2016, Vol. 2(2): 12-24
Qualidade subjetiva do sono, sintomas depressivos,
sentimentos de solidão e institucionalização em pessoas idosas
Artigo Original
Mariana Napoleão ⓘ, Bárbara Monteiro ⓘ, Helena Espirito-Santo ⓘ ✉
https://doi.org/10.7342/ismt.rpics.2016.2.2.37
Recebido 25 agosto 2016
Aceite 28 setembro 2016
Objetivos: A presente
investigação teve como principais objetivos descrever a qualidade subjetiva do
sono e as perturbações do sono e analisar a intensidade dos sintomas
depressivos e dos sentimentos de solidão em idosos institucionalizados;
comparar estes dados com um grupo de idosos não institucionalizados e analisar
a relação entre estas variáveis nos dois grupos.
Métodos: Este estudo
insere-se no Projeto Trajetórias do
Envelhecimento de Idosos em Resposta
Social de onde foi retirada uma amostra de cento e quarenta idosos
sem défice cognitivo, com 70 institucionalizados e 70 não institucionalizados
emparelhados por idade, sexo, escolaridade e estado civil. A média de idades
foi de 76,58 (DP = 6,10), incluindo 104 mulheres e 36 homens. Como
instrumentos foram utilizados um Questionário Sociodemográfico, o Questionário
sobre o Sono na Terceira Idade, a Escala Geriátrica de depressão e a Escala de
Solidão da Universidade da Califórnia, Los Angeles.
Resultados: Verificou-se que os idosos
institucionalizados apresentavam mais sentimentos de solidão do que os não
institucionalizados. Contudo, não se verificaram diferenças entre os dois
grupos em relação aos sintomas depressivos, qualidade subjetiva do sono ou
perturbações do sono, com algumas exceções: os idosos residentes na comunidade
mostraram ter a perceção de demorar mais tempo a adormecer, de acordar mais
cedo e de ter mais pesadelos. Através de uma análise correlacional
verificou-se, na amostra global, que quanto pior a qualidade subjetiva do sono
mais sintomas depressivos se observavam e quanto mais sintomas depressivos,
mais sentimentos de solidão, não havendo, contudo, relação entre o sono e a
solidão.
Conclusões: Concluímos
que a situação de institucionalização se acompanha de mais sentimentos de
solidão, mas não de sintomas depressivos ou de pior qualidade de sono. Por esse
motivo, sugere-se que se desenvolvam programas de intervenção dirigidos à
solidão em idosos institucionalizados.
Palavras chave:
Idosos · Sono · Depressão · Solidão · Institucionalização
Com o envelhecimento existe uma clara
redução da eficiência do sono, sendo frequente ocorrerem diversas alterações
dos seus padrões (Ohayon, Carskadon, Guilleminault, & Vitiello, 2004;
Redline
et al., 2004). Estas alterações podem figurar no aumento de
acordares noturnos, dificuldade em manter o sono, na não existência de um sono
reparador e sonolência diurna (Ancoli-Israel, 2005; Crowley,
2011; Dijk, Groeger, Stanley, & Deacon, 2010; Galimi,
2010). Para além destas, ainda são observadas a perturbação do ciclo
do sono-vigília, acordares precoces e redução do sono de ondas lentas (sono
profundo) (Crowley, 2011; Ohayon et al., 2004).
As alterações podem decorrer de distúrbios primários do sono (e.g., apneia
obstrutiva, movimentos periódicos durante o sono, síndrome das pernas
inquietas) ou serem secundárias a doença médica ou psiquiátrica (Crowley,
2011; Giron et al., 2002). Existem ainda
fatores contributivos para o desenvolvimento de alterações do sono, entre eles
o aumento da idade (Ohayon et al., 2004) e o sexo (existindo maior
vulnerabilidade do sexo feminino) (Crowley, 2011; Giron et
al., 2002; Redline et al., 2004). Outros fatores
concorrem para estas alterações, nomeadamente o uso de antidepressivos,
benzodiazepinas, ansiolíticos e hipnóticos (Armitage, 2000;
Giron et al., 2002; Gursky & Krahn, 2000;
Krishnan
& Hawranik, 2008).
Para além das questões supracitadas, a
situação residencial é outro aspeto a ter em consideração. Assim, entre idosos
da comunidade (não-institucionalizados), verificam-se mais dificuldades em
iniciar ou manter o sono, insónia e a realização de sestas durante o dia, sendo
a insónia prevalente em indivíduos do sexo feminino e com mais idade (Foley,
Ancoli-Israel, Britz, & Walsh, 2004). Em situação de
institucionalização, determinados problemas do sono mostram-se prevalentes,
tais como, levantar-se para ir ao quarto de banho, acordar no meio da noite ou
muito cedo pela manhã, sentir muito calor e sentir dores (Araújo &
Ceolim, 2010). A qualidade do sono mostra-se também pior
quanto mais elevado o grau de institucionalização (Middelkoop, Kerkhof,
Smilde-van den Doel, Ligthart, & Kamphuisen, 1994) ou mais
“pobre” em pessoas idosas institucionalizadas (Garmendia-Leiza et al., 2013).
As dificuldades de sono em pessoas idosas
são comórbidas a outros quadros, sendo o mais frequente a presença de sintomas
depressivos (Ancoli-Israel, 2006, 2009; Babar et
al., 2000; Cho et al., 2008; Giron et al., 2002).
Quanto à relação entre insónia e depressão estas podem funcionar como fatores
de risco/precipitantes uma da outra, ou seja, quando não existe intervenção, a
insónia pode resultar em depressão e a presença de depressão pode contribuir
para o desenvolvimento de insónia (Cole & Dendukuri, 2003).
A depressão no idoso, por seu turno,
associa-se à solidão (Cacioppo, Hughes, Waite, Hawkley, & Thisted, 2006;
Stek
et al., 2005; Vaz & Gaspar, 2011; Zebhauser et al., 2014),
sendo que esta se constitui igualmente num fator de risco para a depressão, bem
como o inverso também se verifica (Holvast et al., 2015; Houtjes et al., 2014;
Jacobs,
Cohen, Hammerman-Rozenberg, & Stessman, 2006). O sexo poderá
ainda ser uma variável de relevo tanto na solidão como na depressão. Cacioppo
et al. (2006), por exemplo, mostraram que os homens
experienciam sintomas mais elevados de solidão do que as mulheres. Em contraste,
Zebhauser
et al. (2014) verificaram que as mulheres idosas
apresentam mais sintomas depressivos do que os homens, mas não encontraram
diferenças quanto à solidão. Já Pinquart e Sorensen (2001), no seu estudo
de metanálise, mostraram que as mulheres apresentam mais sintomas de solidão. A
situação residencial parece ser novamente um fator importante, sendo comum a
presença de solidão entre idosos institucionalizados (de Jong Gierveld &
Havens, 2004; Pinquart & Sorensen, 2001; Stek et
al., 2005; Vaz & Gaspar, 2011), assim como a presença de
sintomas depressivos (Cravello, Palmer, de Girolamo, Caltagirone, & Spalletta, 2011;
Plati,
Covre, Lukasova, & Macedo, 2006; Szczerbińska, Hirdes, & Zyczkowska, 2012). Outros
fatores a sublinhar no que respeita à solidão são o avanço na idade, mas
somente em idosos ou muito mais velhos (> 80 anos) ou mais novos (< 60
anos) (Pinquart & Sorensen, 2001), a perda do cônjuge e a falta
de amigos (Costa et al., 2013; Savikko, Routasalo, Tilvis, Strandberg, & Pitkälä,
2005). Para a depressão, os fatores são similares, incluindo a idade
mais avançada (Blazer, 2003) e a situação de ausência de
companheiro (Iachina, Jørgensen, McGue, & Christensen, 2006).
Por fim, a baixa escolaridade parece ser um fator com papel diverso nas duas
condições: relevante para a depressão (Goncalves, Espirito-Santo,
Matreno, Fermino, & Guadalupe, 2012; Pena et al., 2012),
mas não para a solidão (Costa et al., 2013).
No entrelaçar dos conceitos apresentados,
parece também existir relação entre solidão e a pobre qualidade subjetiva do
sono (Cacioppo et al., 2002a, 2002b),
aparecendo a solidão como determinante da menor satisfação com o sono (Jacobs
et al., 2006).
Em síntese, a revisão da literatura mostra
que as perturbações do sono se relacionam com a depressão/sintomas depressivos
e que estes se associam reciprocamente com a solidão. Existem ainda lacunas na
compreensão da relação entre o sono e a solidão em pessoas idosas e
especialmente em idosos institucionalizados.
Por estes motivos, e na procura de uma maior
compreensão dos constructos apresentados, são objetivos desta investigação: a)
analisar a qualidade subjetiva do sono, a intensidade dos sintomas depressivos
e dos sentimentos de solidão em idosos institucionalizados; b) comparar estas
dimensões entre idosos institucionalizados e não-institucionalizados; c)
descrever e comparar o tipo de problemas de sono entre os dois grupos; d)
analisar o potencial efeito de variáveis sociodemográficas sobre a qualidade
subjetiva do sono, sintomas depressivos e sentimentos de solidão; e) verificar se
existem relações entre o sono, depressão e solidão e se essas relações são
diferentes entre os dois grupos de idosos.
Procedimentos
No âmbito do Trajetórias do Envelhecimento de Idosos em Resposta
Social (TEIRS) do Instituto Superior Miguel Torga foram contactadas 32
instituições que fornecem resposta social à população idosa nos concelhos de
Coimbra e Soure.
A recolha de dados foi realizada por psicólogos com treino e prática na
avaliação (neuro)psicológica através de um protocolo amplo que englobou
questionários sociodemográficos, entrevista médica e psiquiátrica,
questionários emocionais e testes neuropsicológicos administrados aos idosos.
Os instrumentos foram administrados oralmente, cabendo ainda ao psicólogo o
registo das respostas. Para além da avaliação, a recolha de dados incluiu a
informação retirada dos processos individuais dos utentes.
Todos os idosos foram voluntários e assinaram declarações de
consentimento informado.
Participantes
A amostra incluiu idosos institucionalizados (Lar e Centro de Noite),
semi-institucionalizados (Centro de Dia e Unidade de Cuidados continuados) e
não institucionalizados do distrito de Coimbra, Portugal, num total de 140
pessoas. A seleção das pessoas idosas para este estudo foi realizada através
dos seguintes critérios de inclusão: idade igual ou superior a 65 anos; sem
demência diagnosticada e com pontuações no Montreal Cognitive Assessment
(MoCA; Nasreddine et al., 2005) abaixo do percentil 25 (inferior a 7
pontos); sem afasia sensorial e/ou anterior e ter respondido ao MoCA.
No TEIRS tinham sido avaliadas 1235 pessoas idosas entre novembro de 2010
e março de 2016. Destas foram retiradas das análises 803 pessoas por não
cumprirem os critérios de inclusão. Entre os 432 que preenchiam os critérios de
inclusão, não se verificou associação estatisticamente significativa entre sexo
e tipo de situação residencial [χ2(1) = 1,03; p = 0,31];
os idosos institucionalizados eram mais velhos de forma estatisticamente
significativa (M = 80,19 anos; DP = 6,48 anos; t = 8,88; p
< 0,001); havia mais pessoas sem companheiro entre os idosos
institucionalizados [76,8%; χ2(1) = 28,90; p <
0,001]; existiam mais pessoas sem escolaridade ou baixa escolaridade entre os
idosos institucionalizados [78,4%; χ2(4) = 24,34; p <
0,001] e ainda se verificou que a situação residencial e o número de visitas
não se associavam [χ2(1) = 7,68; p = 0,06].
Por fim, entre os 432 foram selecionados 70 idosos institucionalizados e
70 idosos não-institucionalizados resultantes do emparelhamento por idade,
sexo, escolaridade e estado civil.
Instrumentos
Da bateria global do TEIRS, foram utilizados quatro questionários e duas
entrevistas, de seguida apresentados e descritos.
Através do Questionário sociodemográfico foram recolhidas
informações sobre a idade, sexo, estado civil, escolaridade, e tipo de resposta
social e uma questão acerca da frequência e das pessoas que visitam o idoso
(incluindo a ausência de visitas).
O Questionário Sobre o Sono na Terceira Idade (QSTI)
consiste numa adaptação do Índice de Qualidade de Sono (Gomes, 2005) para
pessoas idosas e avalia a qualidade de sono (Marques et al., 2012).
O QSTI é constituído por uma primeira parte com sete questões, incluindo a
latência do sono, dificuldade em adormecer, número de acordares noturnos,
acordar espontaneamente antes da hora desejada, se o acordar mais cedo do que o
desejado constitui um problema e dois itens sobre a qualidade subjetiva do sono
em geral e a profundidade do sono. Nesta primeira parte, as respostas variam de
0 a 4, e o seu somatório permite obter o Índice de Qualidade Subjetiva do
Sono (IQSS) que pode oscilar entre 0 (melhor) e 28 (pior). A segunda parte
do QSTI, referente aos correlatos do sono, é constituída por 12 questões de
resposta dicotómica (Sim/Não) para o idoso (1. sono no último mês com cinco
perguntas[1];
2. sonolência diurna; 3. medicação para dormir; 4. atividade física; 5. manutenção
de horário de sono regular; 6. presença de dores que afetam o sono; 7. doença
que afeta o sono com exemplos de algumas dessas doenças; 8. sestas diurnas; 9. parceiro
de sono ruidoso; 10. doença de sono com listagem de doenças comuns em caso
afirmativo[2];
11. medicamentos perturbadores do sono e da vigília com listagem respetivas[3]);
12. questão para um informante (inversão do padrão/ciclo do sono-vigília[4]).
O questionário apresenta uma muito boa consistência interna, com um alfa de
Cronbach de 0,81 (Marques et al., 2012), ainda que tenha sido um
pouco inferior no estudo presente (0,70), considerando-se ainda aceitável para
fins de investigação (Pestana & Gageiro, 2014). Adicionalmente, foi
criado um Índice de Insónia baseado nos critérios da DSM-5 (American
Psychiatric Association, 2013)[5]:
ter respondido “sim” às perguntas 1.1 a 1.4 e “não” às questões 1.6, 2.1 a 2.6,
7.1 a 7.5, 9 e 10.1 a 10.4. Com base nos pontos de corte estabelecidos pela
média mais ou menos desvio padrão, criaram-se três grupos: Bons dormidores, Grupo com
sintomas de insónia e Insones. O
QSTI começou a ser administrado em 2012, pelo que responderam somente 108
idosos (77,1%).
A Escala Geriátrica da Depressão (Geriatric Depression
Scale/GDS) avalia a presença de sintomas depressivos em pessoas idosas (Yesavage
et al., 1983). Tal como na original, a versão portuguesa (Barreto,
Leuschner, Santos, & Sobral, 2003), consiste em 30 questões
referentes à última semana, respondidas de forma dicotómica (Sim/Não). Por cada
resposta ‘Sim’ nos itens 2-4, 6, 8, 10-14, 16-18, 20, 22-26 e 28 e por cada
resposta ‘não’ nos itens 1, 5, 7, 9, 15, 19, 21, 27, 29 e 30 atribui-se um
ponto, variando a pontuação total entre 0 e 30 pontos (Barreto et al., 2003;
Yesavage
et al., 1983). As propriedades psicométicas foram adequadas na
versão original (α de Cronbach = 0,94; κ = 0,94) (Yesavage et al., 1983)
e no nosso estudo (α de Cronbach = 0,87). A GDS foi respondida por 139 idosos da
amostra (99,3%; a resposta em falta correspondeu a desistência da avaliação).
A Escala da Solidão da Universidade da Califórnia, Los Angeles
(LS-UCLA) foi desenvolvida para avaliar os sentimentos subjetivos de solidão ou
isolamento social (Russell, Peplau, & Ferguson, 1978). Na sua
origem era constituída por 20 itens, mas na versão portuguesa da escala (Pocinho,
Farate, & Dias, 2010), que está validada para a população idosa,
é constituída por 16 itens elaborados de forma negativa e cuja resposta varia
do “nunca” ao “frequentemente” tal como na escala original. Nesta versão, a
pontuação pode variar entre os 16 e os 64 pontos, apresentando um ponto de
corte de 32 pontos, correspondendo a pontuação acima deste valor a presença de
solidão. As propriedades psicométricas mostraram-se adequadas (κ =
entre 0,8 e 1; escala total: α de Cronbach = 0,91), tal como no
presente estudo (α de Cronbach = 0,91). Somente sessenta e nove idosos
responderam à LS-UCLA, devido também ao momento em que a LS-UCLA foi incluída
no projeto TEIRS (49,3%) e a duas recusas em completar a bateria.
A Entrevista Estruturada de Avaliação da Saúde Física do Idoso
inclui 32 perguntas referentes à saúde física agrupadas em seis categorias e
foi desenvolvida no TEIRS. As seis
categorias consistem na saúde em geral (aspetos e doenças específicas e eventos
graves de saúde), problemas de visão e audição, sintomatologia cardiovascular,
geniturinária, respiratória e neurológica. Para este estudo, recorreu-se às
perguntas da categoria geral referentes a eventos graves de saúde (e.g.,
enfarte agudo do miocárdio, acidente vascular cerebral, traumatismo
cranioencefálico).
A Mini International Neuropsychiatric Interview (M.I.N.I.
PLUS; Sheehan et al., 1997; versão portuguesa: Amorim, 2000) é
uma entrevista que acompanha os critérios da DSM-IV para várias perturbações
mentais, consistindo em perguntas de resposta dicotómica (sim/não). Esta
entrevista foi usada para colmatar informação sobre saúde mental indisponível
nos processos individuais dos utentes.
Análise Estatística
Os dados foram analisados através do Statistical Package for the
Science (SPSS), versão 24 para Macintosh.
Recorreu-se à estatística descritiva para a caracterização
sociodemográfica e clínica da amostra, calculando o qui-quadrado de
independência, a associação linear-por-linear ou o V de Cramer consoante
a natureza da variável (nominal ou ordinal e número de categorias).
Para a decisão estatística, efetuou-se previamente o estudo da
normalidade através do teste de Shapiro-Wilk (Pestana & Gageiro, 2014)
que revelou que as distribuições das pontuações do GDS no grupo dos
institucionalizados e da LS-UCLA nos não-institucionalizados não apresentavam
uma distribuição normal.
Nesse seguimento, para as análises comparativas, uma vez que os valores
de assimetria e curtose do GDS (Si = 0,80; Ku = 1,56) foram
aceitáveis, optou-se pelo teste paramétrico t de Student (Pestana
& Gageiro, 2014). Como na LS-UCLA os valores se situaram acima
dos limites (Si = 4,62; Ku = 4,71), decidiu-se então pelo teste U
de Mann-Whitney (Pestana & Gageiro, 2014).
Seguindo as indicações de Espirito-Santo e Daniel (2015)
recorreu-se ao d de Cohen para análise das magnitudes da diferença,
seguindo a classificação seguinte: tamanho do efeito insignificante
(< 0,19), pequeno (0,20 - 0,49), médio (0,50 - 0,79), grande
(0,80 - 1,29) e muito grande (> 1,30).
Para a descrição dos problemas de sono fez-se uso do estudo das
frequências, recorrendo à análise de qui-quadrado de independência para
determinar a existência ou não de associação entre os problemas de sono e os
grupos definidos por algumas variáveis clínicas de relevo e pela situação
residencial.
Finalmente, computaram-se as correlações de Pearson para determinar a
intensidade das relações entre IQSS, GDS e LS-UCLA, e a correlação
ponto-bisserial para estudar as relações com o índice de insónia (Marôco,
2011). A interpretação das correlações seguiu a classificação
seguinte: correlação baixa (0,10 - 0,29), moderada (0,30 - 0,49)
e alta (≥ 0,50) (Pestana & Gageiro, 2014). Para comparar
as correlações dos dois grupos, recorreu-se ao seguinte procedimento: a) os
valores de r foram convertidos em z; b) o valor z
observado (zobs) fora da região crítica ]-1,96 a 1,96[ foi
interpretado como indicativo de correlações significativamente diferentes (Pallant,
2011).
Análises preliminares
Do total das 140 pessoas (Tabela 1), a
maioria era mulher (n = 104; 74,3%), casada/união de facto (n =
73; 52,1%), com escolaridade equivalente ao ensino básico (n = 73;
52,1%) e com idade média de 76,58 anos (DP = 6,10). Não se verificaram
diferenças estatisticamente significativas em nenhuma das categorias
sociodemográficas nos grupos definidos pela situação residencial (p >
0,05), excetuando na idade [Tabela 1; t(138) = 1,97; p =
0,05], mas com um tamanho do efeito pequeno (d = 0,33).
A acrescentar que um pequeno número de idosos
institucionalizados não recebia visitas (n = 5; 12,5%), acontecendo o
mesmo com idosos não-institucionalizados (n = 2; 4,3%), não havendo
associação estatisticamente significativa entre a situação de residência e o
ser-se ou não visitado [χ2(1)
= 1,90; p > 0,05].
A frequência de visitas de familiares foi
também similar entre os grupos [diária-semanalmente: institucionalizados =
65,0%; não-institucionalizados = 66,7%; χ2(4)
= 1,42; p > 0,05].
Um grande número de idosos de ambos os grupos indicou
viver com família (institucionalizados: 54,5%; não-institucionalizados: 59,5%),
reduzindo-se a frequência no residir com outros (institucionalizados: 18,2%;
não-institucionalizados: 4,8%) e, proporcionalmente, sendo mais entre os idosos
não-institucionalizados que se vivia sozinho [35,7%; institucionalizados:
27,3%; χ2(1) = 1,90; p > 0,05].
|
Caracterização
Sociodemográfica de uma Amostra de Pessoas Idosas (N = 140),
Institucionalizadas (PII: n = 70) e Não-Institucionalizadas (PNI: n = 70) |
|
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|
|
Total |
PII |
PNI |
χ 2 / V |
|
||||
|
n |
% |
n |
% |
n |
% |
|
|||
|
Idade PII: M ± DP = 77,59 ±
6,62 PNI: M ± DP = 75,57 ±
5,40 |
61-70 71-80 81-90 91-100 |
25 93 19 3 |
17,9 66,4 13,6 2,1 |
12 47 9 2 |
17,1 67,1 12,9 2,9 |
13 46 10 1 |
18,6 65,7 14,3 1,4 |
0,07NS |
|
|
Sexo |
Masculino Feminino |
36 104 |
25,7 74,3 |
18 52 |
25,7 74,3 |
18 52 |
25,7 74,3 |
0,00NS |
|
|
Estado-civil |
Solteiro/a Separado/aa Viúvo/a Casado/ab |
4 9 54 73 |
2,9 6,4 38,6 52,1 |
2 4 28 36 |
2,9 5,7 40,0 51,4 |
2 5 26 37 |
2,9 7,1 37,1 52,9 |
0,04NS |
|
|
Escolaridade |
S/ escolaridade 1º ciclo 2º ciclo Secundário |
24 73 16 27 |
16,2 52,1 11,4 19,3 |
12 36 8 14 |
16,2 51,4 11,4 20,0 |
12 37 8 14 |
16,2 52,9 11,4 18,6 |
0,51NS |
|
|
Nota. M = média; DP =
desvio-padrão; a Separado/a ou divorciado/a; b Ou em
união de facto; n = número de participantes; χ2 = Qui-Quadrado da independência
para o sexo, estado-civil e linear-por-linear idade e escolaridade; V
= V de Cramer. NS = Não significativo. |
|
Dado que as alterações do sono podem ser secundárias a doença
médica ou psiquiátrica (Crowley, 2011), segue-se a descrição clínica
dos dois grupos (Tabela 2). A análise do qui-quadrado da
independência revelou uma associação estatisticamente significativa entre a
situação de saúde física/mental e a situação residencial [χ2(3)
= 11,12; p = 0,011], destacando-se o maior número de pessoas idosas
razoavelmente saudáveis ou sem doenças com impacto cognitivo na situação de
residência na comunidade (não-institucionalizados).
|
Caracterização
Clínica de uma Amostra de Pessoas Idosas (N = 140), Institucionalizadas (PII: n =
70) e Não-Institucionalizadas (PNI: n = 70) |
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|||||||
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Total |
PII |
PNI |
|
||||
|
n |
% |
n |
% |
n |
% |
|
||
|
Razoavelmente saudávela |
62 |
44,3 |
22 |
31,4 |
40 |
57,1 |
|
|
|
Doença com impacto cognitivo |
Alzheimer AVC Parkinson Outrasa |
2 20 3 4 |
1,4 14,3 2,1 2,9 |
2 13 2 1 |
2,9 18,6 2,9 5,7 |
0 7 0 3 |
0 10 0 4,3 |
|
|
Doença mental |
Depressão |
10 |
7,1 |
5 |
7,1 |
5 |
7,1 |
|
|
Sem informação |
39 |
27,9 |
25 |
35,7 |
14 |
20 |
|
|
|
Nota. n = número da amostra. AVC =
Acidente vascular cerebral. a
Epilepsia, tumor cerebral, traumatismo cranioencefálico ou diabetes. |
|
Considerando que vários fármacos têm uma influência potencial sobre
o sono (Armitage, 2000; Gursky & Krahn, 2000;
Krishnan & Hawranik, 2008), avaliou-se a proporção de
pessoas idosas que tomam este tipo de medicação (e.g., antidepressivos,
antipsicóticos, agonistas da dopamina, antiepilépticos, anti-histamínicos)
pelos grupos definidos pela situação residencial (Tabela 3).
Verificou-se, por meio da análise do qui-quadrado de independência,
que não houve associação estatisticamente significativa entre a toma de
medicamentos e o tipo de situação residencial [χ2(1)
= 0,70; p = 0,404]. É de destacar, no entanto, que 3 idosos (2,1%) não
quiseram responder, 30 idosos (21,4%) não foram questionados e/ou do processo
não havia indicação do tipo de fármaco e que 2 (1,4%) não souberam responder à
questão “Toma medicamentos para dormir?”. A maior parte destas “não-respostas”
ocorreu entre os idosos institucionalizados (20,7%; não-institucionalizados:
4,3%).
|
Frequência de Medicação para Dormir por Situação
Residencial de uma Amostra de
Pessoas Idosas (N
= 105), Institucionalizadas
(PII: n
= 41) e Não-Institucionalizadas (PNI: n = 64) |
|
|||||||
|
|
Total |
PII |
PNI |
χ 2 |
|
|||
|
n |
% |
n |
% |
n |
% |
|
||
|
Toma Medicação |
41 |
39,0 |
22 |
53,7 |
29 |
45,3 |
0,70NS |
|
|
Não Toma Medicação |
64 |
61,0 |
19 |
46,3 |
35 |
54,7 |
|
|
|
Nota. n = tamanho das subamostras. χ 2 = qui-quadrado de independência. NS
= não significativo estatisticamente. |
|
Descritivas,
comparações e relações
Quanto ao primeiro objetivo, as médias e desvios padrão das
variáveis em estudo no grupo de pessoas idosas institucionalizadas estão
patentes na Tabela 4.
Na ausência de valores de comparação com amostras diferentes ou de
pontuações de corte, acrescente-se que, para a amostra global, a mediana para o
IQSS foi de 18,00, o percentil 25 foi 15,00 e o percentil 75 foi de 21,00. Os
valores foram similares no grupo de idosos institucionalizados (P25 =
15,00; Md = 18,00; P75 = 21,3) e não-institucionalizados (P25
= 15,00; Md = 17,00; P75 = 20,8).
Quanto ao segundo objetivo (Tabela 4), a única diferença encontrada
verificou-se nos sentimentos de solidão que foram superiores nos idosos
institucionalizados [t(67) = 3,62; p = 0,001). Em contraste, as pontuações
do IQSS [t(106) = 0,72; p = 0,473) e do GDS [t(137) = 0,68; p = 0,500] não parecem estar relacionadas com a situação
residencial. No entanto, sabendo que o valor do p é sensível ao tamanho da
amostra, avaliou-se a magnitude da diferença de médias entre os dois grupos
utilizando-se a medida de dimensão de d de Cohen (Espirito-Santo & Daniel,
2015). Assim, verificou-se que o IQSS apresentou uma diferença entre
os dois grupos com tamanho de efeito considerado insignificante (d = 0,14), o mesmo acontecendo com o GDS
(d = 0,11). De modo diferente, na
LS-UCLA o tamanho do efeito foi grande (d
= 0,87).
|
Comparação do
Índice de Qualidade Subjetiva do Sono (IQSS), Sintomas Depressivos (GDS) e
Solidão (LS-UCLA) entre Dois Grupos Definidos pela Situação Residencial |
|
||||||||||||
|
|
Total |
|
Grupo Institucionalizado |
|
Grupo Não-institucionalizado |
t/d |
|
||||||
|
N |
M |
DP |
n |
M |
DP |
n |
M |
DP |
|
||||
|
IQSS |
108 |
18,74 |
5,04 |
|
32 |
18,32 |
5,40 |
|
64 |
19,03 |
4,80 |
0,72NS/0,14 |
|
|
GDS |
139 |
11,15 |
6,36 |
|
70 |
11,51 |
6,95 |
|
69 |
10,78 |
5,74 |
0,68NS/0,11 |
|
|
LS-UCLA |
69 |
30,25 |
10,35 |
|
36 |
34,22 |
10,03 |
|
33 |
25,91 |
8,96 |
3,62**/0,87‡ |
|
|
Nota. GDS = Geriatric Depression Scale;
LS-UCLA = Escala de Solidão da Universidade da Califórnia, Los Angeles;
N = total da amostra; M = média; DP = desvio padrão; n
= dimensão da subamostra; t = teste t de Student; d = d
de Cohen. ** p < 0,01; NS não significativo; ‡
tamanho do efeito grande. |
|
Relativamente ao objetivo 3, as percentagens do tipo de problemas
de sono, obtidas através da análise das frequências das respostas a cada item
do QSTI por situação residencial, são apresentadas na Tabela 5. Uma vez
que havia células com uma frequência esperada inferior a 5 nas tabelas de
referência cruzada (Pallant, 2011), procedeu-se à
dicotomização dos itens com base na revisão da literatura.
Para o Item 1 considerou-se problema quando o Tempo que demora a
adormecer ultrapassava os 30 minutos (Maglione et al., 2012),
assim as categorias “1-14 minutos” e “15-30 minutos” foram recodificadas em Latência
do adormecer normal (≤ 30 min.) e “31-45”; “46-60” e “mais de 60 minutos”
em problema na Latência do adormecer (> 30 minutos).
Para o Item 2 (Dificuldade em adormecer), definiu-se como
problemático sentir dificuldade em adormecer 3 noites ou mais por semana (Ram,
Seirawan, Kumar, & Clark, 2010). As categorias “nunca”,
“raramente” e “algumas vezes” foram reclassificadas como Adormecer difícil
raro (≤ algumas vezes) e Adormecer difícil frequente (≥ 3
noites-semana).
No Item 3 (Vezes que acorda), dada a coorte etária, foi
considerado normal acordar até seis vezes (Maglione et al., 2012),
mas, como a última categoria de resposta incluía 6 ou mais vezes, reservou-se
esta categoria para Acordares problema e as restantes para Acordares
normal (“0 vezes”; “1 vez”; “2 a 3 vezes”; “4 a 5 vezes”).
Na ausência de um critério descrito previamente que se aplique ao
Item 4 (Acordar antes da hora) e uma vez que a literatura mostra que há
uma redução no número total de horas de sono (Crowley, 2011; Maglione
et al., 2012), tomou-se como critério os quartis. Desse modo, “3 a 4
noites por semana” e “Quase todas as noites” ficaram recategorizadas em Acordar
precoce (quartil superior) e as restantes “Nunca”, “Raramente” e “Algumas
vezes” ficaram incluídas na categoria Acordar normal. Para os
Itens 5, 6 e 7, seguiu-se o procedimento descrito para o Item 4, devido às
mesmas razões.
Assim (Item 5), “Um pouco”, “Muito” e “Muitíssimo” foram incluídas
na categoria Acordar precoce problemático (quartil superior); “Nada” e
“Muito pouco” na categoria Acordar precoce não-problemático. No Item 6,
a categoria Qualidade má incluiu “Muito mau” e “Mau” (quartil superior)
e Qualidade boa incluiu “Razoável”, “Bom” e “Muito bom”. No Item 7, a
categoria Profundidade má incluiu “Muito leve”, “Leve” e “Mais ou menos
pesado” (quartil superior) e Profundidade boa incluiu “Pesado” e “Muito
pesado”.
|
Frequências das Alterações
Subjetivas do Sono (QSTI, Questionário Sobre o Sono na Terceira Idade) por
Situação Residencial (Institucionalizados: n = 44 e
Não-Institucionalizados: n = 64) |
|
|||||||
|
|
Institucionalização |
χ 2 |
|
|||||
|
Sim |
Não |
|
||||||
|
Itens do QSTI |
Dicotomização dos Itens |
n |
% |
n |
% |
|
||
|
Tempo que
demora a adormecer |
Latência do adormecer |
Normal (≤ 30 minutos) Anormal (≥ 31 minutos) |
33 11 |
75,0 25,0 |
48 16 |
75,0 25,0 |
0,00NS |
|
|
Dificuldade em adormecer |
Adormecer difícil |
Raro (≤ Algumas vezes) Frequente (≥ 3 noites/semana) |
36 8 |
81,8 18,2 |
46 18 |
71,9 28,1 |
1,4NS |
|
|
Vezes que acorda |
Acordares |
Normal (≤ 4 a 5 vezes) Problema (≥ 6 vezes) |
42 2 |
95,5 4,5 |
63 1 |
98,4 1,6 |
0,86NS |
|
|
Acordar antes
da hora |
Acordar precoce |
Normal (≤ Algumas vezes) Problema (≥ 3 noites/semana) |
34 10 |
77,3 22,7 |
42 22 |
65,6 34,4 |
1,70NS |
|
|
Acordar antes
é problema |
Acordar
precoce problema |
Não (≤ Muito pouco) Sim (≥ Um pouco) |
27 17 |
61,4 38,6 |
42 22 |
65,6 34,4 |
0,26NS |
|
|
Qualidade do Sono |
Qualidade |
Boa (≥ Razoável) Má (Mau e Muito mau) |
18 26 |
40,9 59,1 |
39 25 |
60,9 39,1 |
4,20* |
|
|
Profundidade do Sono |
Profundidade |
Boa (Pesado e muito pesado) Má (≥ Mais ou menos pesado) |
24 20 |
54,5 45,5 |
27 37 |
42,2 57,8 |
1,60NS |
|
|
Nota. n = total da subamostra; χ 2 = qui-quadrado de independência. *
p < 0,05. QSTI = Questionário Sobre o Sono na Terceira Idade. |
|
Como se pode verificar na Tabela 5, somente a Qualidade se
associou à situação residencial, tendo os idosos institucionalizados reportado
mais sono de boa qualidade [χ2(1)
= 4,22; p = 0,04; Fi = 0,20]. Os restantes problemas de sono não
se associaram à situação residencial (p > 0,05).
Através da segunda parte do QSTI, verificámos ainda ausência de
associação entre a situação residencial e os seguintes parâmetros: sono no
último mês, sonolência diurna, medicação para dormir, horário regular, presença
de dores, doença que afeta o sono, sestas diurnas, parceiro de sono ruidoso,
doença de sono, medicamentos perturbadores do sono e da vigília e com a
inversão do ciclo de sono (resposta do informante). As exceções disseram
respeito ao acordar cedo (institucionalizados: 32,6%; não-institucionalizados:
57,1%; χ2(1) = 1,90; p <
0,05), aos pesadelos (institucionalizados: 0,0%; não-institucionalizados: 9,8%;
χ2(1)
= 1,90; p < 0,05) e à atividade física (institucionalizados: 46,5%;
não-institucionalizados: 68,8%; χ2(1)
= 5,29; p < 0,05).
Finalmente, quanto ao Índice de Insónia do IQSS, 75,0% (n
= 24) da amostra global sofriam de insónia, pertencendo a maioria dos insones
ao grupo dos não-institucionalizados (n = 63; 90,0%; institucionalizados:
n = 42; 60,0%). Quanto aos restantes, 1,4% (n = 2) tinham sintomas de insónia (um sujeito de cada situação
residencial) e 23,6% revelaram-se como bons dormidores (n = 33), com a maioria a residir em instituição (n = 27;
38,6%; não-institucionalizados: n = 6; 8,6%).
Na Tabela 6 apresentam-se os dados referentes ao
quarto objetivo, com as diferenças das pontuações médias do IQSS, GDS e LS-UCLA
entre as categorias das variáveis sociodemodemográficas (sexo, idade, estado
civil e escolaridade). As únicas diferenças estatisticamente diferentes foram
encontradas no GDS para o estado civil, apresentando as pessoas idosas sem
companheiro mais sintomas depressivos (p < 0,05).
|
Comparação do Índice de Qualidade
Subjetiva do Sono (IQSS), Sintomas depressivos (GDS) e Sentimentos de Solidão
(LS-UCLA) entre os Grupos Definidos pelas Variáveis Sociodemográficas |
|
|||||||||
|
|
|
IQSS |
|
GDS |
|
LS-UCLA |
|
|||
|
M |
DP |
|
M |
DP |
|
M |
DP |
|
||
|
Sexo |
Masculino |
17,97 |
4,93 |
|
10,03 |
5,87 |
|
27,77 |
9,26 |
|
|
Feminino |
19,07 |
5,08 |
|
11,54 |
6,51 |
|
31,06 |
10,64 |
|
|
|
t de Student; p |
t = 1,03; p = 0,304 |
|
t = 1,23, p = 0,220 |
|
t = 1,14; p = 0,258 |
|
||||
|
Idade |
61-70 |
17,67 |
5,65 |
|
9,96 |
6,31 |
|
25,75 |
5,66 |
|
|
71-80 |
19,16 |
4,57 |
|
12,05 |
6,03 |
|
32,25 |
11,18 |
|
|
|
81-90 |
18,06 |
6,28 |
|
8,79 |
7,43 |
|
27,62 |
9,31 |
|
|
|
91-100 |
17,67 |
5,65 |
|
9,96 |
6,31 |
|
25,75 |
5,66 |
|
|
|
ANOVA (F); p |
F = 0,82; p = 0,444 |
|
F = 2,02; p = 0,114 |
|
F = 2,48; p = 0,091 |
|
||||
|
Estado-civil |
S/ companheiro |
18,59 |
4,85 |
|
11,64 |
7,04 |
|
32 |
11,15 |
|
|
C/ companheiro |
18,88 |
5,25 |
|
10,71 |
5,7 |
|
28,54 |
9,35 |
|
|
|
t de Student; p |
t = 0,30; p = 0,768 |
|
t = 0,85; p = 0,395 |
|
t = 1,40; p = 0,167 |
|
||||
|
Escolaridade |
S/ escolaridade |
18,5 |
4,38 |
|
12 |
7,09 |
|
32,9 |
11,79 |
|
|
C/ escolaridade |
18,27 |
5,26 |
|
10,88 |
6,32 |
|
29,8 |
10,13 |
|
|
|
t de Student; p |
t = 0,13; p = 0,895 |
|
t = 0,65; p = 0,519 |
|
t = 0,88; p = 0,384 |
|
||||
|
Nota.
p = nível de significância; ANOVA (F)
= Análise de Variância; M = média; DP = Desvio padrão; GDS =
Inventário Geriátrico da Depressão; LS-UCLA = Escala de Solidão da
Universidade da Califórnia, Los Angeles. |
|
Na Tabela 7, e em resposta ao último objetivo,
exibem-se as correlações entre o Índice de Insónia, o IQSS, o GDS e a
LS-UCLA. Verificou-se que o Índice de Insónia se relacionou de forma
moderada positiva e estatisticamente significativa com o GDS no grupo dos
idosos não-institucionalizados. O IQSS relacionou-se de forma positiva moderada
e significativa com o GDS nos dois grupos. Por último, o índice de insónia e o
IQSS não se relacionaram com a LS-UCLA em nenhum dos grupos. A subida das
correlações do grupo de idosos institucionalizados para o grupo dos
não-institucionalizados não se mostrou significativa (-1,96 < Zobs
> 1,96).
|
Correlações de Pearson (Índice de
Insónia, Total do IQSS, GDS e LS-UCLA) por Situação Residencial |
|
|||||||||
|
|
Institucionalizados |
|
Não-institucionalizados |
|
||||||
|
II |
IQSS |
GDS |
LS-UCLA |
II |
IQSS |
GDS |
LS-UCLA |
|
||
|
II |
— |
0,0,5 |
-0,21 |
0,05 |
|
— |
0,06 |
-0,01 |
0,03 |
|
|
IQSS |
|
— |
0,39** |
0,31 |
|
|
— |
0,35** |
0,08 |
|
|
GDS |
|
|
— |
0,58** |
|
|
|
— |
0,58** |
|
|
LS-UCLA |
|
|
|
— |
|
|
|
|
— |
|
|
Nota. II
= Índice de Insónia; IQSS = Índice de Qualidade Subjetiva do
Sono; GDS = Inventário Geriátrico da Depressão; LS-UCLA = Escala de Solidão
da Universidade da Califórnia, Los Angeles. ** Correlação significativa no nível
de significância de 0,01. |
|
O estudo de conceitos como o sono, a solidão e a
depressão pode ser desafiador, principalmente em idosos. Alguns resultados
desta investigação contrastam, surpreendentemente, com os obtidos por outras
pesquisas.
A exceção ocorre ao nível da solidão, tendo-se
verificado que os idosos institucionalizados apresentam mais sentimentos de
solidão comparativamente com os idosos não-institucionalizados, o que é
corroborado por estudos prévios (de Jong Gierveld &
Havens, 2004; Stek et al., 2005),
podendo este resultado decorrer do menor número de relações de amizade
associado à institucionalização (Kim et al., 2009). Em oposição, o estudo de
Almeida e Quintão (2012) com idosos portugueses institucionalizados
das regiões do Algarve, Alentejo e Grande Lisboa não encontrou diferenças entre
os dois grupos ao nível da solidão. No entanto, o seu estudo envolveu somente
uma questão neste sentido (“Com que frequência se sente só”), o que pode não
refletir o mesmo constructo.
Para além da solidão, e que seja de nosso
conhecimento, este é o segundo estudo a mostrar que a intensidade dos sintomas
depressivos é semelhante quando se comparam idosos institucionalizados com
não-institucionalizados, opondo-se aos resultados de estudos anteriores (Cravello
et al., 2011; Plati et al., 2006; Szczerbińska et al., 2012) os quais indicam a presença de
sintomatologia ligeira ou grave em idosos institucionalizados. Supunha-se que a
necessidade de adaptação a novas regras e rotinas, a quebra de laços e a
limitada estimulação implicada na institucionalização (Paúl, 1997) fosse
a responsável pelos sintomas depressivos, no entanto podem existir outros
aspetos envolvidos. Note-se que o estudo de Almeida e Quintão (2012)
mostrou igualmente que os sintomas depressivos não se distinguiam dos registados
em idosos residentes na comunidade. Estas autoras concluíram que não seria a
institucionalização, mas sim a qualidade do acompanhamento ao idoso a
responsável pelos níveis depressivos. De sublinhar que, uma vez que alguns dos
estudos do TEIRS mostram que existe associação dos sintomas depressivos com a
escolaridade (Goncalves et al., 2012; Pena et al., 2012)
e considerando que os nossos dois grupos ficaram emparelhados nesta variável e
ambos com nível baixo, removendo o seu efeito, então talvez poder-se-ia deduzir
que a depressão não se relaciona com a institucionalização. No entanto, se
analisar de novo as investigações acima citadas, verifica-se que no estudo de
Plati et al. (2006), os dois grupos foram também emparelhados e
que o nível de escolaridade era baixo em ambos [na investigação de Szczerbińska et al. (2012), a escolaridade não é reportada]. Assim,
podendo este resultado dever-se a aspetos culturais e sociais portugueses, ele
deve ser confirmado em estudos futuros com amostras regionalmente mais amplas.
No que respeita à qualidade do sono medida pelo Questionário
Sobre o Sono na Terceira Idade, à semelhança de outra investigação (Araújo &
Ceolim, 2010), a prevalência de problemas de sono não é muito alta
em qualquer um dos grupos, podendo este resultado decorrer da potencial
discrepância entre a perceção da qualidade do sono e a existência real de
problemas (Araújo & Ceolim, 2010). Segue-se que, a par com a pesquisa
de Garmendia-Leiza et al. (2013) e de Middelkoop et al. (1994),
este será um dos poucos estudos a comparar a qualidade do sono entre idosos
institucionalizados e idosos residentes na comunidade. Na presente investigação
não se verificam diferenças na qualidade de sono entre os dois grupos, por
contraste, nas pesquisas de Middelkoop et al. (1994) e de Garmendia-Leiza
et al. (2013) foram observadas diferenças, mas na última pesquisa as
diferenças circunscreveram-se ao período de fim de semana (explicável pela
quebra de rotina). Note-se que a investigação de Garmendia-Leiza et al. (2013) recorreu à
medição objetiva do sono. Ora, a utilização de métodos objetivos e subjetivos
para a medição do sono poderá conduzir a resultados diferentes. De sublinhar
que noutra pesquisa, usando métodos objetivos, não foram encontradas diferenças
nos padrões do sono, no entanto na medição subjetiva do sono verificaram-se
diferenças entre idosos residentes na
sua casa versus residentes em casa dos filhos (Johnson, 1986).
Uma possível leitura para a ausência de diferenças na qualidade do sono do
nosso estudo pode estar na semelhança de rotinas, sendo reconhecida a sua
importância para um sono regular e recuperador (Zisberg, Gur-Yaish, &
Shochat, 2010). Por norma, as rotinas são habituais nas
instituições, ocorrendo ida mais cedo para a cama do que na residência pessoal
(Middelkoop
et al., 1994), o que pode não ter acontecido no nosso estudo (aspeto
não investigado). Outra explicação está na natureza da amostra. Uma vez que
foram removidos idosos da nossa amostra com défice cognitivo e com demência, o
que levou consequentemente a uma potencial redução de uma grande variabilidade
nos padrões do sono (Johnson, 1986), diminuíram provavelmente o número
de pessoas com problemas de sono. Em abono da hipótese da semelhança de rotina,
temos o achado da ausência de diferença na questão das sestas. De notar que o
número de sestas é apresentado na literatura como mais frequente nas situações
de institucionalização (Middelkoop et al., 1994). Por fim, outra explicação destes
resultados pode residir no uso de medicação: os dados recolhidos mostraram que
não há associação significativa entre a medicação e a situação residencial, não
esquecendo, porém, que não se obteve informação de um grande número de pessoas.
De futuro, gostaríamos de poder debruçar-nos mais sobre a questão da toma da
medicação, equacionando recolher estes dados junto do pessoal de enfermagem, por
forma a controlar a influência desta variável nos resultados.
Ainda quanto ao sono, as diferenças encontradas no
presente estudo incluem uma maior percentagem de relato de acordar cedo,
pesadelos e de atividade física entre idosos não-institucionalizados,
suportando os dois primeiros a perceção de uma má qualidade subjetiva de sono
por parte destes idosos. Ficam por elucidar estes resultados, podendo vir a ser
clarificado em estudos futuros com o uso de medidas objetivas.
Um dos objetivos da presente investigação passou por
compreender o papel das variáveis sociodemográficas nas pontuações da amostra
global. Verificou-se que somente o estado civil influenciou as pontuações de exclusivamente
do GDS. Como mostraram outros estudos do TEIRS (Daniel, Vicente, Guadalupe,
Silva, & Santo, 2015; Silva et al., 2015; Vicente et al., 2014),
na realidade institucional existe um grande número de pessoas viúvas, mas na
investigação presente, devido ao emparelhamento dos grupos, removeu-se o seu
papel potencial, e, talvez por isso, não se tenham encontrado diferenças entre
idosos institucionalizados e idosos da comunidade a nível da sintomatologia
depressiva medida através do GDS.
No que concerne ao estudo correlacional, este revelou
somente algumas surpresas. Ao contrário
de outras pesquisas (Ancoli-Israel, 2006, 2009; Babar et al., 2000; Cho et al., 2008;
Cole &
Dendukuri, 2003; Giron et al., 2002), a insónia, determinada
por um índice desenvolvido para efeitos do presente estudo, não se relacionou
significativamente com os sintomas depressivos em nenhum dos grupos. Tal como
supracitado, o facto de haver um número substancial de idosos
institucionalizados dos quais não existe informação relativamente à prescrição
de fármacos, não nos permite retirar ilações, sugerindo-se que este aspeto seja
controlado em pesquisas posteriores. Ainda assim, o emparelhamento das amostras
reduziu substancialmente a fonte de variação na sintomatologia, o que poderá justificar
o menor número de insones entre os idosos institucionalizados. Outra explicação
é a própria natureza do Índice de Insónia que pode impedir a devida
análise da relação. De facto, já se verifica uma relação moderada positiva e
significativa entre a qualidade subjetiva
do sono e os sintomas depressivos nos dois grupos.
Os índices relativos ao sono não se relacionaram com a
solidão em nenhum dos grupos, contrariamente a dois estudos (Cacioppo
et al., 2002a, 2002b).
Mais uma vez, tendo sido removidas algumas fontes de variação dos padrões do
sono, particularmente o défice cognitivo (Johnson, 1986),
aspeto não controlado nos referidos estudos (Cacioppo et al., 2002a,
2002b), podemos com essa
alteração ter mostrado que a solidão não se relaciona com a qualidade ou
alterações do sono. Para testar esta hipótese, dever-se-á replicar a análise
com idosos com défice e/ou demência.
Finalmente, à semelhança das investigações revistas (Cacioppo
et al., 2006; Houtjes et al., 2014; Stek et al., 2005; Vaz & Gaspar, 2011; Zebhauser
et al., 2014), verificou-se que a maior intensidade de
sintomatologia depressiva se relaciona com mais sentimentos de solidão. A
revisão da literatura permite concluir que a relação é bidirecional: sendo a
diminuição do interesse ou prazer em quase todas as atividades durante a maior
parte dos dias um dos sintomas depressivos, percebe-se que a depressão seja um
fator de risco para a solidão (Houtjes et al., 2014)
e, inversamente, a solidão é um fator de risco para a depressão (Cacioppo
et al., 2006).
As principais limitações do presente estudo já foram
apontadas (métodos de avaliação do sono subjetivos, composição da bateria de
avaliação utilizada e a ausência de controlo da medicação em todos os
participantes), mas há que ter em consideração outros aspetos. Primeiro, a
natureza correlacional da análise não permite tirar ilações de natureza causal
ou direcional, sendo necessário, para colmatar esta restrição, a realização de
pesquisas de natureza prospetiva. Segundo, a amostra desta pesquisa englobou
pessoas sem défice/demência e que aceitaram participar voluntariamente, pelo
que não se pode generalizar a populações de pessoas idosas com défice/demência
e que se recusam a ser avaliadas. A condição de recusa de participação em
estudos desta natureza por parte de idosos, pode esconder problemas emocionais,
cognitivos ou outros que podem ser origem de variabilidade da qualidade do
sono/perturbações do sono. Em terceiro, grupos mais representativos em termos
sociodemográficos e clínicos (e para esse feito, de maior dimensão), poderiam
ter suportado achados diferentes. Quarto, o apoio nos auto-relatos de idosos é,
potencialmente, origem de enviesamentos, pelo que se recomenda o complemento com
informação obtida através de entrevistas de diagnóstico relativas a
perturbações do sono e à recolha de informação com informantes. Note-se a este
respeito, no entanto, que dois instrumentos previamente estudados no TEIRS
dirigidos aos informantes se revelaram insatisfatórios em estruturas
residenciais de apoio à terceira idade (Gomes, 2012; Reis,
2011). De referir ainda que, a falta de informação diagnóstica
impede-nos de concluir taxativamente que os aspetos relacionados com a
sintomatologia depressiva não seriam diferentes daqueles que se associariam aos
diferentes tipos de depressão. Por fim, será também importante em estudos
futuros, em torno dos constructos analisados, existir uma análise/registo das
rotinas de idosos institucionalizados e de idosos da comunidade. Este ponto
torna-se importante pois, para além de figurar como uma limitação do presente
estudo, dificultando a leitura de resultados e com impacto na qualidade do
sono, poderão existir alterações no paradigma das rotinas quer nas instituições
quer nas residências individuais.
Conclusão
Apesar das limitações referidas, há que destacar que
este é o primeiro estudo a comparar a qualidade do sono entre idosos
institucionalizados e idosos e idosos residentes na comunidade em Portugal e
que muitas variáveis de confusão potencial foram controladas. O estudo fornece
evidências de que institucionalização se acompanha de mais sentimentos de
solidão, destacando a necessidade de não negligenciar a sua avaliação em
pessoas idosas. À avaliação impõe-se, em adição, a possibilidade de mudança por
meio de intervenções destinadas a prevenir ou reduzir a solidão em pessoas
idosas.
Conflito de interesses: nenhum.
Fontes de financiamento: nenhuma.
Agradecimentos: As autoras agradecem aos colegas do projeto que
contribuíram para a recolha da amostra entre 2010 e 2015. As autoras gostariam
também de agradecer a Diogo Moreira pelo apoio na tradução do Resumo.
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ⓘ PsyM. Elaboração do trabalho,
recolha e inserção de dados, análise estatística. Instituto Superior Miguel
Torga, Coimbra, Portugal.
ⓘ PsyM. Elaboração e revisão do texto. Instituto Superior Miguel Torga,
Coimbra, Portugal.
ⓘ PhD. Coordenação do projeto, elaboração do trabalho, análise estatística
e revisão do texto. Instituto Superior Miguel Torga, Coimbra, Portugal.
[1] 1.1. Dificuldade em adormecer; 1.2. Acordar muitas
vezes durante a noite; 1.3. Acordar muito cedo e não conseguir voltar a
adormecer; 1.4. O problema em dormir tem afetado a sua vida; 1.5. Satisfação
com o sono.
[2] Apneia do sono, pernas agitadas ou irrequietas,
pesadelos, ereção dolorosa (no caso do sexo masculino) ou outra.
[3] Entre os fármacos perturbadores da arquitetura do
sono, o avaliador deveria verificar o uso de descongestionantes,
beta-agonistas, betabloqueador, cafeínico, antidepressivos ativadores,
corticosteroides, diuréticos, antiarrítmicos e estatinas. Entre os
perturbadores da vigília diurna, o avaliador deveria informar-se sobre o
consumo de anti-histamínicos, antidepressivos sedativos, antipsicóticos (1ª
geração), antimuscarínicos, agonistas da dopamina e antiepiléticos.
[4] A questão é explicada da seguinte forma: o idoso
revela maior agitação/está mais vigilante durante a noite e dorme sobretudo
durante o dia?
[5] Critérios: A) insatisfação com iniciar sono, manter ou
acordar precoce; B) sofrimento significativo; C) dificuldades ≥ 3 noites/semana;
D) dificuldades permanecem pelos menos 3 meses; E) oportunidades adequadas para
dormir; F) outra perturbação do sono-vigília não explica melhor; G) não atribuível
a efeitos de substâncias; H) não melhor explicada por doenças mentais ou
físicas. A dimensão temporal não entrou para o Índice de Insónia.