis (assimetrias e curtoses). Os coeficientes de assimetria e curtose são utilizados para verificar se um conjunto de dados pode ter sido gerado a partir de uma distribuição normal. Este ajustamento global foi inferido com base num conjunto de índices, designados de índices de ajustamento global do modelo, nomeadamente:  Χ2, Χ2/gl, Índice de Qualidade de Ajuste (GFI ≥ 0,90), Índice de Qualidade de Ajuste Ajustado (AGFI ≥ 0,90), Índice de Ajuste Comparativo (CFI ≥ 0,95; Hu & Bentler, 1999), Índice de Tucker-Lewis (TLI ≥ 0,95; Hair et al., 2010), Erro Quadrático Médio de Aproximação (RMSEA < 0,05; Byrne, 2016) e o N Crítico (CN > 200; Hoelter, 1983) indicando que o valor representa adequadamente o tamanho da amostra. A este nível, neste estudo o índice de Hoelter foi superior a 200 [CN = 240(0,01) – 335(0,05)] o que permite cumprir os pressupostos para a análise, apesar do tamanho da amostra estar um pouco abaixo do recomendado (Hoelter, 1983).

Para examinar a confiabilidade do QEO, utilizou-se o coeficiente alfa de Cronbach com intervalo de confiança (IC) superior a 0,70 (Streiner, 2003). Para a verificação das associações existentes entre as variáveis do modelo foi usado o coeficiente r de Pearson, considerando-se que: r < 0,200 indica um valor muito baixo, entre 0,200–0,399 baixo, entre 0,400–0,699 moderado, entre 0,700–0,899 alto, e entre 0,900–1 muito alto (Marôco, 2018).

Para testar a validade do QEO foi realizada a análise fatorial, tendo considerado como aceitáveis em todas as soluções valores das cargas fatoriais (λ) superiores a 0,40 (Brown, 2015). Foi feita a análise de normalidade das variáveis incluídas no modelo. Os testes paramétricos (ANOVA ou t-Student) são bastante robustos quando a distribuição em estudo não é normal e quando a distribuição sob estudo apresenta considerável assimetria (As < 2) e curtose (Ct < 7) (Finney & DiStefano, 2013). Verificando-se estes pressupostos da normalidade, utilizaram-se os testes t-Student e One-Way ANOVA para amostras independentes, de forma a verificar se havia diferenças estatísticas entre as variáveis em estudo, tendo em consideração o tamanho do efeito (TDE). A análise do teste One-Way ANOVA foi robustecida pelo teste post-hoc de Scheffe, para a averiguação das diferenças estatisticamente significativas. Utilizou-se, ainda, o coeficiente de correlação r de Pearson para a realização das análises de validade convergente dos itens dos instrumentos, avaliando a magnitude e direção das associações entre as variáveis (Marôco, 2018).

 

 

Resultados e Discussão

Para testar a validade interna do QEO procedeu-se à análise fatorial e ao estudo da consistência interna. Para analisar os dados relativos às componentes do empenhamento organizacional, foi inicialmente feita uma análise fatorial exploratória (Marôco, 2018) do QEO. As comunalidades para as componentes do empenhamento variaram entre o mínimo de 0,33 da componente instrumental (e.g., “Muito da minha vida iria ser afetada se decidisse querer sair desta organização neste momento”) e 0,89 da componente afetiva (e.g., “Sinto-me como fazendo parte da família nesta organização”).

Os resultados indicaram a existência de três fatores principais, confirmando que os indicadores se agrupam nas respetivas dimensões. Os valores variaram entre 0,51 da componente instrumental (e.g., “Muito da minha vida iria ser afetada se decidisse querer sair desta organização neste momento”) e 0,90 da componente afetiva (e.g., “Sinto-me como fazendo parte da família nesta organização”) (Tabela 1).

 

Tabela 1

Estatísticas Descritivas, Análise Fatorial e Características Psicométricas do Questionário de Empenhamento Organizacional (QEO)

Itens e Dimensões

M (DP)

Componente

CIT

ACIE

Afetivo

Normativo

Instrumental

QEO.3. Afetivo

18,88 (29,41)

0,90

 

 

0,90

0,90

QEO.1. Afetivo

18,94 (29,81)

0,89

 

 

0,91

0,95

QEO.2. Afetivo

18,99 (29,12)

0,89

 

 

0,91

0,95

QEO.5. Afetivo

19,09 (30,18)

0,86

 

 

0,87

0,96

QEO.4. Afetivo

19,02 (30,15)

0,85

 

 

0,85

0,96

QEO.6. Afetivo

18,86 (31,82)

0,84

 

 

0,86

0,96

QEO.19. Normativo

16,78 (16,51)

 

0,85

 

0,69

0,89

QEO.15. Normativo

16,86 (15,36)

 

0,84

 

0,78

0,87

QEO.17. Normativo

16,74 (15,88)

 

0,83

 

0,73

0,88

QEO.16. Normativo

16,94 (15,49)

 

0,81

 

0,76

0,88

QEO.18. Normativo

16,13 (17,29)

 

0,74

 

0,63

0,90

QEO.14. Normativo

16,43 (15,25)

 

0,73

 

0,77

0,87

QEO.7. Instrumental

18,68 (14,70)

 

 

0,78

0,75

0,82

QEO.13. Instrumental

18,51 (15,62)

 

 

0,77

0,72

0,83

QEO.8. Instrumental

18,65 (15,91)

 

 

0,77

0,64

0,84

QEO.11. Instrumental

18,39 (16,86)

 

 

0,71

0,54

0,85

QEO.10. Instrumental

18,69 (15,20)

 

 

0,69

0,67

0,83

QEO.9. Instrumental

18,47 (16,90)

 

 

0,68

0,45

0,86

QEO.12. Instrumental

18,63 (15,85)

 

 

0,51

0,62

0,84

Alfa de Cronbach

0,97

0,90

0,86

Variância explicada

26,9%

21,6%

21,1%

Nota. CIT = correlação item-total; ACIE = alfa de Cronbach se o item for eliminado. Método de Extração: análise de Componente Principal. Método de Rotação: Varimax com Normalização de Kaiser. São apresentados os pesos fatoriais. KMO = 0,89; Teste de Esfericidade de Bartlet: Χ2(171) = 1860,53 (p < 0,001), Variância total explicada = 69,7%.

 

 

Para validar o QEO identificaram-se ainda os índices de ajustamento do modelo (Figura 1). Os resultados obtidos apresentaram conformidade com os parâmetros estabelecidos [Χ2(4) = 161,57; p = 0,227; Χ2/gl = 1,08; GFI = 0,91; AGFI = 0,91; CFI = 0,99; TLI = 0,99; RMSEA = 0,03 (IC95%: 0,000–0,050].

As análises de confiabilidade global e das componentes do empenhamento afetivo, normativo e instrumental apresentaram bons valores totais de alfa de Cronbach (respetivamente, 0,78, 0,97, 0,90 e 0,86), sendo superiores aos obtidos por Meyer e Allen (1997) e Meyer et al. (2002), e até aos obtidos por Nascimento et al. (2008), na validação do modelo para o contexto português.

A análise de normalidade das variáveis incluídas no modelo indicou que os dados obtidos estão de acordo com o estabelecido por Finney e DiStefano (2013), para a assimetria e curtose (Tabela 2).

 

 

Figura 1

Modelo Tridimensional do Empenhamento Organizacional

 

 

Nota. Todos os coeficientes são padronizados e estatisticamente significativos (p < .001).

 

 

Tabela 2

Caraterização das Dimensões do Questionário do Empenhamento Organizacional (QEO)

 

Variáveis

 

Min

Max

M

DP

As

Ct

QEO Afetivo

1,00

5,00

3,79

1,09

-0,60

-0,50

QEO Normativo

1,00

5,00

3,33

0,79

-0,50

-1,06

QEO Instrumental

1,00

5,00

3,04

0,73

-0,09

-0,06

QEO Global

2,00

5,00

3,39

0,49

-0,31

-0,05

 Nota. N = 127. As = Assimetria; Ct = Curtose.

 

Em termos globais, os trabalhadores não-docentes demonstraram estar empenhados organizacionalmente. Considerando que os itens são avaliados a partir de uma escala de Likert de cinco pontos, considera-se o ponto de corte no valor 3,00 (Araújo, 2010; Silva et al., 2017; Silva et al., 2021). O valor médio global para o empenhamento organizacional (3,39) apresentou valores um pouco superiores ao valor médio da escala. O valor médio encontrado para o empenhamento destes profissionais está em linha com o encontrado noutros estudos, nomeadamente: 3,21 (Silva et al., 2021), 3,37 (Araújo, 2010) e 3,51 (Silva et al., 2017).

No que se refere às dimensões do empenhamento organizacional, individualmente consideradas, foi possível verificar que, em termos médios, as três dimensões apresentaram valores acima do ponto de corte. Em termos médios o empenhamento afetivo destacou-se (3,79), seguidamente surgiu o empenhamento normativo (3,33) e, em último lugar, o empenhamento instrumental (3,04), o que permitiu corroborar a Hipótese 1. Estes resultados estão em consonância com os verificados noutros estudos (Araújo, 2010; Nunes & Gaspar, 2014; Zonatto et al., 2018). Esta situação tende a ser mais positiva para a organização, enquanto a maior valorização da dimensão afetiva do empenhamento tende a gerar uma maior motivação intrínseca e extrínseca (Zonatto et al., 2018) e uma atitude mais positiva perante o trabalho (Nunes & Gaspar, 2014), originando melhores performances individuais e melhores resultados organizacionais.

Quanto à relação entre o empenhamento organizacional e as variáveis sociodemográficas, a análise correlacional revelou que apenas algumas variáveis apresentaram associação entre si, com os valores a situarem-se entre muito fraco (r entre 0,00 e 0,20) e alto (r entre 0,70 e 0,89) (Tabela 3). As associações com maior significância estatística verificaram-se entre as variáveis habilitações acadêmicas com a categoria profissional (r = -0,70; p < 0,01), o empenhamento normativo com o empenhamento afetivo (r = -0,45; p < 0,01) e entre a idade com a antiguidade (r = 0,42; p < 0,01). O empenhamento instrumental (4) e as habilitações acadêmicas (3) foram as dimensões que apresentaram o maior número de associações. Apenas a variável gênero não apresentou nenhuma associação.

O estudo apontou para uma relação positiva entre as três dimensões do empenhamento, com valores aceitáveis: afetivo com o normativo (r = 0,45; p < 0,01); afetivo com o instrumental (r = -0,30; p < 0,01), normativo com o instrumental (r = -0,17; p < 0,05).

 

 

Tabela 3

Correlações entre as Variáveis do Estudo

 

1

2

3

4

5

6

7

1. Gênero

 

 

 

 

 

 

2. Idade

-0,02

 

 

 

 

 

3. Antiguidade

-0,13

0,42**

 

 

 

 

4. Habilitações

0,06

-0,04

0,08

 

 

 

5. Categoria Profissional

-0,03

0,01

-0,20*

-0,70**

 

 

6. QEO Afetivo

0,15

0,07

0,01

0,18*

-0,21*

 

7. QEO Normativo

0,15

0,20*

-0,06

0,06

-0,05

0,45**

8. QEO Instrumental

-0,00

0,12

0,15

0,31**

0,28**

-0,30**

-0,17*

 Nota. N = 127. QEO = Questionário do Empenhamento Organizacional.

*p < 0,05. **p < 0,01.

 

Para analisar a relação entre a variável gênero e o empenhamento organizacional realizou-se o teste t de Student, tendo os resultados evidenciado ausência de relação: afetivo (t = 0,27; p = 0,27), normativo (t = 1,25; p = 0,10), instrumental (t = 0,40; p = 0,52). Não se confirmou a Hipótese 2, corroborando as investigações de Uchenna e Tolulope (2013) e de Yağar e Dökme (2019) que não encontraram relações entre o gênero e os tipos de empenhamento organizacional.

Quanto à relação entre a idade e o empenhamento organizacional, o resultado do teste One-Way ANOVA indicou relação significativa no empenhamento normativo (F = 3,30; p < 0,05) (Tabela 4).  O teste post-hoc de Scheffe revelou que as principais diferenças se fizeram sentir entre os profissionais com 30 a 39 anos e os que têm uma idade superior a 50 anos (DMSScheffe = -0,52; p < 0,05). Os profissionais de maior idade manifestaram um maior empenhamento normativo. A análise permitiu concluir que a Hipótese 3 não se confirmou na sua plenitude, confirmando-se apenas na subalínea h3.2 — associação, positiva, entre o empenhamento normativo e a idade. A este nível, os resultados revelaram estar em sintonia com Ceribeli e Torres (2017) e com Zonatto et al. (2018) que identificaram diferenças significativas no empenhamento organizacional em função da idade, salientando que os níveis de empenhamento normativo foram maiores entre os profissionais com mais idade. Na observância relativa ao empenhamento afetivo e instrumental, os resultados encontrados confirmaram as análises de Uchenna e Tolulope (2013), dado que a variável idade não apresentou relações significativas com o empenhamento organizacional.

 

 

Tabela 4

Empenhamento Organizacional por Grupos Etários

Dimensão

Grupo Etário

M

DP

F

p

QEO Afetivo

30–39

3,49

1,23

1,07

0,35

40–49

3,89

1,04

≥ 50

3,78

1,10

QEO Normativo

30–39

2,94

0,82

3,30

0,04

40–49

3,46

0,78

≥ 50

3,36

0,75

QEO Instrumental

30–39

2,95

0,68

1,08

0,34

40–49

3,07

0,66

≥ 50

3,20

0,66

Nota. N = 127. QEO = Questionário do Empenhamento Organizacional. Nenhum dos respondentes tinha menos de 30 anos de idade.

 

 

Verificou-se uma relação entre as habilitações acadêmicas e o empenhamento organizacional. O teste One-Way ANOVA revelou diferenças entre grupos na dimensão afetiva (F = 2,79; p < 0,05) e na dimensão instrumental (F = 3,52; p < 0,01) (Tabela 5). O teste post-hoc Scheffe evidenciou diferenças significativas no empenhamento instrumental entre os profissionais com o 12º ano de escolaridade e os profissionais com o doutoramento (DMSScheffe = 0,61; p < 0,05) — os profissionais com habilitações acadêmicas mais baixas tendem a basear a sua relação vinculativa com a organização numa lógica de investimento pessoal instrumentalizado, procurando obter benefícios até que a relação se mantenha. Confirmou-se, assim, a Hipótese 4, na subalínea h4.3, indiciando que o empenhamento organizacional difere consoante as habilitações acadêmicas na dimensão instrumental. Estes resultados confirmaram as conclusões de Zonatto et al. (2018) que identificaram relações significativas no mesmo sentido entre os profissionais com qualificações mais baixas e os profissionais com qualificações mais elevadas.

No que se refere à categoria profissional, os resultados indicaram uma relação positiva com o empenhamento afetivo (F = 2,94; p < 0,05) (Tabela 6). As diferenças foram significativas entre os grupos dos profissionais dirigentes e dos assistentes técnicos (DMSScheffe = 0,78; p < 0,05). Confirmou-se parcialmente a Hipótese 5, na subalínea h5.1; ou seja, profissionais com categorias mais elevadas baseiam a sua relação vinculativa com a organização numa lógica de maior empenhamento afetivo. Os resultados revelaram estar em linha com o sustentado pelos estudos de Ermis et al. (2015), Meyer et al. (1993) e Mathieu e Zagac (1990), para os quais profissionais com categorias de nível hierárquico superior estabelecem preferencialmente uma ligação vinculativa com a organização de caráter emocional e de maior afetividade.

 

 

Tabela 5

Empenhamento Organizacional por Habilitações Acadêmicas

Dimensão

Habilitações acadêmicas

M

DP

F

p

QEO Afetivo

Até ao 9º ano

4,36

0,46

2,79

0,03

12º ano

3,54

1,20

Licenciatura

3,61

1,05

Mestrado

4,02

1,03

Doutoramento

4,36

0,90

QEO Normativo

Até ao 9º ano

3,77

0,36

2,37

0,06

12º ano

3,34

0,78

Licenciatura

3,09

0,79

Mestrado

3,48

0,85

Doutoramento

3,61

0,74

QEO Instrumental

Até ao 9º ano

3,33

0,23

3,52

0,01

12º ano

3,35

0,63

Licenciatura

3,04

0,63

Mestrado

2,95

0,72

Doutoramento

2,74

0,63

Nota. N = 127. QEO = Questionário do Empenhamento Organizacional.

 

 

 

 

Tabela 6

Empenhamento Organizacional por Categoria Profissional

Dimensão

Categoria Profissional

M

DP

F

p

QEO Afetivo

Dirigente

4,36

0,89

2,94

0,04

Técnico superior

3,72

1,06

Assistente técnico

3,57

1,13

Assistente operacional

3,68

1,30

QEO Normativo

Dirigente

3,59

0,81

1,40

0,25

Técnico superior

3,17

0,83

Assistente técnico

3,38

0,71

Assistente operacional

3,43

0,80

QEO Instrumental

Dirigente

2,91

0,63

3,76

0,11

Técnico superior

2,91

0,64

Assistente técnico

3,30

0,61

Assistente operacional

3,35

0,73

Nota. N = 127. QEO = Questionário do Empenhamento Organizacional. A variável “categorial profissional” tem subjacente a progressão na carreira. Para a análise, a variável foi recodificada, não considerando os especialistas de informática dado pertencerem a uma carreira diferente das carreiras gerais.

 

 

Finalmente, os resultados do teste One-Way ANOVA indicaram não existir relação entre a variável antiguidade e as dimensões do empenhamento: afetivo (F = 1,43; p = 0,23), normativo (F = 2,10; p = 0,09), instrumental (F = 0,98; p = 0,42). Estes resultados contrariam as investigações de Ocampo-Álvarez et al. (2021), mas corroboram as investigações de Nunes e Gaspar (2014), os quais evidenciaram a inexistência de relação entre a antiguidade com o empenhamento, não detendo nenhuma importância preditiva na sua explicação. A Hipótese 6 não foi suportada, podendo inferir-se que, nesta amostra, ter maior ou menor antiguidade não condicionou o modo como os profissionais se tendem a comprometer com a organização.

Os resultados aqui apresentados são muito pertinentes para se perceber a relação entre o empenhamento e as variáveis sociodemográficas, mas, ao mesmo tempo, requerem um olhar crítico e reflexivo ao nível das suas conclusões. Por um lado, evidenciaram correlações, positivas e negativas com significância estatística, entre o empenhamento organizacional e as variáveis sociodemográficas, idade, habilitações acadêmicas e categoria profissional, aproximando-se dos estudos que consideraram que o empenhamento organizacional varia consoante as caraterísticas dos trabalhadores. Por outro lado, evidenciaram relações sem significância estatística entre o empenhamento organizacional e as variáveis gênero e antiguidade, indo na direção dos estudos que consideraram que o empenhamento não é influenciado pelas caraterísticas sociodemográficas dos trabalhadores.

 

Conclusão

O objetivo deste estudo foi analisar os níveis de empenhamento organizacional e a relação entre as variáveis sociodemográficas e o empenhamento dos trabalhadores não-docentes em contexto educativo, numa instituição de ensino superior. Apesar de manifestarem diferentes tipos, e níveis, de empenhamento organizacional, conclui-se que os trabalhadores não-docentes evidenciaram um empenhamento organizacional médio, sendo que o nível global de empenhamento afetivo foi o mais elevado, ou seja, tende a existir um sentimento de maior identificação com a organização e de nela permanecerem porque “desejam e gostam”.

Paralelamente, a maior ou menor tendência para o desenvolvimento de atitudes de empenhamento revelou-se intimamente relacionada com algumas das dimensões sociodemográficas consideradas (e.g., idade, habilitações acadêmicas e categoria profissional).

As hipóteses formuladas que orientaram as especificações entre as componentes do empenhamento organizacional e a variável gênero (Hipótese 2) e a variável antiguidade (Hipótese 6) não foram confirmadas nas suas várias subalíneas, ou seja, não manifestaram relação com a forma como os indivíduos se comprometem com a organização. Já as hipóteses que sistematizaram as especificações entre as componentes do empenhamento e a variável idade (Hipótese 3), a variável habilitações acadêmicas (Hipótese 4) e a variável categoria profissional (Hipótese 5) foram confirmadas em algumas das suas várias subalíneas, sendo determinantes no modo como os indivíduos se empenham organizacionalmente.

Se se considerar, como é comummente aceite, que o empenhamento tem influência no desenvolvimento e consolidação das organizações, e que este pode ser determinado em certas circunstâncias pelas variáveis sociodemográficas, então deve também considerar-se que as IES obterão vantagens competitivas quando os seus responsáveis definirem políticas e operacionalizarem práticas centradas no desenvolvimento de processos de gestão centrados nas pessoas (sobretudo, nas suas caraterísticas individuais e comportamentais).

Ao nível das implicações, esta investigação contribui para sistematizar e operacionalizar um modelo analítico que permite compreender, de uma forma inter-relacional e reflexiva, a dinâmica estabelecida entre o conjunto das variáveis sociodemográficas e o empenhamento de um grupo profissional específico em contexto educativo. Paralelamente, contribui para os gestores destas instituições definirem políticas e operacionalizarem práticas centradas no desenvolvimento de processos de gestão centrados nas pessoas (caraterísticas individuais e comportamentais).

Como principais limitações deste estudo destacamos o facto de ser especificamente direcionado para um único caso, com utilização de uma única técnica de recolha de informação, pelo que os resultados não podem ser alvo de generalização.

Dada a pertinência e a natureza complexa do tema, associado à existência de poucas investigações nacionais e internacionais que analisam a relação entre o empenhamento organizacional e as variáveis sociodemográficas dos trabalhadores não-docentes, sugere-se, por um lado, a realização de outros estudos comparativos, de corte transversal e longitudinal, com amostras mais robustas em IES dos subsistemas politécnico e universitário, público, privado e concordatário. Por outro lado, dado os indícios de que o setor do ensino superior congrega resultados muito diferentes ao nível do empenhamento, entre quem é docente e não-docente, será igualmente importante realizar estudos de caso com metodologias quantitativas e qualitativas que incluam ambos os grupos profissionais.

 

 

Agradecimentos | Acknowledgements: Os autores agradecem à Instituição de Ensino Superior o apoio concedido para o desenvolvimento deste projeto.

 

Conflito de interesses | Conflict of interest: nenhum | none.

 

Fontes de financiamento | Funding sources: não se aplica | not applicable.

 

Contributos | Contributions: JPC:  Papel na conceptualização; Metodologia; Análises; Escrita; Edição | Role in conceptualization; Method; Analysis; Writing; Edition. PC:  Papel na conceptualização; Metodologia; Análises; Revisão | Role in conceptualization; Method; Analysis; Proofreading. AAL:  Metodologia; Análises; Revisão | Method; Analysis; Proofreading.

 

 

 

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