Editorial:
Questões emocionais e avaliação em adolescentes e adultos jovens
Editorial
https://doi.org/10.31211/rpics.2018.4.2.98
O presente número da Revista Portuguesa de
Investigação Comportamental e Social apresenta estudos relevantes para os
interessados na investigação com populações adolescentes e jovens adultos,
sendo pesquisados temas especialmente relacionados com a imagem corporal, mas
também aspetos relativos a experiências traumáticas de natureza interpessoal no
seio destas populações.
Nas últimas décadas, as sociedades modernas
têm vindo a atribuir um valor excessivo à aparência e forma corporais (Banfield, & McCabe, 2002). Um ideal de um corpo
idealmente esbelto e firme, nem sempre acessível, pode envolver consequências
negativas para a saúde física e mental (e.g., Ackard, Croll,
& Kearney-Cooke, 2002; Calogero, 2009; Saikali,
Soubhia, Scalfaro, & Cordás, 2004). Este ideal é um produto de um
momento cultural (Banfield, & McCabe, 2002) e tem
vindo a expressar-se como insatisfação corporal e distorção da imagem corporal
em cada vez mais pessoas (e.g., Anuel, Bracho, Brito, Rondón,
& Sulbarán, 2012). Neste sentido são úteis os estudos que validem
instrumentos relativamente a constructos nesta área, especialmente instrumentos
de aplicação breve, tal como o concretizado na pesquisa “Versão
Portuguesa Reduzida da Escala de Avaliação da Aparência de Derriford (DAS-14):
Análise fatorial exploratória e confirmatória” de Mendes e Pereira
publicado no número atual da RPICS.
A adolescência e a adultez jovem são
períodos especialmente frágeis a problemas com a imagem corporal (Braggion, Matsudo, & Matsudo, 2000), envolvendo
frequentemente várias dificuldades no que diz respeito à saúde mental (e.g., Cash, 2002; Saikali et al., 2004; Stice, Marti, & Durant, 2011). Assim, no presente número
da RPICS, o estudo “Medos associados à
imagem corporal na adolescência: desenvolvimento e validação da Escala de
Ansiedade e Evitamento de Situações devido ao Peso e Aparência Física”
(Costa, Cunha, Palmeira, Couto, & Galhardo) manifesta uma grande
importância no âmbito da avaliação desta população.
A questão dos problemas com a imagem
corporal é tão mais relevante no sexo feminino (Ackard et
al., 2002), para quem os padrões de beleza são especialmente rígidos e foco
de maior atenção (Calaf, León, Hilerio, & Rodríguez, 2005;
Nanu, Tăut, & Băban, 2014), mas ocorre também no sexo
masculino (e.g., Paxton, Neumark-Sztainer, Hannan, &
Eisenberg, 2006), com tendência recente crescente (e.g., Cain,
Epler, Steinley, & Sher, 2011; Yean et al., 2013).
Dada a escassez de instrumentos dedicados ao sexo masculino, este número
assume, assim, especial destaque neste âmbito com o estudo de Ferreira,
Marta-Simões, Oliveira e Duarte intitulado “Estudo da
estrutura fatorial e das qualidades psicométricas da versão portuguesa da Male Body Attitude Scale-Revised”.
Para o desenvolvimento de problemas no
âmbito da imagem corporal e das questões de saúde mental que se lhe associam
não será alheio o contributo das experiências precoces. Neste âmbito, o estudo
“Memórias das
mensagens alimentares precoces transmitidas pelos cuidadores e comportamentos
de ingestão alimentar compulsiva em adultos da população geral portuguesa:
Estudo do papel da apreciação da imagem corporal” (Oliveira &
Ferreira) assume especial relevo, ao apontar
que a transmissão de mensagens alimentares de controlo pelos cuidadores em
idades jovens se relaciona com uma maior tendência para favorecer atitudes
negativas relativamente à imagem corporal e mais compulsão alimentar em idades
posteriores.
Ainda
na mesma linha, uma das variáveis relacionada com a preocupação com a aparência
é a adaptação pessoal-emocional em jovens adultos que frequentam o ensino
superior. Entre estes, um maior foco nos sentimentos negativos em relação ao
corpo tem uma maior relação com as dimensões sociais, cognitivas e contextuais
da adaptação ao ensino superior, tal como é revelado no estudo “Autoconsciência da
aparência e a adaptação no ensino superior: Estudo exploratório”
(Mendes, Fraga, Medeiros, Moniz, Miranda, & Medeiros).
Noutro sentido, é mostrado o papel de fatores de vulnerabilidade,
incluindo acontecimentos traumáticos precoces e perceções de vergonha, para os
sintomas depressivos na adolescência num estudo que se destaca pela sua
natureza longitudinal e que se intitula “Uma abordagem
longitudinal da contribuição do trauma e da vergonha nos sintomas depressivos
em adolescentes” (Cunha, Almeida, Cherpe, Simões, & Marques).
A adolescência e a adultez jovem são também
fases de desenvolvimento vulneráveis ao assédio, particularmente o assédio no
ciberespaço. Neste âmbito, esperamos que o estudo de revisão sistemática de
Pires, Sani e Soeiro denominado “Stalking e ciberstalking
em estudantes universitários: Uma revisão sistemática” venha
promover pesquisas futuras que incluam amostras
específicas e analisem correlatos psicossociais. Esta é uma área em
desenvolvimento e aberta, como mostram os autores, à investigação de natureza
longitudinal.
Ackard, D. M., Croll, J. K., &
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ⓘ PhD. Instituto Superior Miguel
Torga, Coimbra, Portugal; Centro de Investigação de Neuropsicologia e Intervenção
Cognitivo-Comportamental da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação
da Universidade de Coimbra, Portugal.