2016, Vol. 2(2): 41-54
Memória e envelhecimento: Qual o real impacto da
idade?
Artigo Original
Helena Espirito-Santo ⓘ ✉, Inês Torres
Pena ⓘ, Inês Queiroz
Garcia ⓘ, Catarina
Freitas Pires ⓘ, Margarida Couto ⓘ, Fernanda Daniel ⓘ
https://doi.org/10.7342/ismt.rpics.2016.2.2.40
Recebido 12 setembro 2016
Aceite 30 setembro 2016
Objetivos. O défice mnésico é uma das alterações
cognitivas que mais afeta as pessoas idosas. A idade é considerada um dos
fatores de relevo nas alterações de memória, inclusivamente pelas próprias
pessoas idosas. A investigação tem mostrado que existem outros fatores além da
idade que afetam a memória das pessoas idosas. Contudo, fica por esclarecer
qual o real papel da idade sobre a memória quando é controlada a influência de
outras variáveis. Assim, o presente estudo pretende analisar o impacto da idade
no funcionamento mnésico de pessoas idosas e verificar se, ao controlar o papel
de outras variáveis (sexo, escolaridade, profissão, situação civil, situação
residencial e situação clínica), esse potencial impacto se mantém.
Métodos. A amostra global foi constituída por
1126 participantes (283 homens e 843 mulheres; 226 residentes na comunidade e
900 em resposta social dirigida à população idosa) com idades compreendidas
entre os 60 e os 100 anos. A avaliação foi realizada com recurso aos itens do Mini-Mental
State Examination (memória de trabalho), o fator do Montreal Cognitive
Assessment (memória declarativa verbal) e Figura Complexa de Rey-Osterrieth
(memória visuoespacial).
Resultados. Globalmente, a idade, escolaridade,
profissão, situação civil, residencial e clínica influenciaram a memória de
forma diferenciada consoante o tipo de memória. As análises de regressão
hierárquica mostraram que a idade é um fator preditivo em todos os tipos de
memória. Emergiram ainda outros fatores preditivos com coeficientes de
regressão superiores à idade conforme o tipo de memória (exceto na memória de
trabalho).
Conclusões. A idade, a escolaridade e a
profissão influenciam a memória, assim como os fatores que potencialmente
estimulam cognitiva e socialmente (como ter um companheiro e residir na
comunidade). Os resultados apontam para a importância de intervir em pessoas em
respostas sociais, mais idosas, sem companheiro, com baixa escolaridade e
profissão manual.
Palavras chave:
Envelhecimento · Memória ·
Institucionalização · Características
sociodemográficas
A designação genérica “memória” refere-se à
capacidade de reproduzir ou recordar conteúdos experienciados ou aprendidos (Tulving
& Craik, 2000). Existem, contudo, muitos tipos de memória e a
sua classificação permanece como objeto de discussão e mudança (Schacter,
2012). A memória pode ser classificada pelo seu conteúdo (explícita
vs. implícita), duração (curta e longo prazo) e natureza (e.g., verbal,
olfativa ou visual) (Cherkin, 1968; Gold & McGaugh, 1975;
Squire,
1992; Tulving, 1972). É uma ideia corrente que a memória
(genericamente designada) vai diminuindo com a idade e para essa ideia terá
contribuído um conjunto vasto de investigação.
Kral (1962) foi um dos
primeiros a descrever dois tipos de alterações de memória em pessoas idosas,
designando-as por esquecimento senescente
benigno e esquecimento senescente
maligno. Mais tarde, o esquecimento senescente benigno passou a ser
considerado normal e o maligno como a descrição de demência (Larrabee, Levin, & High,
1986). Pela mesma altura, a ideia de que o declínio da memória seria
normal no envelhecimento levou à criação da designação de síndrome do défice de memória associado à idade (AAMI; age-associated memory impairment, Crook et
al., 1986). Ainda que a AAMI tenha sido definida originalmente como
a alteração da memória em pessoas idosas razoavelmente saudáveis (Crook et
al., 1986; Hänninen et al., 1995), existem evidências de que
a AAMI é uma condição específica não-normal. Assim, a investigação ao longo do
tempo tem mostrado que as pessoas com AAMI apresentam pequenas alterações no
hipocampo (Mega et al., 2002; Parnetti et al., 1996; Soininen et al., 1994),
menor ativação nas regiões parietais mediais (Miller et al., 2008) e um perfil
genético diferente (Bartrés-Faz et al., 2001). Para além de a
investigação mostrar que a AAMI é diferente do envelhecimento normal, o próprio
constructo tem sido fonte de crítica. Em particular, tem sido considerado que a
AAMI reflete principalmente o nível educacional (Koivisto et al., 1995)
e intelectual (Nielsen, Lolk, & Kragh-Sørensen, 1998).
Acrescente-se que os estudos com pessoas
idosas verdadeiramente saudáveis têm indicado que as perdas cognitivas não são
consideráveis no envelhecimento normal (Howieson, Holm, Kaye, Oken,
& Howieson 1993; Rubin et al., 1998). Entre essas perdas,
são descritas as dificuldades em recordar nomes, em “encontrar” palavras e os
esquecimentos de tarefas projetadas momentos antes (Craik, 1994).
Considerando, então, que existe um
envelhecimento saudável onde as perdas de memória não são substanciais e um
envelhecimento não-saudável onde o défice da memória é frequente, nem por isso
fica simplificada a compreensão do que acontece à memória no envelhecimento. Na
realidade, as evidências de que a memória se altera no envelhecimento variam
consoante o tipo de memória avaliada (episódica, semântica, prospetiva,
trabalho e outros tipos de memória). Assim, a memória episódica parece ser a
que mais declina com a idade (Bäckman, Small, Wahlin, & Larsson, 2000; Nyberg
et al., 2003; Rönnlund, Nyberg, Bäckman, & Nilsson, 2005).
Nyberg et al. (2003) também concluíram que a memória episódica é
sensível à idade, diferentemente da memória semântica que tenderia a resistir
ao envelhecimento. Huppert, Johnson e Nickson (2000) verificaram
uma maior prevalência de alterações da memória prospetiva na idade avançada. A
memória de trabalho parece também alterar-se com a idade (Hultsch, Hertzog, Small,
McDonald-Miszczak, & Dixon, 1992; Park et al., 2002;
Park
& Reuter-Lorenz, 2009). Outros tipos de memória (e.g., memória
processual e priming) podem
alterar-se muito pouco com o envelhecimento (Bäckman et al., 2000).
Para além das mudanças objetivas, há a acrescentar as queixas subjetivas de
perda de memória que são também frequentes em pessoas idosas (Slavin et al., 2010;
Zandi, 2004).
Descontando a complexidade, se se tiver em
linha de conta que as alterações da memória estão entre as alterações
cognitivas que mais afetam as pessoas idosas (Bangen et al., 2010; Casanova-Sotolongo,
Casanova-Carrillo, & Casanova-Carrillo, 2004; Delis & Kramer, 2000;
Slavin
et al., 2010; Zandi, 2004), levanta-se então uma questão importante.
Se não se considerar a influência da idade (Boone, Lesser,
Hill-Gutierrez, Berman, & D’Elia, 1993; Chen & Naveh-Benjamin,
2012; Gallagher & Burke, 2007; Pauls, Petermann, &
Lepach, 2013; Old & Naveh-Benjamin, 2008; Rosselli
& Ardilla, 1991; Zandi, 2004), quais são os outros fatores
envolvidos no défice mnésico das pessoas idosas? O sexo parece ser um desses
fatores. Assim, as mulheres idosas parecem ser melhores no que diz respeito à
memória verbal (Herlitz, Nilsson, & Bäckman, 1997; Herlitz
& Rehnman, 2008; Zahodne et al., 2011; Pauls et al., 2013),
com um declínio menos acentuado associado ao envelhecimento (Meinz & Salthouse, 1998).
Os homens revelam ainda pior desempenho em provas de associação emocional (Naveh-Benjamin,
Maddox, Jones, Old, & Kilb, 2012) e maior declínio em provas de
memória de localização de objetos (Maylor et al., 2007). Os homens revelam-se
melhores do que as mulheres idosas nas provas que avaliam a memória visual
imediata (Rosselli & Ardilla, 1991) e esse predomínio
parece relacionar-se com a sua maior capacidade visuoespacial (Pauls et al., 2013).
Esse predomínio é revertido quando a memória visual se refere a faces (Herlitz
& Rehnman, 2008). Na memória de trabalho, as evidências mostram
que não há associação com o sexo (Zahodne et al., 2011).
Outro fator relevante é o nível educacional,
com vários trabalhos a mostrar que quanto maior é o nível de escolaridade,
menor é a perda de memória (Jonker, Geerlings, & Schmand, 2000; Elias,
Elias, D’Agostino, Silbershatz, & Wolf, 1997; Lövdén
et al., 2004; Rönnlund et al., 2005; Rosselli
& Ardilla, 1991; Schneeweis, Skirbekk, & Winter-Ebmer, 2014;
Tucker-Drob,
Johnson, & Jones, 2009). Com evidências adicionais a sugerir que
o nível educacional se relaciona com o défice, mas não com o declínio mnésico (Zahodne
et al., 2011).
No seguimento do fator anterior, a ocupação
prévia é outro aspeto que parece associar-se ao desempenho cognitivo,
especialmente em homens idosos (Potter, Helms, & Plassman, 2008), com
esses efeitos a atenuarem-se após a reforma (May, 2011). No
mesmo sentido, as atividades cognitivas passadas mais estimulantes mostraram-se
associadas a declínio mais lento da memória episódica e semântica (revisão de Bennet
et al., 2012).
Curiosamente, o estado civil também aparece
como fator protetor. Ainda que não seja referida a memória, Håkansson et al. (2009)
verificaram que os indivíduos casados ou a viverem em união de facto tinham
metade do risco de vir a desenvolver problemas a nível cognitivo em relação aos
indivíduos solteiros, divorciados ou viúvos. Conroy, Golden, Jeffares, O'Neill
e McGee (2010) e Shankar, Hamer, McMunn e Steptoe (2013) encontraram
também um pior funcionamento cognitivo naqueles que, para além de não serem
casados, viviam sozinhos. Num nível de gravidade superior, a ausência de
companheiro parece ser fator de risco de desenvolvimento de demência (Bickel
& Cooper, 1994; Fratiglioni, Wang, Ericsson, Maytan, &
Winblad, 2000).
Para terminar os fatores sociodemográficos,
um estudo realizado por Winocur (1982) revelou a existência de mais
problemas da memória em pessoas idosas que residiam em Estruturas Residenciais para Idosos comparados com os que viviam
nas suas casas. No estudo mais recente de Fastame, Hitchcott, Penna e Murino (2016),
os dados foram noutro sentido: não houve diferenças significativas entre
residentes em Estruturas Residenciais para Idosos e idosos residentes na
comunidade em várias medidas referentes à memória de trabalho (verbal, visual e
de dígitos).
Outros fatores são de ordem clínica. Por
exemplo, um estudo (Comijs et al., 2009) reportou défice da memória
verbal em doentes idosos que sofreram de acidente vascular cerebral (AVC) e,
inversamente, melhoria de memória em pessoas idosas com doença cardíaca ou com
cancro face ao seu estado prévio. Em pessoas idosas com diabetes, os mesmos
autores verificaram declínio na evocação diferida. Hassing et al. (2004)
verificaram associação similar em pessoas idosas com diabetes comórbida com
hipertensão. Para terminar a revisão dos fatores clínicos, a informação
relativa à influência da medicação não se tem relevado consistente (Plassman,
Williams, Burke, Holsinger, & Benjamin, 2010).
Em síntese, a idade é um fator incontornável
no défice mnésico, mas será que é um fator significativo quando se entra em
linha de conta com outros fatores sociodemográficos e clínicos? Assim, os
objetivos do presente estudo são: a) verificar qual a influência das variáveis
sociodemográficas e clínicas ao nível do funcionamento mnésico em pessoas idosas
de uma amostra portuguesa; b) verificar qual o efeito da idade no funcionamento
mnésico ao controlar o papel das restantes variáveis.
Plano de estudo
O estudo teve um delineamento transversal com amostragem de conveniência.
As variáveis dependentes foram a memória de trabalho, memória declarativa
verbal, memória visuoespacial imediata e diferida. As variáveis independentes
foram a idade [contínua e dicotomizada pela mediana (Md = 80 anos)], o sexo, a escolaridade (contínua e dicotomizada em com e sem escolaridade), a profissão (manual
ou intelectual), o estado civil [sem companheiro (solteiro, separado,
divorciado e viúvo) e com companheiro
(casado e união de facto)]; a situação residencial (comunidade vs. resposta
social institucional) e a situação clínica geral (sem doença neurológica vs. com
doença neurológica). A institucionalização em resposta social incluiu
estruturas residenciais para idosos (lares), centros de dia e centros de noite.
Apesar da heterogeneidade das categorias de doença incluídas nas condições
clínicas, optou-se por manter todos os sujeitos. A manutenção de todos os
sujeitos foi uma forma de respeitar a realidade da amostra recolhida e uma
necessidade para a realização de algumas análises estatísticas, pois algumas
categorias clínicas continham poucos participantes.
Participantes
Em consonância com os objetivos deste estudo, foram selecionados
participantes da amostra total do projeto Trajetórias
do Envelhecimento de Idosos em Resposta Social (TEIRS) que englobava 1611
pessoas idosas. Os únicos critérios de seleção foram a idade superior a 60
anos, a ausência de afasia e a não recusa de participação no estudo.
Instrumentos
O Mini-Mental State Examination (MMSE; Folstein, Folstein, & McHugh,
1975) é um instrumento de breve aplicação (demora cerca de 10 a 15
minutos), de fácil administração e cotação (Strauss, Sherman, &
Spreen, 2006). O MMSE tem como objetivo diferenciar doentes
neurológicos de doentes psiquiátricos (Lobo et al., 1999), sendo dos instrumentos
de avaliação breve do défice cognitivo mais utilizados. Está adaptado à
população portuguesa por Guerreiro, Silva, Botelho, Leitão, Castro-Caldas e Garcia
(1994). O MMSE é constituído por uma série de perguntas e
tarefas que se agrupam em onze categorias: orientação temporal, orientação
espacial, retenção, atenção/controlo mental, evocação, nomeação, repetição,
compreensão, leitura, escrita e habilidade construtiva (Folstein et al., 1975). O
MMSE, consoante a população clínica, revela uma boa consistência interna (0,54
a 0,96) e boa confiabilidade teste-reteste (0,80 a 0,95) (Tombaugh & McIntyre, 1992).
Na presente investigação, foi utilizada somente a pontuação compósita
resultante do somatório dos itens que avaliam a memória de trabalho (retenção e
evocação; MMSE-MEMO), podendo a sua pontuação total variar entre o zero (pior
memória) e os seis pontos (melhor memória) (Pascual-Millán, Fernández,
Saz, Lobo, & Morales-Asín, 2000; Shigemori, Ohgi, Okuyama,
Shimura, & Schneider, 2010).
O Montreal Cognitive Assessment (MoCA; Nasreddine et al., 2005) é
um instrumento breve de rastreio cognitivo (aproximadamente 10 minutos). O MoCA
avalia diferentes domínios cognitivos, através de diversas tarefas: funções
executivas, capacidades visuoconstrutivas, memória, atenção e concentração,
linguagem, capacidade de abstração, cálculo e orientação. A pontuação máxima
deste instrumento é de 30 pontos. É considerada normal uma pontuação igual ou
superior a 26 pontos (Guerreiro, 2010). As propriedades
psicométricas da versão original revelaram-se boas, com a escala a apresentar
um alfa de Cronbach de 0,83 e um teste-reteste elevado (r = 0,92) (Nasreddine et al., 2005). Na presente
investigação, recorreu-se somente ao fator memória que inclui os itens Evocação Diferida (recordar palavras
apresentadas anteriormente), Repetição de
Dígitos invertidos, Nomeação de três
animais selvagens, Repetição de
frases e Orientação temporal (dia do mês, mês, ano, dia da semana) e espacial (lugar e localidade) (Duro, Simões,
Ponciano, & Santana, 2010). De acordo com a definição de Tulving
(1972), podemos considerar que este fator se aproxima do
conceito de memória semântica
(recordação de acontecimentos gerais associados a uma determinada cultura e
aprendidos como forma de conhecimento) e de memória
episódica (memória de acontecimentos específicos) ou memória declarativa verbal (Tulving, 1995). O
conjunto dos itens no presente estudo obteve um alfa de Cronbach de 0,70
(consistência interna aceitável para instrumentos hetero-administrados; Peterson, 1994).
O teste da Figura Complexa de Rey-Osterrieth (FCR-O, Rey, 1941; 2002)
é uma prova neuropsicológica desenvolvida por Rey (1941) e padronizado por
Osterrieth (1944). A FCR-O foi concebida para avaliar estratégias de
resolução de problemas, planeamento, capacidades organizacionais, funções
motoras, perceção e memória visuoespacial (Meyers & Meyers, 1995;
Lezak, Howieson,
Biegler, & Tranel, 2012). A FCR-O é constituída por três provas:
cópia, memória imediata (3 minutos; FCR-O-3MIN) e memória diferida (20-30
minutos; FCR-O-20MIN). Neste estudo usou-se a prova da memória imediata e da
memória diferida. No primeiro momento (cópia) a imagem foi apresentada
horizontalmente ao sujeito, para que ele copiasse. No segundo momento,
solicitou-se a realização da imagem de memória (evocação), sem aviso prévio. No
terceiro momento, passados 20 minutos, foi solicitado que fosse novamente
produzido de memória o desenho da FCR-O. A correção e cotação da prova teve
como critério o método definido por Osterrieth (1944) que avalia, quer a
forma como o sujeito constrói a cópia (da mais racional para a menos racional),
quer a pontuação global. A pontuação global da prova varia entre os 0 pontos e
os 36 pontos, sendo os pontos obtidos consoante a construção dos 18 elementos
da figura (Rey, 2002). No presente estudo o teste obteve uma
elevada concordância entre juízes na prova da cópia (α = 0,98; p < 0,001) e uma consistência interna
também elevada (α de Cronbach = 0,93).
Utilizou-se a Entrevista Estruturada de Avaliação da Saúde Física do Idoso
para recolha de dados sobre a saúde física. Esta entrevista, desenvolvida para
o TEIRS, engloba seis grupos de perguntas. O primeiro grupo é respeitante à
saúde em geral e inclui seis questões de resposta dicotómica (febre, dor,
exercício físico, tabagismo, consumo de álcool, internamento ou intervenção
cirúrgica) e seis perguntas abertas sobre situações graves de saúde física
(enfarte agudo do miocárdio, acidente vascular cerebral, traumatismo
cranioencefálico ou outros) e presença de doenças específicas (hipertensão,
diabetes ou outras). O segundo grupo é relativo à visão e audição; o terceiro
sobre sintomatologia cardiovascular; o quarto sobre sintomatologia
geniturinária; o quinto sobre sintomatologia respiratória e o sexto sobre
sintomatologia neurológica (e.g., cefaleias, tremores, tonturas).
Procedimentos
A presente investigação fez parte integrante do TEIRS do Instituto
Superior Miguel Torga. O principal objetivo do TEIRS consiste no rastreio e
avaliação cognitiva de pessoas idosas que se encontram sob resposta social no
distrito de Coimbra. O TEIRS incluiu, desde 2012, pessoas idosas não
institucionalizadas e, desde 2013, foi alargado aos distritos de Leiria e da
Guarda.
Após a aprovação do pedido pelas várias instituições de resposta social
para idosos, cada pessoa idosa ou uma pessoa significativa para o idoso cedeu o
consentimento informado para a administração de uma bateria de testes e para a
consulta do seu processo clínico. Para a participação não houve qualquer
compensação monetária e o potencial mal-estar foi minimizado pela
disponibilidade dos investigadores em darem espaço aos idosos para expressarem
dificuldades ou problemas. A bateria, dividida por várias sessões, era
constituída por um questionário sociodemográfico e instrumentos de avaliação
cognitiva (e.g., Mini-Mental State
Examination), emocionais (e.g., Geriatric
Anxiety Inventory), comportamentais (e.g., Questionário sobre o Sono na Terceira Idade) e duas entrevistas,
uma sobre saúde física e outra sobre saúde mental.
Neste estudo analisaram-se os dados recolhidos através do Mini-Mental State Examination, Montreal
Cognitive Assessment e Figura Complexa de Rey-Osterrieth. Os dados clínicos
foram obtidos do cruzamento entre a informação retirada dos processos clínicos
individuais e da Entrevista Estruturada de Avaliação da Saúde Física do Idoso.
Todos os princípios éticos estabelecidos na declaração de Helsínquia foram
cumpridos (World Medical Association, 2013).
Análise Estatística
Para a análise e tratamento de dados utilizou-se o Programa Estatístico Statistical Package for the Social Sciences
(IBM SPSS Statistics, versão 24.0).
Na caracterização da amostra foram feitas análises descritivas seguidas
do teste de qui-quadrado da aderência para testar se as proporções das
categorias das variáveis sociodemográficas eram homogéneas. No estudo
descritivo das variáveis dependentes, determinaram-se as médias (M), desvios padrão (DP), medianas (Md) e
percentis 25 e 75 (P25, P75).
Para a tomada da decisão estatística, procedeu-se ao estudo da
normalidade da distribuição de pontuações das variáveis dependentes através do
teste Kolmogorov-Smirnov (KS). Neste
teste, sempre que foi indicada a presença de não-normalidade (p < 0,05), comum em amostras grandes
(Pallant, 2011),
recorreu-se à confirmação através da análise da curtose (Ku) e assimetria (Sk).
Foram considerados indicadores de normalidade os valores absolutos de curtose
inferiores a 7 e de simetria inferiores a 2, tal como sugerido por Kim (2013)
para amostras de dimensão superior a 300. Nas situações em que a dimensão da
amostra se situou entre 50 e 300, considerou-se o valor de z inferior a 3,29
para curtose e assimetria (Kim, 2013).
De seguida, verificou-se se existiam diferenças na memória entre os
grupos definidos pelas variáveis sociodemográficas e situação clínica geral
recorrendo ao teste t de Student para
amostras independentes. Para se diminuir o erro do tipo I, aplicou-se a
correção de Bonferroni que consistiu na divisão do nível do alfa (α =
0,05) pelo número de testes t
utilizados (m = 4) (Maroof, 2012).
A interpretação da magnitude nas diferenças (d de Cohen) seguiu a revisão de Espirito-Santo e Daniel (2015,
p. 9; insignificante: d < 0,20;
pequeno: d = 0,20; médio: d = 0,50; grande: d = 0,80; muito grande: d
> 1,29).
Por fim, para estudar o papel preditivo da variável idade controlando a
influência potencial das restantes variáveis sociodemográficas, procedeu-se a
regressões múltiplas hierárquicas, constituindo as pontuações relativas à
memória como variáveis de resposta.
Poder estatístico
Todos os testes estatísticos obtiveram poder estatístico adequado,
considerando a dimensão dos grupos definidos pela variável situação residencial
e pela variável situação clínica, o número de respostas aos testes e um erro de
probabilidade alfa de 0,05 (teste de qui-quadrado da independência: 100%; teste
t de amostras independentes: >
99,9%; regressões múltiplas: > 99,8%) (Buchner, Erdfelder, Faul, & Lang,
2014; Chang, 2013; Faul, Erdfelder, Lang, & Buchner, 2007).
Análises
preliminares
Características sociodemográficas e clínicas da amostra.
Sessenta e sete pessoas (4,2%) recusaram-se a ser avaliadas através dos
instrumentos incluídos no estudo presente. Seguindo os critérios de inclusão, a
amostra total ficou constituída por 1126 participantes (69,9%) com idades
compreendidas entre os 60 e os 100 anos, sendo a maioria do sexo feminino
(74,9%), com algum tipo de escolaridade (75,7%; média de anos de estudo: 3,75 ±
3,63), tendo exercido uma profissão predominantemente manual (81,7%), sem companheiro
(71,5%) e em resposta social institucional (80,0%) (Tabela 1).
As proporções de cada categoria sociodemográfica (com exceção da idade) não
foram idênticas (p < 0,05).
Em termos clínicos, não se obteve informação de
500 (44,4%) idosos por simultaneamente não ser possível aceder ao processo e os
idosos não saberem responder.
A informação clínica de 406 (36,1%) pessoas
indiciava ausência de doença neurológica, ainda que sofressem de algum problema
médico (Hipertensão: n = 144; 12,8%;
Diabetes: n = 129; 11,5%; Depressão: n = 17; 1,5%; Perturbação de ansiedade
generalizada: n = 18; 1,6%;
Dificuldades visuais ou auditivas: n
= 16; 1,4%; Outras condições não especificadas: n = 82; 7,3%).
|
Caracterização Sociodemográfica de uma Amostra
de Pessoas Idosas da Região Centro |
|
||||
|
|
Total |
χ² |
|
||
|
n |
% |
|
|||
|
Sexo |
Masculino |
283 |
25,1 |
278,51*** |
|
|
Feminino |
843 |
74,9 |
|
||
|
Idade |
Novos Velhos |
583 |
51,8 |
3,48NS |
|
|
Velhos Velhos |
521 |
46,3 |
|
||
|
Não sabe |
22 |
2,0 |
— |
|
|
|
M ± DP |
78,81 ± 8,52 |
— |
|
||
|
Escolaridade |
Nenhuma |
266 |
23,6 |
307,15*** |
|
|
> 4 anos |
852 |
75,7 |
|
||
|
Sem informação |
8 |
0,7 |
— |
|
|
|
M ± DP |
3,75 ± 3,63 |
— |
|
||
|
Profissão |
Manuala |
920 |
81,7 |
527,25*** |
|
|
Intelectuala |
164 |
14,6 |
|
||
|
Sem informação |
42 |
3,7 |
— |
|
|
|
Estado civil (companheiro) |
S/ companheiro |
804 |
71,4 |
208,41*** |
|
|
C/ companheiro |
320 |
28,4 |
|
||
|
Sem informação |
2 |
0,2 |
— |
|
|
|
Situação residencial |
Comunidade |
225 |
20,0 |
405,84*** |
|
|
Instituição |
901 |
80,0 |
|
||
|
Nota. M = média; DP =
desvio-padrão; χ² = Qui-Quadrado da aderência; t = teste t de
Student. NSNão-significativo; *p
< 0,05; **p < 0,01; ***p <
0,001. a Estas expressões designam profissões predominantemente manuais ou intelectuais. |
|
Registaram-se 220 (19,5%) pessoas com doença neurológica (Doença de Alzheimer:
n = 40; 3,6%; AVC: n = 126; 11,2%; Doença de Parkinson: n = 14; 1,2%; Demência frontotemporal: n = 1; 0,08%; Esclerose múltipla: n = 2; 0,2%; Epilepsia: n = 5; 0,4%; Outras doenças neurológicas
não especificadas: n = 37; 3,3%).
Descritivas.
Responderam 1028 pessoas ao MMSE-MEMO (omissos: n = 98; 8,7%; 2 por recusa e os
restantes por não ter sido aplicado por questões logísticas). A média foi de
4,25 (DP = 1,47; min = 0; máx = 6; P25 = 3; Md = 4; P75 = 6; KS = 0,24, p < 0,001; Ku = 1,68; Si = -1,30).
No MoCA-MEMO houve 937 respostas (omissos por não aplicação: n = 189;
16,8%). A média foi de 8,79 (DP =
4,32; min = 0; máx = 18; P25 = 6; Md = 9; P75 = 12; KS = 0,07, p < 0,001; Ku = -0,78; Si = -0,01).
Na FCR-O-3MIN houve 471 respostas (omissos por não aplicação: n = 328;
29,1%; por recusa: n = 327; 29,0%). A média foi de 7,62 (DP = 7,67; min = 0; máx = 33; P25 = 1,00; Md = 5,00; P75 = 12,00; KS = 0,11, p < 0,001; Ku = -0,83; Si = 0,41).
Por fim, na FCR-O-20MIN responderam 237 pessoas (não aplicados: n = 323; 28,7%; recusa: n = 566; 50,3%). A média foi de 10,39 (DP = 8,17; min = 0; máx = 36; P25 = 3,5; Md = 9,5; P75 = 16,5; KS = 0,13, p < 0,001; Ku = -0,53;
Si = 0,52).
Influência das
variáveis sociodemográficas e clínicas
As diferenças entre as pontuações médias dos testes que avaliam a Memória
pelos grupos definidos pelas variáveis sociodemográficas são apresentadas na Tabela 2. Como se pode verificar, a idade, a
profissão e a situação residencial exerceram influência estatisticamente
significativa sobre todos os tipos de memória. O sexo só mostrou influência
sobre as pontuações do MoCA-MEMO. A escolaridade influenciou os resultados das
várias medidas da memória, com exceção da MMSE-MEMO (p > 0,0125). Por fim, o estado civil afetou as pontuações
obtidas no MoCA-MEMO e na FCR-O-3MIN.
|
Diferenças nos Vários Tipos de
Memória entre os Grupos Definidos pelas Variáveis Sociodemográficas e
Situação Clínica Geral |
|
||||||||
|
|
MMSE-MEMO |
MoCA- MEMO |
FCR-O-3MIN |
FCR-O-20MIN |
|
||||
|
Idade (t, d) |
6,00* |
0,45d |
10,24* |
0,76dd |
7,85* |
0,80ddd |
2,88* |
0,38d |
|
|
Novos Velhos (M, DP) |
4,59 |
1,33 |
10,44 |
4,23 |
10,25 |
8,38 |
12,12 |
8,80 |
|
|
Velhos Velhos (M, DP) |
3,94 |
1,56 |
7,32 |
3,77 |
3,95 |
6,05 |
7,44 |
7,16 |
|
|
Sexo (t, d) |
0,13 |
0,00 |
2,54* |
0,17 |
1,19 |
0,12 |
0,61 |
0,00 |
|
|
Masculino (M, DP) |
4,29 |
1,45 |
9,64 |
4,30 |
8,71 |
8,14 |
11,76 |
8,57 |
|
|
Feminino (M, DP) |
4,28 |
1,49 |
8,69 |
4,36 |
7,53 |
8,18 |
10,82 |
8,72 |
|
|
Escolaridade (t, d) |
2,53 |
0,18 |
10,96* |
0,93ddd |
12,627* |
2,07ddd |
10,82* |
4,55ddd |
|
|
Não (M, DP) |
4,04 |
1,55 |
6,19 |
3,23 |
1,21 |
2,22 |
1,20 |
1,44 |
|
|
> 4 anos (M, DP) |
4,37 |
1,44 |
9,73 |
4,30 |
8,87 |
8,27 |
11,47 |
8,60 |
|
|
Profissão (t, d) |
6,24* |
0,54dd |
10,13* |
0,81ddd |
9,40* |
1,22ddd |
4,77* |
0,81ddd |
|
|
Manuala (M, DP) |
4,16 |
1,49 |
8,21 |
4,09 |
5,53 |
6,74 |
8,30 |
7,61 |
|
|
Intelectuala (M, DP) |
4,94 |
1,19 |
12,27 |
3,68 |
14,29 |
8,45 |
14,83 |
8,74 |
|
|
Companheiro (t, d) |
1,93 |
0,14 |
6,37*** |
0,50dd |
4,63*** |
0,41d |
2,53* |
0,27d |
|
|
Não (M, DP) |
4,20 |
1,46 |
8,25 |
4,18 |
6,38 |
7,02 |
9,17 |
7,86 |
|
|
Sim (M, DP) |
4,40 |
1,49 |
10,22 |
4,37 |
9,89 |
8,30 |
11,84 |
8,34 |
|
|
Residência (t, d) |
6,71* |
0,53dd |
18,38* |
1,41ddd |
9,98* |
1,19ddd |
4,38* |
0,15 |
|
|
Comunidade (M, DP) |
4,87 |
1,25 |
12,91 |
3,00 |
12,98 |
8,19 |
13,32 |
8,52 |
|
|
Instituição (M, DP) |
4,10 |
1,50 |
7,65 |
3,94 |
4,56 |
6,23 |
7,43 |
7,64 |
|
|
Doença neurológica (t, d) |
4,66*** |
0,39d |
4,19*** |
0,38d |
3,91*** |
0,54dd |
1,36 |
0,25d |
|
|
Não (M, DP) |
4,49 |
1,37 |
9,40 |
4,26 |
9,10 |
8,28 |
10,96 |
8,43 |
|
|
Sim (M, DP) |
3,93 |
1,55 |
7,81 |
4,28 |
5,14 |
6,55 |
8,52 |
8,17 |
|
|
Nota. M = média; DP = desvio-padrão; t =
teste t de Student; d = d de Cohen; MMSE-MEMO = Memória
de trabalho medida pelo Mini-Mental
State Examination; MoCA-MEMO = memória declarativa verbal avaliada pelo Montreal Cognitive Assessment;
FCR-O-3MIN = Memória visual imediata avaliada pela Figura Complexa de Rey-Osterrieth; FCR-O-20MIN = Memória
visuoespacial diferida avaliada pela Figura
Complexa de Rey-Osterrieth. *Diferenças significativas no nível de 0,0125
(ajustamento de Bonferroni); dd = pequeno; ddd
= médio; dddd = grande (tamanho do efeito). a Estas expressões designam
profissões predominantemente
manuais ou intelectuais. |
|
A situação clínica mostrou uma influência estatisticamente
significativa com magnitude pequena a média sobre todos os tipos de memória,
exceto a memória visuoespacial diferida.
De forma a podermos comparar as diferentes pontuações entre as
quatro provas pelas duas categorias de idade, convertemos as pontuações
não-padronizadas em valores z [z = pontuação - M) / DP] e depois em
valores T (T = z x 10 + 50). Na Figura 1 são apresentadas
as médias das pontuações T de cada uma das provas da memória.
Figura 1. Desempenho em Provas Neuropsicológicas da Memória (em pontuações T) de pessoas Idosas. Notas: MMSE-MEMO = memória de
trabalho do Mini-Mental State Examination; MoCA-MEMO = memória declarativa verbal do Montreal Cognitive
Assessment. FCR-O = memória
visuoespacial imediata (3MIN) e diferida (20Min) da Figura Complexa de Rey-Osterrieth.
Considerando os valores reportados na Tabela 2 e consoante as
provas, controlou-se a influência significativa das variáveis independentes
para testar o papel preditivo da idade na memória através de análises de regressão
múltipla. Estas análises foram efetuadas depois de confirmados os pressupostos
da regressão (n > 82 e n > 90; ausência de
multicolinearidade entre as variáveis independentes (correlações entre si
inferiores a 0,5; valores de tolerância acima de 0,10; VIF inferiores a 10 e ausência de valores extremos).
Na Tabela
3 são apresentados os preditores da MMSE-MEMO.
|
Regressão
Múltipla Hierárquica predizendo a Memória de Trabalho Avaliada pelo Mini-Mental State Examination
(MMSE-MEMO) e Correlaçõesa entre a Memória de Trabalho, Profissão,
Situação Residencial, Situação Clínica e Idade |
|
|||||||
|
|
MMSE-MEMO |
1 |
2 |
3 |
4 |
β |
beta |
|
|
1. Profissão |
0,19*** |
— |
|
|
|
0,47 |
0,12*** |
|
|
2. Situação
residencial |
0,20*** |
0,37*** |
— |
|
|
0,26 |
0,07* |
|
|
3. Situação Clínicab |
-0,03 |
0,003 |
-0,21*** |
— |
|
0,00 |
0,01 |
|
|
4. Idade |
-0,25*** |
-0,26*** |
-0,46*** |
-0,08** |
— |
-0,03 |
-0,18*** |
|
|
Nota. β = Peso matemático de cada variável
no modelo de regressão; beta = contribuição única de cada variável;
R2 = Coeficiente de Determinação; ΔR2 = Alteração do Coeficiente de
Determinação; F = ANOVA. aAs correlações com as
variáveis nominais foram ponto-bisseriais e com a idade foram de Pearson. *p < 0,05; ***p < 0,001. |
|
Quanto aos preditores da MMSE-MEMO, no Bloco 1, depois de inseridas
as variáveis independentes (profissão, situação residencial e situação clínica
geral), o modelo total explicou 23,4% da variância. No Bloco 2, o modelo como
um todo explicou 28,4%, com a idade a explicar uns adicionais 2,6% da
variância. Este contributo foi estatisticamente significativo [F(4, 995) = 21,77; p < 0,001). As variáveis independentes que predisseram
significativamente as pontuações na MMSE-MEMO foram, por ordem de importância,
a idade (beta = -0,18; p < 0,001), a profissão prévia (beta = 0,12; p < 0,01) e a situação residencial (beta = 0,07; p <
0,05).
Quanto aos preditores do MoCA-MEMO (Tabela 4), entraram no
Bloco 1 o sexo, escolaridade, profissão, estado civil, situação residencial e
situação clínica geral que explicaram 56,4% da variância. No Bloco 2, com a
inclusão da idade, o modelo no total explicou 58,6%. O total da variância do
MoCA-MEMO explicada pela idade, depois de remover os efeitos das restantes
variáveis independentes, foi de 2,6%, com contributo estatisticamente
significativo [F(7, 907) = 67,87; p < 0,001]. No modelo final, as
variáveis com um contributo individual significativo (p < 0,001) foram, por ordem de importância, a escolaridade (beta = 0,30), a situação residencial (beta = 0,23) e a idade (beta = -0,19).
|
Regressão Múltipla Hierárquica predizendo a Memória
Declarativa Verbal Avaliado pelo Montreal Cognitive Assesment (MoCA-MEMO) e
Correlaçõesa entre o Memória Declarativa Verbal, Sexo,
Escolaridade, Profissão, Estado civil, Situação Residencial, Situação Clínica
e Idade |
|
||||||||||
|
|
MoCA-MEMO |
1 |
2 |
3 |
4 |
5 |
6 |
7 |
β |
beta |
|
|
1. Sexo |
-0,08** |
— |
|
|
|
|
|
|
-0,50 |
-0,05 |
|
|
2. Escolaridade |
0,49*** |
-0,08** |
— |
|
|
|
|
|
0,36 |
0,30*** |
|
|
3. Profissão |
0,35*** |
-0,01 |
0,57*** |
— |
|
|
|
|
0,55 |
0,05 |
|
|
4. Estado civil |
0,20*** |
-0,21*** |
0,21*** |
0,13*** |
— |
|
|
|
-0,08 |
-0,01 |
|
|
5. Situação
residencial |
0,45*** |
0,01 |
0,42*** |
0,37*** |
0,34*** |
— |
|
|
2,44 |
0,23*** |
|
|
6. Situação
Clínicab |
0,02 |
< 0,01 |
< 0,01 |
0,03 |
0,03 |
< 0,01 |
— |
|
< 0,01 |
< 0,01 |
|
|
7. Idade |
-0,41*** |
0,03 |
-0,36*** |
-0,26*** |
-0,29*** |
-0,46*** |
-0,08** |
— |
-0,10 |
-0,19*** |
|
|
Nota. β = Peso matemático de cada variável
no modelo de regressão; beta = contribuição única de cada variável;
R2 = Coeficiente de Determinação; ΔR2 = Alteração do Coeficiente de
Determinação; F = ANOVA. aAs correlações com as
variáveis nominais foram ponto-bisseriais e com as restantes foram de
Pearson. *p < 0,05; **p < 0,001; ***p
< 0,001. |
|
Na FCR-O-3MIN (Tabela 5), a escolaridade, profissão, situação
residencial e situação clínica geral entraram no Bloco 1, explicando 56,8% da
variância. No Bloco 2, com a inclusão da idade, o modelo no total explicou
60,0%. O total da variância do FCR-O-3MIN explicada pela idade, depois de
remover os efeitos das restantes variáveis independentes, foi de 3,7%, sendo o
seu contributo estatisticamente significativo [F(5, 442) = 49,56; p <
0,001]. No modelo final, as variáveis com um contributo individual
significativo (p < 0,05) foram,
por ordem de importância, a escolaridade (beta
= 0,25), a idade (beta = 0,22) e a
situação residencial (beta = 0,18).
|
Regressão Múltipla Hierárquica
predizendo a Memória Visuoespacial Imediata Avaliada pela Figura Complexa de
Rey-Osterrieth de 3 Minutos Após Cópia (FCR-O-3MIN) e Correlaçõesa
entre a Memória Visual Imediata, Escolaridade, Profissão, Situação
Residencial, Situação Clínica e Idade |
|
||||||||
|
|
FCR-O-3MIN |
1 |
2 |
3 |
4 |
5 |
β |
beta |
|
|
1. Escolaridade |
0,49*** |
— |
|
|
|
|
0,49 |
0,25*** |
|
|
2. Profissão |
0,42*** |
0,57*** |
— |
|
|
|
0,42 |
0,15*** |
|
|
3. Situação residencial |
0,44 |
0,42*** |
0,37*** |
— |
|
|
0,44 |
0,18*** |
|
|
4. Situação clínica |
0,02 |
<
0,01 |
0,03 |
<
0,01 |
— |
|
0,02 |
<
0,01 |
|
|
5. Idade |
-0,43*** |
-0,36*** |
-0,26*** |
-0,46*** |
-0,08** |
— |
-0,43 |
-0,22*** |
|
|
Nota. β = Peso matemático de cada variável
no modelo de regressão; beta = contribuição única de cada variável;
R2 = Coeficiente de Determinação; ΔR2 = Alteração do Coeficiente de
Determinação; F = ANOVA. aAs correlações com as
variáveis nominais foram ponto-bisseriais e com as restantes foram de
Pearson. *p < 0,05; **p < 0,001; ***p
< 0,001. |
|
Na FCR-O-20MIN (Tabela 6), foram introduzidas a escolaridade,
profissão e situação residencial no Bloco 1 que explicaram 52,0% da variância.
A idade foi inserida no Bloco 2, ficando o modelo no total a explicar 56,8%.
Depois de remover os efeitos das restantes variáveis independentes, o
contributo individual da idade sobre a variância total do FCR-O-20MIN foi de
5,3%, sendo estatisticamente significativo [F(4,
209) = 24,94; p < 0,001]. No
modelo final, as variáveis com um contributo individual significativo (p < 0,05) foram, por ordem de
importância, a escolaridade (beta =
0,38) e a idade (beta = -0,26).
|
Regressão Múltipla Hierárquica
predizendo a Memória Visuoespacial Diferida Avaliada pela Figura Complexa de
Rey-Osterrieth de 20 Minutos Após Cópia (FCR-O-20MIN) e Correlaçõesa
entre a Memória Visual Diferida, Escolaridade, Profissão, Situação
Residencial e Idade |
|
|||||||
|
|
FCR-O-20MIN |
1 |
2 |
3 |
4 |
β |
beta |
|
|
1. Escolaridade |
0,50*** |
— |
|
|
|
0,71 |
0,38*** |
|
|
2. Profissão |
0,34*** |
0,58*** |
— |
|
|
0,49 |
0,03 |
|
|
3. Situação residencial |
0,28*** |
0,28*** |
0,30*** |
— |
|
0,95 |
0,06 |
|
|
4. Idade |
-0,42*** |
-0,32*** |
-0,30*** |
-0,42*** |
— |
-0,25 |
-0,26*** |
|
|
Nota. β = Peso matemático de cada variável
no modelo de regressão; beta = contribuição única de cada variável;
R2 = Coeficiente de Determinação; ΔR2 = Alteração do Coeficiente de
Determinação; F = ANOVA. aAs correlações com as
variáveis nominais foram ponto-bisseriais e com as restantes foram de
Pearson. ***p < 0,001.
|
|
Em resposta à nossa questão de partida, a idade
avançada revelou-se um fator preditor de piores pontuações em várias provas que
avaliam a memória. Contudo, quando se controla o papel de outros fatores, o seu
contributo explicativo revela-se pequeno, ainda que se mantenha
estatisticamente significativo.
Para responder a esta questão realizaram-se um
conjunto de análises que merecem ser debatidas em cada tipo de memória
separadamente.
Memória de trabalho
Quando se considera a memória de trabalho medida
pelo Mini-Mental State Examination
verifica-se que a maioria (75%) dos participantes tem pontuações superiores a 3
pontos, com 25% a ter pontuações de 6 num total possível de seis pontos. Estes
resultados suportam a noção de que há pessoas idosas cujas perdas cognitivas
não são substanciais no que respeita à memória (Howieson et al., 1993;
Rubin et al., 1998).
As variáveis que, no presente estudo, se evidenciam
como influenciadoras deste tipo de memória são a idade, profissão e situação
residencial.
Não ignorando o acima mencionado, a influência da
idade sobre este tipo de memória é suportada por outros estudos (Hultsch
et al., 1992; Park et al., 2002; Park & Reuter-Lorenz, 2009; Zahodne et al., 2011), confirmando a ideia de que há pessoas idosas cujo
envelhecimento cognitivo não é saudável.
O papel da profissão prévia não foi descrito em
pesquisas anteriores em relação a este tipo de memória. Ainda assim, pode
supor-se que os idosos que tiveram ocupações de caráter intelectual se
mantenham envolvidos em atividades presentes mais estimulantes, pelo que a sua
memória de trabalho se mantém ativa e por isso mais preservada.
Numa pesquisa
recente sobre o papel da situação residencial, ao contrário do estudo presente,
os autores não encontraram diferenças entre os dois tipos de situação
residencial em várias medidas referentes à memória de trabalho (Fastame
et al., 2016). Uma vez que os autores trabalharam com uma amostra
total de 30 pessoas idosas, residentes numa zona
azul (zona de grande longevidade) e que não apresentaram as médias, só
indicando valores de ANOVAs, não é possível comparar de forma precisa os
resultados de ambos os estudos. Assim, pode supor-se que os idosos portugueses
que residem na comunidade tenham mais estímulos cognitivos do que os que se
encontram em resposta social institucional do âmbito da Segurança Social, pelo
que a sua memória de trabalho se mantém ativa e por isso mais preservada. Em
reforço desta ideia, apesar do estudo anterior de Torres Pena (2014) não ser
representativo da população idosa residente na comunidade do concelho de
Coimbra, mostrou que vários idosos praticavam exercício em grupo ou
participavam em atividades de Universidades Sénior, tendo, assim, mais
oportunidades de estimulação psicológica, física e relacional.
Ficam agora por debater os fatores que não
influenciam este tipo de memória. A ausência da influência da escolaridade na
memória de trabalho não é apoiada pelo estudo de Zahodne et al. (2011),
ainda que estes autores tenham trabalhado com um índice compósito que incluía a
construção de frases, nem pelo estudo de Schneeweis et al. (2014).
O facto de a escolaridade não ter um papel na memória de trabalho em pessoas
idosas é um resultado que não é expectável à luz do conceito da reserva
cognitiva. A definição de reserva cognitiva (capacidade desenvolvida
progressivamente através de experiências cognitivas exigentes e estimulantes
como a educação) (Reed et al., 2010) conduz à expectativa de que a
memória de trabalho seja influenciada pela escolaridade. Por esse motivo,
afigura-se importante repetir esta análise em amostras de pessoas idosas com
níveis superiores de escolaridade e verificar se o resultado é replicado.
Já a ausência de influência do sexo na memória de trabalho
vai ao encontro de evidências prévias (Zahodne
et al., 2011) e de outros estudos
que mostraram que o sexo é especialmente relevante noutros tipos de memória (Herlitz
et al., 1997; Herlitz & Rehnman, 2008; Maylor et al., 2007; Naveh-Benjamin et al., 2012; Pauls et al., 2013).
Foi também relevante o dado relativo à fraca
influência da situação clínica. Apesar de as pessoas idosas com algum tipo de
doença neurológica terem piores pontuações na memória de trabalho de forma
estatisticamente significativa, a magnitude padronizada da diferença foi
pequena e a correlação foi muito pequena e não significativa. A hipótese que se
levanta refere-se à heterogeneidade clínica do grupo sem doença neurológica que
incluía, por exemplo, pessoas com diabetes. Tal como foi referido previamente,
esta patologia associa-se a declínio na evocação diferida (Comijs et al., 2009), o que pode ser explicado por alterações da memória de trabalho.
Por fim, verificou-se através da análise de
regressão hierárquica que, apesar de o contributo individual da idade ser
maior, também a profissão e a situação residencial predizem de forma
estatisticamente significativa as pontuações na memória de trabalho. Assim, o
reconhecimento da importância deste tipo de memória na cognição em geral (Cowan et
al., 2005) deverá conduzir ao desenvolvimento de programas de treino
dirigidos à melhoria da memória de trabalho em pessoas mais idosas que
exerceram ocupações predominantemente manuais e que residam em estruturas
residenciais para idosos.
Memória declarativa verbal
Quando se considera a memória declarativa verbal
medida pelo Montreal Cognitive Assessment
verifica-se que a maioria (75%) dos participantes tem pontuações inferiores a
12 pontos num total possível de 18 pontos. Este resultado pode ser explicado
pela baixa escolaridade dos participantes e ocupações predominantemente
manuais, pois o tipo de memória avaliado pelo Montreal Cognitive Assessment aproxima-se grandemente dos conteúdos
adquiridos com a escolarização e ocupações de natureza intelectual.
No presente estudo, este tipo de memória é
influenciado por todas as variáveis independentes consideradas. As mais
relevantes são a escolaridade, profissão e situação residencial, pois os
tamanhos do efeito são todos grandes. A idade apresenta uma influência de
magnitude moderada nesta memória (assim como uma correlação moderada e
estatisticamente significativa).
O resultado referente à idade é parcialmente
suportado pelo estudo de Nyberg et al. (2003), uma vez
que estes autores separaram na sua revisão a memória episódica, a qual é
sensível à idade, da memória semântica, que tende a resistir ao envelhecimento.
O resultado é ainda parcialmente suportado pela investigação de Pauls et al. (2013)
que mostraram que a idade influencia a memória episódica.
Apesar da baixa magnitude da diferença, a influência
do sexo não é apoiada pelos estudos que indicam que as mulheres tendem a ser
melhores em provas de natureza verbal (Herlitz et al., 1997;
Pauls et al., 2013; Zahodne et al., 2011). Para além de as idades das amostras do estudo de
Herlitz et al. (1997) e de Pauls et al. (2013) incluírem
pessoas de idades mais jovens, o verdadeiro contraste entre os três estudos e o
estudo presente é a origem das amostras. Os participantes dos três estudos
incluem somente pessoas da comunidade e sem condições graves de saúde, enquanto
o estudo atual inclui pessoas institucionalizadas e um grande número de pessoas
com condições clínicas de saúde graves, o que pode ter atenuado as diferenças
entre sexos. A única forma de esclarecer esta discrepância será replicar o
estudo numa amostra de pessoas idosas sem problemas graves de saúde.
A baixa escolaridade e a natureza manual de muitas
ocupações prévias das pessoas idosas do estudo presente, tal como referido
acima, podem ter contribuído para as baixas pontuações deste tipo de memória.
Em apoio desta ideia, Salthouse (2003) propôs que o conhecimento pode
melhorar a memória uma vez que facilita formas superiores de organização
estrutural da informação. Os resultados de Giogkaraki, Michaelides e
Constantinidou (2013) que mostram que a memória episódica verbal
se associa à reserva cognitiva determinada pelo número de anos de escolaridade,
vocabulário e desempenho de leitura dão também suporte aos resultados do
presente estudo. Evidências adicionais provêm dos estudos de Elias et al. (1997),
Lövdén et al. (2004) e Zahodne et al. (2011) que atestam
o papel do nível educacional neste tipo de memória e da revisão de Bennet et
al. (2012) que indica um declínio mais lento da memória episódica e
semântica associado a atividades cognitivas passadas.
O facto de se verificar que ter um companheiro pode
ser um fator de proteção neste tipo de memória é suportado por vários estudos
relativos ao funcionamento cognitivo global (Conroy et al., 2010;
Håkansson et al., 2009;
Shankar
et al., 2013). A explicação que decorre deste achado é de que o ter
um companheiro se associe a uma maior estimulação cognitiva e social que ajuda
a preservar a memória declarativa.
Quanto à influência da situação residencial, em que
se verifica que as pessoas idosas em resposta social têm pior memória
declarativa, vai no mesmo sentido da pesquisa de Winocur (1982), reforçando
a ideia, já debatida anteriormente, de que as respostas sociais portuguesas
oferecem fraca estimulação aos seus utentes. Outra possível explicação é de que
as pessoas estão em resposta social institucional por apresentarem condições
cognitivas que as impedem de residir autonomamente nas suas residências.
Quanto ao resultado encontrado de que a condição
clínica geral afeta a memória declarativa, ela é apoiada por outras pesquisas
já mencionadas previamente (Comijs et al., 2009; Hassing et al., 2004).
Por fim, a análise de regressão ajudou a esclarecer
que a idade avançada é de facto um fator de risco para o défice na memória
declarativa; contudo, mais significativos que a idade, são a baixa escolaridade
e residir/frequentar uma resposta social.
Memória Visuoespacial Imediata e Diferida
Como podemos constatar, o percentil 75 correspondeu
a pontuações baixas em ambas as provas da Figura Complexa de Rey-Osterrieth, o
que pode ser explicado, mais uma vez pela baixa escolaridade da amostra (Rosselli
& Ardila, 2003).
A memória visuoespacial é influenciada pela idade,
com especial relevo para a memória imediata. O mesmo foi verificado noutras
pesquisas (Boone et al., 1993; Chen &
Naveh-Benjamin, 2012; Gallagher & Burke, 2007; Pauls et al., 2013; Old & Naveh-Benjamin, 2008; Rosselli & Ardilla, 1991).
A ausência de predomínio dos homens, tal como outros
autores referiram (Rosselli & Ardilla, 1991; Pauls et al., 2013), poderá dever-se a aspetos culturais não estudados
no presente estudo.
O nível educacional afeta, para além de outras, as
habilidades de memória visuoespacial como indicado por vários estudos (Dansilio
& Charamelo, 2005; Lezak et al., 2012; Rönnlund et al., 2005; Rosselli & Ardilla, 1991) e também verificado na pesquisa presente.
A ocupação prévia não está descrita na literatura
como influenciando a memória visuoespacial, mas dada a relação entre a
escolaridade e a profissão, é natural que a ocupação prévia contribua também
para a formação de reserva cognitiva (Baldivia,
Andrade, & Bueno, 2008) protegendo este tipo de memória.
Tal como já foi discutido anteriormente, ter um
companheiro propiciará um contexto de maior estimulação que protege este tipo
de memória. Este é um resultado sustentado indiretamente por investigações
prévias que avaliaram o funcionamento cognitivo global (Conroy et al., 2010;
Håkansson et al., 2009;
Shankar
et al., 2013).
Em relação à situação residencial, apesar de não
haver na literatura pesquisas que fundamentem este resultado, a interpretação
mais imediata passa pela já referida potencial falha de estimulação existente
nas estruturas residenciais portuguesas para idosos ou pela institucionalização
de pessoas com um estado cognitivo prévio deficitário.
Quanto à condição clínica geral, não havendo
pesquisas anteriores que fundamentem este resultado, apenas através de
investigações com novas amostras com condições clínicas homogéneas estudadas
separadamente se poderá entender como é que a memória visuoespacial é afetada.
A análise de regressão contribuiu para esclarecer
qual o papel preditivo das variáveis acima indicadas. Assim, para a memória
visuoespacial imediata, os fatores preditivos são a escolaridade, seguida da
idade e da situação residencial. Para a memória visuoespacial diferida são a
escolaridade seguida da idade.
Limitações
No geral, apesar de os resultados atuais confirmarem
e ampliarem a compreensão sobre os fatores associados à memória em pessoas
idosas, o estudo apresenta algumas limitações, pelo que é necessária uma
interpretação cautelosa dos referidos resultados. De facto, os resultados da
investigação presente devem ser considerados preliminares apesar da grande
dimensão da amostra. Várias categorias das variáveis independentes não estavam
contrabalançadas para que se possa generalizar os resultados encontrados.
Sugerimos que estudos futuros deverão incluir mais homens, pessoas com níveis
de escolaridade mais elevados, mais idosos que tenham exercido profissões
intelectuais, com companheiro e residentes na comunidade. Em termos clínicos, é
também importante envolver pessoas saudáveis para melhor perceber a real influência
de fatores protetores e, ao abranger pessoas com condições clínicas, procurar
que as várias condições mais frequentes na velhice estejam numericamente
equilibradas.
Adicionalmente, um resultado que não é aparente na
investigação atual, mas descrito noutros estudos do TEIRS (Gordo, 2015; Pena,
2014), é que as pessoas institucionalizadas de Coimbra são menos
escolarizadas e, provavelmente, de rendimento socioeconómico inferior.
Inversamente, as pessoas residentes na comunidade são mais escolarizadas e,
possivelmente, mais envolvidas em atividades socialmente mais estimulantes.
Será que acontece o mesmo noutras regiões do país? Na dúvida, estes resultados
não podem ser generalizados para pessoas idosas residentes noutras áreas de
Portugal, pelo devem ser realizadas pesquisas que explorem quais os fatores que
protegem/afetam a memória.
A indicação de que o envolvimento em atividades de
lazer social, cognitiva e fisicamente estimulantes protegem o funcionamento
cognitivo (Ghisletta, Bickel, & Lövdén, 2006; Hertzog,
Kramer, Wilson, & Lindenberger, 2008; Hultsch, Hertzog, Small,
& Dixon, 1999; Lövdén, Ghisletta, & Lindenberger, 2005)
sugere que estudos futuros devem controlar estes aspetos para perceber qual o
real peso de cada fator na proteção da memória.
Outro aspeto a ter em atenção é a natureza
transversal do estudo que não permite tirar ilações de causalidade. Em estudos
futuros será então importante recorrer a uma metodologia longitudinal com vista
a melhor perceber e consolidar os resultados aqui reportados.
Conclusão
Globalmente, os resultados desta pesquisa mostram
que a idade é um fator relevante para a memória, mas também o são a
escolaridade, a ocupação prévia e os fatores que potencialmente estimulam
cognitiva e socialmente (ter um companheiro e residir na comunidade). Assim,
este estudo contribui para o conjunto de investigações que indicam a
importância de se manter a estimulação cognitiva e social para assim preservar
o bom funcionamento da memória na idade avançada. Na situação em que a institucionalização
é a opção que resta para muitas pessoas idosas, realçamos a necessidade de
investir em intervenções que promovam as relações sociais, tornando-se
especialmente relevante entre os que têm baixos níveis de escolaridade, que
tiveram ocupações prévias predominantemente manuais e sem companheiro.
Conflito de interesses: nenhum.
Fontes de financiamento: nenhuma.
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